O Retrato do Bob: Einat Falbel, toda a força de uma atriz pós-desilusão

Por Miguel Arcanjo Prado
Foto de Bob Sousa


Se o pai da atriz Einat Falbel tivesse demorado mais um ano para deixar a Polônia rumo ao Brasil ela não estaria por aqui. Foi em 1938, um ano antes de a 2ª Guerra Mundial começar, que o judeu polonês Pinkas Falbel resolveu largar a terra natal rumo à até então desconhecida América do Sul. O restante da família Falbel que ficou na Polônia foi dizimado pelo nazismo.

Em uma viagem à Terra Santa, ele conheceu a brasileira Ester Lea, por quem se apaixonou e trouxe para viver com ele em São Paulo, onde os Falbel começaram vida nova. Tiveram quatro filhos, um homem e três mulheres, entre eles a caçula, Einat, sempre metida em artes.

Criada entre os bairros Lapa e Higienópolis, já pequenina, fez um espetáculo para o prédio inteiro. Tios, primos, pais e irmãos viram ali despontar o talento da menina que amava os Saltimbancos.

Na escola, Einat tinha como professora de artes ninguém menos do que a futura atriz de sucesso Lilia Cabral, que é formada em belas artes pela USP (Universidade de São Paulo) e deu aulas antes da TV. Foi vendo uma peça infantil de Lilia que Einat se deslumbrou.

— Lembro da sensação que tive: de estar diante de um fenômeno.

Durante um bom tempo viveu uma dicotomia: ser bailarina ou atriz? O teatro acabou falando mais alto, mas não abandonou os passos. Continuou com as aulas de dança em paralelo e hoje é também professora de expressão corporal.

— Ás vezes mentia para meus pais. Dizia que estava indo para a o balé e ia para o teatro.

A influência de Lilia foi grande. Tanto que, assim como a professora, se formou em educação artística na faculdade.

— Já tinha feito Macunaíma [escola de teatro no bairro Campos Elíseos] quando adolescente, mas bati o martelo mesmo em relação ao teatro quando resolvi me matricular no Célia Helena [outra tradicional escola de atores paulistana].

É claro que a decisão sofreu resistência da família.

— Meus pais não queriam que eu fosse atriz. Queriam que eu tivesse uma profissão mais convencional. Diziam para mim que “na vida você não faz o que quer, você faz o que tem de fazer”.

Ela não deu muita bola ao discurso. E insistiu no que sabia ser sua vocação. Do Célia Helena foi para o Grupo Tapa, sua “grande escola”. Lá, fez Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, em 1994, seu primeiro grande espetáculo. Ficou com eles sete anos.

Depois, teve uma passagem de quatro anos pela Companhia do Feijão. Aí, resolveu ficar “free”, como gosta de brincar, dando uma gostosa risada.

Fez cinema. Atuou em O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias e Lula – O Filho do Brasil. Em 2013, estreia na TV na série O Negócio, da HBO, sobre prostituição de luxo. Vai ser a secretária das garotas de programa.

Em 2007, entrou para a turma do Núcleo Experimental, do diretor Zé Henrique de Paula. Fez Dona Eduarda em Senhora dos Afogados, outra vez Nelson Rodrigues.

Até que surgiu em sua vida a possibilidade de se tornar Agnes, a garçonete solitária e decadente do espetáculo Bichado, que se apaixona por um ex-combatente da Guerra do Golfo com sérios problemas psiquiátricos, vivido pelo ator Paulo Cruz.

— A Agnes tem aquela coisa da mulher quando passa de uma certa idade e vê que a vida não aconteceu como ela projetou. As mulheres fazem muita bobagem para preencher esse vazio.

No espetáculo, a personagem embarca na loucura do amante como forma de ter alguém.

—Ela é capaz de comprar uma psicose só para preencher o buraco que tem. Isso é uma coisa muito feminina. Acho que a peça é muito isso, o que uma pessoa é capaz de fazer para que a vida faça algum sentido. Eu me identifico com ela em muitas coisas. Antes, saía da peça muito cansada, acho que agora, quase no fim da temporada, o corpo está se acostumando. Eu adoro o que a Agnes faz comigo. Ela mexe muito com tudo. É que ator adora sofrer, né [risos].

Quando questionada por que permaneceu no teatro, reflete um pouco, e chega à conclusão.

— Teatro é um vício. É maior do que o ego. É maior do que a gente. Muita gente vai procurar o teatro, neste mundo fast celebrity, para ser amado. Mas não é isso. Com o tempo, o elogio e o aplauso é pouco. É porque o teatro é muito além disso. E essa é uma descoberta que cada ator precisa fazer.

Bem resolvida com seus 42 anos, Einat Falbel comemora os personagens densos que a idade lhe proporciona.

—Eu não posso mais fazer a Julieta, né? [gargalhada]. Agora, meus personagens são pós-desilusão.

Leia a crítica de Bichado

Coluna do Miguel Arcanjo n° 183: Adeus, Playcenter

 
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