Crítica: Família mineira é soterrada no Festival de Curitiba, em Os Ancestrais, do Teatro Invertido
Por Miguel Arcanjo Prado*
Enviado especial do R7 a Curitiba
Uma família pobre é soterrada e cria um mundo à parte debaixo dos escombros de sua casa, enquanto o resgate não vem. Este é o argumento central do espetáculo mineiro Os Ancestrais, que o grupo Teatro Invertido levou ao Festival de Curitiba, com apresentações no Espaço Cênico.
Com texto e direção da também mineira Grace Passô, do Grupo Espanca!, a obra mistura viés político de crítica social aos dramas pessoais dos membros desta família: a mãe batalhadora (Rita Maia), a avó alcoólatra descrente de tudo (Janaína Morse), o filho meio sem lugar naquele submundo (Leonardo Lessa), a filha fogosa (Kelly Crifer) e o vizinho violento e sensual (Dimitrius Possidônio).
O texto dialoga com o Brasil de hoje, onde a cada tormenta de verão vidas são destruídas com constantes desabamentos, seja na região serrana do Rio ou na periferia de Belo Horizonte, gerando comoção instantânea e nenhuma medida realmente eficaz do poder público. Este é o grande mérito da obra.
O sexto espetáculo da trupe antecipa a comemoração dos dez anos do grupo, que teve início em 2003, com a montagem Nossa Pequena Mahagony, feita com atores egressos do curso de artes cênicas da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e desde então presentes na cena contemporânea de Belo Horizonte.
O processo criativo de Os Ancestrais durou um ano e contou com a colaboração criativa dos atores. No elenco, quem mais se destaca é Kelly Crifer, no papel da filha cheia de vida e desejo naquele buraco sujo de terra preta. A atriz é se apresenta com entrega visceral e com interpretação de qualidade acima a de seus pares.
O cenário de Fernando Marés é outro destaque, fazendo com que a plateia seja transportada para debaixo da terra. É inventivo, forte e poético.
Já a soturna luz de Bruno Cerezoli acerta em seu começo sombrio, mas erra por permanecer o tempo todo na penumbra. Em pelo menos alguns momentos poderia ter jogado foco no trabalho dos atores, assim como a direção poderia ter exigido mais dos mesmos.
O figurino de Camila Morena da Luz e do grupo veste os personagens de acordo com a proposta da encenação, e tem seu charme nos adereços, como as máscaras utilizadas na cena em que eles transformam o buraco em um bloco carnavalesco.
A dramaturgia acaba confusa, já que a força do discurso político presente no início se dilui à medida que os dramas pessoais dos personagens ganham o primeiro plano.
Contudo, a maioria destes não passa por nenhum tipo de grande transformação diante da situação extrema que vivem. E o final, que tinha todos os elementos para causar impacto, acaba sendo frustrantemente previsível.
Os Ancestrais
Avaliação: Regular
*O jornalista Miguel Arcanjo Prado viajou a convite do Festival de Curitiba.
Veja a cobertura completa do R7 do Festival de Curitiba
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