Amanda Acosta e Nany People sustentam a comédia O Incrível Dr. Green, em SP
Por Miguel Arcanjo Prado
Ficar velho no Brasil é praticamente crime com direito a prisão perpétua. Portanto, falar da loucura pela beleza e juventude eterna é algo mais do que pertinente.
O Incrível Dr. Green, em cartaz no Teatro União Cultural, em São Paulo, toca justamente neste ponto: a obsessão, sobretudo a feminina, em ser jovem para todo o sempre, amém.
Conta a trajetória de quatro pacientes que buscam no consultório de cirurgias plásticas a resolução dos problemas de suas vidas, sob o olhar atento de um secretário e uma copeira.
Ricardo Severo assume a direção e também composição das canções, já que há números musicais. Na cidade com público cada vez mais exigente com o teatro musical, é arriscado colocar o elenco para cantar. Sobretudo se nem todos o fazem a contento.
Amanda Acosta é o grande destaque
O espectador percebe o abismo que separa a técnica vocal de Amanda Acosta dos demais colegas. Ela, que protagonizou My Fair Lady, um dos melhores musicais dos últimos tempos, é a única que realmente canta. Outro ponto de espanto num espetáculo que fala de beleza é a feiura do cenário cinza assinado por Laura Carone.
A direção é esmerada em criar desenhos cênicos e marcações que resultem em graça, mas nem todo o elenco parece entendê-las. Assim, bons achados do texto muitas vezes são perdidos por falta de consciência de quem o diz.
A dramaturga Gisela Marques tem bom texto. Mas falta assumir a comédia sem vergonha. O espetáculo ganharia se as histórias fossem mais interligadas e Karina, a menina feia interpretada por Amanda Acosta e que sonha em conquistar o corpo dos sonhos para ser aceita socialmente, ganhasse mais destaque. Porque é a personagem melhor construída não só pela dramaturgia como também pela atriz.
Se Amanda já chama a atenção no canto, não fica atrás no quesito interpretação. O corpo, a voz, a postura e a tranquilidade em cena evidenciam o estofo que o real trabalho de construção de um personagem – e não apenas ir atrás de uma caricatura dada – dá a um intérprete. Amanda está em um tempo tão distinto do elenco que deixa o público boquiaberto.
Nany People segura plateia
Justiça seja feita, Nany People é outra que não deixa a peteca cair. Apesar de contida pela direção, está em seu lugar de vedete, aquela com poder real sobre o público – e é isso que o espectador quer ver.
Nany tem experiência farta com a plateia e isso fica evidente, mesmo presa pelo texto e marcações. Ela segura os momentos mais tensos. A montagem ganharia se a direção a deixasse mais solta para improvisar e, sobretudo, contracenar mais com Amanda.
O restante do elenco fica distante de Amanda e Nany. Ana Andreatta, na pele da copeira muda da clínica, cumpre, educadamente, a função proposta. O mesmo se dá com Nyrce Levin, como a atriz decadente que pensa que ganhará o sucesso de volta com injeções de botox. Diverte com essa obsessão, mas poderia ter ido além.
Já Gabriela Alves, como a mãe recente que quer se ver livre de uma barriga que só ela enxerga, e Roberto Rocha, como Geraldinho, o secretário faz-tudo do cirurgião plástico (que jamais aparece) investem na representação de uma caricatura do que seriam seus personagens.
Mas o problema maior para o espetáculo fica por conta do personagem Geraldinho, já que é o elo que liga as demais pacientes.
Ávido por ver uma interpretação solar e espalhafatosa, o público é presenteado com uma atuação morna. Percebe-se que a direção optou por deixar o personagem tão soturno quanto o cenário. Assim, toda a graça que poderia advir dele se perde.
Se fosse interpretado, por exemplo, por um ator com o tempo de comédia de um Wilson de Santos – que tinha a plateia na mão no espetáculo Sua Excelência, o Candidato como mordomo –, a montagem seria outra. E bem melhor. Em comédia é preciso assumir a graça e o deboche sem culpa alguma.
Dessa forma, se não fosse o trabalho esmerado de atriz feito por Amanda Acosta e o domínio da plateia de Nany People, O Incrível Dr. Green seria uma cirurgia plástica cujo resultado não deu certo.
O Incrível Dr. Green
Avaliação: Bom
Quando: Sexta, 21h30; sábado, 21h; e domingo, às 19h30. Até 18/11/2012
Onde: Teatro União Cultural (r. Mario Amaral, 209, Paraíso, Metrô Brigadeiro, São Paulo, tel. 0/xx/11 2148-2904)
Quanto: R$ 30 (sexta e domingo) a R$ 40 (sábado)
Classificação: 14 anos
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