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Crítica: Concílio da Destruição expõe buraco burocrático no qual o teatro brasileiro se enfiou

Cena da peça Concílo da Destruição, em cartaz no Teatro Cacilda Becker, em SP – Divulgação

Por Miguel Arcanjo Prado

Um mundo de editais, projetos e justificativas claras e objetivas. Planos que são traçados com a destreza – e muitas vezes até o linguajar – de um executivo de multinacional. Quem faz teatro no Brasil de hoje sabe que tudo isso está impregnado no modo de fazer artes cênicas no País.

O inferno – e muitas vezes a burrice burocrática – é necessário para sobreviver. E cria-se o absurdo da arte que precisa se justificar racionalmente (e em termos de mercado, é claro) antes mesmo de existir.

O ruim bem justificado é melhor do que o ótimo que não lida tão bem assim com o sistema. O público? Que se dane. Este vosso crítico ouviu outro dia uma atriz dizer sem nenhum pudor: “eu não me preocupo se o público virá”. Como assim? Esta não deveria ser sua principal preocupação?

Mas, com editais garantidos não é mais preciso mesmo se preocupar em trazer plateia. A não ser se existisse alguma ética. Porque boa parte do teatro atual é feita para o edital. O espectador, que deveria ser parte fundamental dessa história, é um mero acaso.

Les Commediens Tropicales abusam da tecnologia em espetáculo provocante e ousado – Divulgação

Pois o espetáculo Concílio da Destruição joga tudo isso no liquidificador e entorna tudo na cara do público, focalizado pela câmera, na mão dos atores. Tirado à sorte, o espectador pode ter seu rosto exibido no telão. Sente o frenesi e o desconforto da exposição que é o ganha pão do artista. A atitude é agressiva. É dura. Mas é também um bisturi incisivo que abre uma costura mal feita. E evidencia o qual difícil é dar a cara a tapa.

Quem deseja ver este teatro inteligente feito pelo grupo Les Commediens Tropicales precisa correr. Porque eles fazem o último fim de semana da montagem, que tem direção coletiva, no Teatro Cacilda Becker, na Lapa, em São Paulo. Mas valerá a pena ir até lá, nem que seja pelo desnorteamento que eles vão provocar em sua cabeça, caro internauta.

O enredo da peça é provocante. Num futuro próximo, todas as obras de artes do mundo terão de ser destruídas. Um edital determina que só cinco delas poderão ser preservadas. E uma nobre comissão é instituída da missão de escolher quais serão estas.

Repleta de recursos audiovisuais muito bem empregados pela trupe, a montagem é um deboche óbvio às comissões, sejam públicas ou privadas, que precisam decidir o que é válido e o que não é no mundo da arte – este crítico que vos escreve sabe bem quão inglória é tal tarefa.

E eles dialogam com as mais distintas manifestações artísticas, como a videoarte, as artes cênicas, a música (improvisada e feita ao vivo), o mundo dos quadrinhos e das artes plásticas.

O espetáculo não parece interessado em exibir boas atuações ou mesmo parecer uma concepção clássica de teatro – apesar de defender sua estética até o fim. Muito pelo contrário, ele se arrisca e provoca ao propor repensar o buraco burocrático onde a arte (e o teatro está aí dentro também) se enfiou. Será que ainda dá para sair?

Realidade ou ficção? Comissão decide qual obra de arte deve ser preservada – Divulgação

Concílio da Destruição
Avaliação: Muito bom
Quando: Sexta e sábado, 21h, domingo, 19h. Até 2/6/2013
Onde: Teatro Cacilda Becker (r. Tito, 295, Lapa, São Paulo, tel. 0/xx/11 3864-4513)
Quanto: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia-entrada)
Classificação etária: 16 anos

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