Formandos da EAD mostram vigor com Zucco
Por Miguel Arcanjo Prado
Estudar na mais tradicional escola de formação de atores do País tem seu peso. E os formandos da turma 61 da EAD, a Escola de Arte Dramática da USP (Universidade de São Paulo), parecem saber disso. É preciso avançar. Se mostrar. Dar cara a tapa.
E o fazem na montagem Zucco, com direção firme do diretor da escola, José Fernando de Azevedo, que faz apresentações gratuitas até este domingo (26) no teatro da EAD, na Cidade Universitária, em São Paulo, com produção de Bertha Heller.
Pós-moderna e repleta de recurso tecnológicos no palco e fora dele, a montagem conta a história do serial killer italiano Roberto Zucco, que se matou em 1988 aos 26 anos após cometer uma série brutal de crimes pela Europa, incluindo aí o assassinato de seu pai e de sua mãe.
A tragédia paira na obra do francês Bernard-Marie Koltès, que ficou impressionado com a força daquela história e a transformou em um bem sucedido texto, escrito pouco antes da morte do autor. O personagem parece saído de uma tragédia shakespiriana diretamente para os frenéticos anos 1980, sutilmente lembrados nos figurinos de Aurea Teixeira.
O espetáculo já foi montado há três anos, com sucesso, pelo grupo Os Satyros, com direção de Rodolfo García Vázquez, também na capital paulista. Na montagem, Robson Catalunha assumiu o papel-título.
Na montagem da EAD quem protagoniza é Rafael Lozano. O ator possui corpo rijo e sedutor, mas, falta-lhe, em muitas cenas, a densidade que o papel pede. Mas o jovem se sobressai na cena cinematográfica que acontece fora do teatro e é acompanhada pelo público pelo telão que invade a bem resolvida cenografia clean de Danilo Eric, em formato de casa.
Outra que faz desta cena o seu grande momento no espetáculo é Melissa Campagnoli, na pele de uma madame segura e destemida em seu encontro com o serial killer. A mesma atriz exala sensualidade desmedida quando interpreta a prostituta.
A atriz Aurea Barros Teixeira também vai bem como a irmã que se torna garota de programa. Já Giuliana Oliveira fica melhor no papel de prostituta do que quando faz a mãe de Zucco.
Luis Gustavo Luvizzotto e Paulo Balistieri se desdobram em variados personagens. O primeiro se sobressai quando faz o menino que é despido aos olhos de todos, em corajosa entrega. Já o segundo tem seu melhor momento como o cafetão.
Gravidíssima em cena, a atriz Angela Ribeiro emociona como a mãe da menina interpretada com segurança por Juliana Belmonte.
O drama do espetáculo, fragmentado, se desenrola em episódios, cada qual com sua gama de suspense. A tragédia não para e a montagem segue seu rumo com canções arranjadas por Vítor Caffaro e executadas pelo afinado elenco – mérito para o preparo vocal de Monica Montenegro –, acompanhado dos músicos Chico Ribas e Raul Lozano. Denilson Marques assina luz fria, tal qual a história que se desenrola no tablado.
Zucco tenta escrutar a cabeça de um assassino. Mas sabe que é algo sem explicação, tal qual é a violência nua e crua. E a montagem da EAD embarca na história com vigor e entrega de quem chega com garra à profissão de ator. Bem-vindos e boa sorte a todos da turma 61.
Zucco
Avaliação: Bom
Quando: Sexta e sábado, 21h; domingo, 19h. Até 26/5/2013
Onde: Teatro Laboratório da EAD – Sala Alfredo Mesquita (r. da Reitoria, 215, travessa da av. Professor Luciano Gualberto, Cidade Universitária da USP, São Paulo, tel. 0/xx/11 3091-4376)
Quanto: Grátis
Classificação etária: 18 anos
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Sem dúvida, a EAD é referência, tanto em termos de Brasil quanto de América Latina. Apesar de, novamente, sentir uma certo desagrado com cenas de nudez, reconheço como lídimo o desejo de tentar transpor para o teatro a mente de um assassino serial.
Não me agrada a estética da violência, mas, neste caso específico, penso que ali a nudez está justificada e, como ocorre em um lugar privado, ela não soa banalizada, pois quem vai lá sabe o que encontrará, já que o tema da peça, por si só, é bastante chocante.
Pelo que acompanho do blog (e eu o leio diariamente, tanto que procuro comentar sempre), a impressão que tenho é de que há uma espécie de movimento para focar a vida urbana e a violência. Acho o esforço válido, pois o teatro pode ser uma boa ferramenta de crítica social. Só que confesso que me cansa um pouco ver apenas crueza.
Tenho percebido que, em diversas peças, são retratadas prostitutas, gente superdrogada, e há uso de cenas de nudez. Ainda que de malgrado, consigo digerir a escolha desses temas porque é a realidade em que a maior parte da população vive. Não se pode culpar o teatro por retratar a realidade, ainda que seja algo feio de se ver. Há valor ali: o da crítica social.
Só lamento não ver mais personagens cândidas, tramas sonhadoras. Acho que seria algo revolucionário nos dias atuais ver uma heroína puríssima e totalmente virgem, de imagem angelical, boa filha, estudiosa, muito devota e temente a Deus. Seria realmente algo que sairia do lugar comum que se tornou essa maciça retratação da crueza dos dias atuais.