Artistas lamentam morte de Norma Bengell
Por Miguel Arcanjo Prado
A morte da atriz Norma Bengell, aos 78 anos, nesta quarta (9), no Rio, vítima de complicações de um câncer no pulmão, comove a classe teatral. O corpo será cremado nesta quinta (10), às 14h, no Cemitério do Caju, no Rio.
Norma sempre foi nome reconhecido do cinema, no qual foi musa absoluta e dona do primeiro nu frontal do cinema brasileiro, em Os Cafajestes, de Ruy Guerra, em 1961, e ainda atuou em O Pagador de Promessas, de Ancelmo Duarte, que levou Cannes em 1962.
Mas também Norma marcou a televisão e, claro, os palcos, onde fez desde teatro de revista a montagens de textos clássicos.
Artistas choram a perda
Phedra D. Córdoba, atriz cubana que trabalhou com Norma Bengell por diversas vezes, está abalada com a morte da amiga.
— Éramos amigas desde os anos 1950, quando nós duas dançávamos no teatro de revista. A gente sempre se encontrava na casa da Marina Marcel, que era argentina e nossa amiga em comum, em Botafogo, e ríamos muito. Quando voltamos a trabalhar juntas em 2008, em Vestido de Noiva, dos Satyros, sempre nos lembrávamos dessas histórias. Era uma grande atriz. Temperamental, mas eu gostava muito dela. Eu sofro muito com a partida desta minha amiga. Infelizmente, este é nosso destino: nascer, viver e morrer.
O diretor Rodolfo García Vázquez, que levou Norma ao palco em sua penúltima peça, Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, em 2008, lembra um fato curioso na morte da atriz.
— A coisa que mais me impressionou foi que Norma morreu um dia depois do Patrice Chéreau [diretor francês] morrer. Eles trabalharam juntos em grandes sucessos. Ela era atriz fetiche dele. Lembro que, quando fui na casa dela, ela me mostrou várias fotos com ele.
Vázquez afirma que Norma foi uma das atrizes mais carismáticas que o Brasil conheceu.
— Ela fez teatro de revista, foi o primeiro nu frontal do cinema, gravou disco, lutou contra a ditadura. Era uma atriz completa e tinha um carisma em cena incrível. Ela entrava e iluminava tudo. A morte de Norma Bengell é uma grande perda para cultura brasileira.
O ator Laerte Késsimos, que foi colega de Norma na peça Vestido de Noiva, também recebe a notícia com pesar.
— Na época da peça, ficamos muito amigos. Ela era muito íntegra com a vida e lutadora para conseguir tudo o que ela queria. Era uma mulher alegre e cheia de vontade de viver. Com ela não tinha frescura.
“Ainda sou uma mulher bonita”, disse Norma ao R7
A última peça de Norma Bengell foi Dias Felizes, de Samuel Beckett, encenada em 2010 no Teatro do Sesc Ipiranga, em São Paulo, com direção de Emílio Di Biasi, seu amigo de longa data e com quem fez a lendária peça Cordélia Brasil, de Antonio Bivar, em 1968, montagem contestatória que causou revolta entre os militares e Norma chegou a ser sequestrada pela ditadura, contra a qual sempre lutou.
Por ocasião da estreia de Dias Felizes, Norma deu entrevista a este jornalista. Disse que era otimista assim como sua personagem “senão, já tinha morrido”. E ainda falou que ainda se sentia bela.
— Ainda sou uma mulher bonita. A beleza apenas muda com a idade.
Polêmicas no palco
Em 2007, Norma viveu uma polêmica no palco do Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, por esquecer no palco o texto da peça O Relato Íntimo de Madame Shakespeare.
Em 2008, quando encenou Vestido de Noiva com Os Satyros, peça na qual reviveu a personagem Madame Clessy, sofreu com problemas técnicos na estreia da obra no Festival de Curitiba. Saiu do palco chorando. Ao R7, em 2010, ela explicou:
— Aquilo não foi culpa minha. Eu tenho culpa se o som pifou na hora?
“Podem falar o que quiser de mim, eu não ligo”, Norma Bengell
Polêmicas jamais foram novidade na vida de Norma Bengell. Tanto na vida de atriz como também na de diretora de cinema. Em 1996, foi acusada de desviar dinheiro público na prestação de contas do filme O Guarani, que produziu e dirigiu. Isso lhe custou o bloqueio de seus bens. Na última entrevista ao R7, disse que era inocente de todas as acusações.
— Podem falar o que quiser de mim, eu não ligo. Eles falam porque não têm outro assunto.
Sobre sua fama de atriz difícil, ela falou:
— Eu não me meto no filme dos outros. Mas se me botar dez horas esperando no sol quente, eu reclamo mesmo. Tem de reclamar. Eu disse sim ao que era certo e não ao que estava errado.
Disco de bossa nova
Norma também foi cantora. Em 1959, lançou o disco Ooooooh! Norma, no qual cantou clássicos da bossa nova que surgia.
— Aquilo foi ideia do Aluizio de Oliveira [dono de gravadora]. Cheguei a fazer show com o João Gilberto no Beco das Garrafas [Copacabana]. Mas, com o tempo, o cinema foi me afastando da música.
Norma sempre lutou pela liberdade democrática no Brasil.
Presa várias vezes durante a ditadura, o que a obrigou a se exilar em 1971, Norma afirmou que não guardava mágoas do passado. Muito pelo contrário:
— Sou uma pessoa muito feliz. Eu tenho minha cachorrinha, que é linda. Vivo muito o presente.
Sobre o tipo de pessoa que poderia conquistar seu coração, ela declarou:
—Eu gosto de pessoa inteligente. Gosto muito de rir, de quem tem humor para a vida. E tem que ter a questão de pele.
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Que descanse em paz!
Da foto da passeata: acho adorável a Eva Todor, excelente atriz cômica; Tônia Carrero, ícone de beleza; Eva Wilma, engajada; Leila Diniz, que fez filmes espetaculares; Odete Lara, uma beldade que virou esotérica; e Bengell. E afinal, que fim levou a situação envolvendo o filme O GUARANI? Foi esclarecida ou não?