Domingou: A sensibilidade de Juana Molina
Por MIGUEL ARCANJO PRADO*
O som que rola é tão bom, que até o latido de um cachorro insistente se incorpora a ele, tornando-se apenas mais uma nota musical. Tal sensibilidade é de uma artista que, se fosse possível estabelecer uma lista dos dez mais talentosos músicos contemporâneos, seu nome certamente: a argentina Juana Molina.
A cantora portenha é um verdadeiro oásis de música conceitual feita com toda a sensibilidade do mundo. E se engana quem pensa que a ela só se interessa instrumentos autóctones; muito pelo contrário, Juana é, ao mesmo tempo, moderna, folclórica, eletrônica. Faz de sintetizadores sua marca. Mas não é uma deslumbrada tecnológica. Muito pelo contrário, transforma sons possíveis pela máquina em música sensível, quase acústica. Artista de seu tempo, compõe com o caos que o mundo atual lhe dá.
Tanto talento está no sangue; é filha do cantor de tango Horacio Molina e da atriz Chunchuna Villafañe. Nascida em 1º de outubro de 1962, em Buenos Aires, começou na música ainda na infância, tocando violão. O toque cosmopolita para seu trabalho veio com o exílio da família em Paris entre 1976 e 1981, por conta da ditadura militar na Argentina.
Assim que retornaram, ela logo se misturou aos artistas que movimentavam a Buenos Aires dos anos 1980, época de puro rock nacional. E acabou se enveredando pelo mundo da atuação. Tornou-se conhecida aos 26 anos, atuando em um programa humorístico na TV. Logo, ganhou programa próprio, Juana e sus Hermanas, no qual debochava do mundo latino-americano.
Mas foi em 1996 que tomou sua decisão mais acertada: mergulhar fundo na música, ouvindo o chamado de seu passado. Seu primeiro disco, já trazia no nome a impossibilidade de defini-la. Chamava-se simplesmente Rara.
Enquanto o Brasil ainda teima em virar as costas para o país vizinho, consumindo qualquer imposição musical interna ou que venha dos Estados Unidos, o mundo já descobriu a potência de Juana Molina.
Tanto que ela costuma fazer turnês disputadas em cidades como Londres, Madri, Chicago, Seatle, São Francisco, Paris, Berlim, Praga, Tóquio e Hong Kong, além de se apresentar cotidianamente em sua Argentina natal.
Para quem precisa de referências alheias, o New York Times chegou a colocar seu terceiro disco, Três Cosas, entre os dez melhores lançados em 2004. E muita gente tarimbada por aí diz que ela é uma Björk da nova geração.
O que Juana Molina propõe com sua música visceral é uma verdadeira experiência sensorial. A artista, que gravada traz o mesmo vigor que exibe em seus concertos, prende seu ouvinte e o leva junto de si para viagens complexas e cheias de significados possíveis. Basta ceder a mão e acompanhá-la em seu som conceitual, cosmopolita e, ao mesmo tempo, altamente próximo de qualquer pessoa sensível.
Para Juan Manuel Tellategui, Diego Herrera, Julio Etchepare, Bruno Machado e Rodrigo Sampaio, ouvintes de Juana Molina.
Ouça uma música de Juana Molina
Assista a uma apresentação de Juana Molina
*Miguel Arcanjo Prado é jornalista e acredita em música como expressão artística. A coluna Domingou, uma crônica semanal, é publicada todo domingo no blog Atores & Bastidores do R7.
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Aplausos efusivos para o parágrafo: “Enquanto o Brasil ainda teima em virar as costas para o país vizinho, consumindo qualquer imposição musical interna ou que venha dos Estados Unidos, o mundo já descobriu a potência de Juana Molina.”. Ontem, passeando por um centro de compras, vi estarrecido uma coleção inteira de Moda Praia baseada na bandeira americana. Nem que fosse pela proximidade do advento da Copa do Mundo no Brasil, um pouquinho, mais um pouquinho mesmo de brasilidade cairia bem. Se quiser, vou lá e tiro até foto para mostrar que é verdade. A coleção inteira de Moda Praia com estampa da bandeira americana. Neocolonização cultural na veia! E, enquanto isso, Faustão fala que o cabelo da dançarina negra de Anitta é “vassoura de bruxa”.
É dureza, né, Phillipe? Quando vamos acordar?
Acredito que, aos poucos, estamos acordando. Gostei do pronunciamento da comunidade CACHEANDO EM SALVADOR sobre a polêmica envolvendo Arielle Macedo, a dançarina de Anitta cujo cabelo Faustão chamou de “vassoura de bruxa”. Para dar o crédito à mídia que tratou do assunto, peço licença para publicar um “link”, abaixo. Se não for possível, tentarei fazer um resumo com minhas próprias palavras:
http://www.paraiba.com.br/2014/04/22/03813-cabelo-vassoura-de-bruxa-comentario-de-faustao-sobre-dancarina-de-anitta-gera-revolta
Gostei particularmente da frase de efeito sobre não aceitar padrões eurocêntricos de beleza, sendo que eu recentemente comentei aqui sobre o penso acerca da (destrutiva) influência da boneca Barbie, não só por ser um símbolo capitalista, mas pelo simbolismo que carrega de doutrinação de que a “mulher ideal” é branca, loira, de olhos azuis e esguia.