Phedra D. Córdoba completa 74 anos: "nasci para ser diva" - Foto: Walter Antunes/Divulgação
Este sábado é dia de festa nos palcos paulistanos. Phedra D. Córdoba, diva maior de nosso teatro alternativo, completa 74 anos. Para celebrar a data, publico aqui o perfil que fiz dela em 2009 para a revista UMA. Viva Phedra!
Uma diva chamada Phedra D. Córdoba
A atriz transexual cubana radicada há 51 anos no Brasil recebe a reportagem de UMA em seu apartamento, no coração do centro de São Paulo, e conta sua grande história de quem nasceu para ser estrela
Por Miguel Arcanjo Prado*
É tarde de sábado e o sol castiga São Paulo. Tenho um encontro marcado no apartamento da atriz Phedra D. Córdoba às 13h. Resolvo atrasar em uma hora. Telefono. Ela me diz, com forte acento castelhano: “Estou passando o aspirador de pó, porque tenho um gato, o Primo Bianco, que espalha pêlos pela casa inteira, para mim também será melhor às duas”.
Artista profissional desde os 15 anos, Phedra é cubana nascida em Havana em 26 de maio de 1938 e integra a companhia teatral paulistana Os Satyros. Passa das 14h quando chego ao prédio da rua João Adolfo, no Anhangabaú. No 11º andar, o último, Phedra me recebe em seu pequenino apartamento. Está maquiadíssima, usa joias pesadas e veste saia e blusa estampadas divididas por um cinturão vermelho.
O apartamento é decorado com antigas imagens dela, dois quadros e uma estátua de Charles Chaplin, bibelôs, um computador com webcam – que ela usa para conversar com os “muitos sobrinhos em Cuba e nos Estados Unidos” -, uma velha televisão, um guarda-roupa art déco e uma cama de casal debaixo da qual Primo Bianco se esconde. “Acho que ele está com medo de você”, ela explica, antes de mostrar várias pastas com fotos e recortes de jornal.
Enquanto exibe seu passado, conta que fez dois filmes recentes: “Sou uma atendente de hospital em Belini e o Demônio e uma mulher que será morta em Luz nas Trevas, A Volta do Bandido da Luz Vermelha”.
Phedra nasceu Felipe Rodolfo Acebal, caçula dos oito filhos do oculista Horário Acebal e da dona de casa Maria Teresa Betancourt. Desde menino, queria estar nos teatros de Havana: “Sempre quis ser diva”.
A família rejeitava sua alma feminina. “Minha mãe me combatia, meus irmãos caçoavam, meu pai não falava nada.” Aos 16, pouco antes de o comunista Fidel Castro tomar o poder, fugiu de Cuba e ganhou o mundo.
Apresentou-se por vários países até aportar no Rio, em 1958, convidada pelo produtor Walter Pinto para fazer teatro de revista, ainda como Felipe D. Córdoba. Mas logo virou Phedra. “Com Ph mesmo, porque é grego. Muitos donos de boates erravam nos cartazes e botavam F.”
Em 1972, mudou-se para São Paulo, para “fazer dramaturgia”. Virou ícone da noite paulistana. Em tempos de repressão da ditadura, era melhor afirmar ser espanhola do que cubana, mesmo jamais tendo apoiado o discurso comunista. “Fidel foi um ditador e matou muita gente”, esbraveja. Em 2008, Phedra viveu um momento crucial: 54 anos depois, voltou a Cuba, para apresentar a peça Liz, com Os Satyros, em Havana. “Senti como se fosse estrangeira em minha terra”.
Conheceu “sobrinhos, sobrinhos-netos e até sobrinhos-bisnetos”. “Eles não foram homofóbicos. Me chamaram de ‘tia Phedra’. Nós todos choramos muito.” Um dia, no camarim, recebeu a visita do ministro da Cultura de Havana. “Chegou um general velhinho querendo me ver. Nem sabia quem era. Ele falou: ‘Eu quero ver a minha rainha’. Posso querer mais do que isso? Voltei para Cuba como Diva!”.
Enquanto ela se emociona, Primo Bianco sai debaixo da cama e me encara com seus olhos azuis. Phedra finaliza: “Acho que ele gostou de você. É um bom sinal”.
*Colaborou Danilo Dainezi, jornalista. Reportagem originalmente publicada em dezembro de 2009 na revista UMA.