“Quero mais dinheiro para teatro do que para Copa”, diz Otto Barros, diretor de cena do Oficina
Por MIGUEL ARCANJO PRADO
Fotos de EDUARDO ENOMOTO
Quando deixou o tradicional bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, Otto Barros pensou que fosse parar em Buenos Aires, sonho antigo que ele não sabe direito explicar por quê.
Acabou no meio do caminho, em São Paulo, ou Sampã, como dizem os integrantes do Teat(r)o Oficina, dirigido por José Celso Martinez Corrêa, do qual faz parte.
Otto tem nome que homenageia o tio que deu força para o namoro de seus pais. Nasceu no Rio, em um inverno, no dia 15 de junho de 1989. A vida artística deu sinais ainda na escola, nas peças infantis. Cresceu e o teatro invadiu sua vida.
A estreia profissional foi aos 15 anos, com a diretora Goreth Albuquerque, em Roda Mundo Severino, uma adaptação de Morte e Vida Severina, do poeta João Cabral de Mello Neto.
Depois, foi trabalhar com Nelsinho Rodrigues, filho do jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues, em uma adaptação para A Vida como Ela É.
O ano de 2010 chegou e com ele veio o desejo de ir embora do Rio. Entrou em uma crise e resolveu sair fora. Justamente nesta época, o Oficina estava em cartaz na cidade. Ele ainda não fazia ideia da existência do grupo.
Estava cansado das oficinas de teatro, “com aquela coisa de ficar andando pelo espaço”, e foi ver Cacilda!!. A então diretora de cena do Oficina, Elisete Jeremias, o confundiu com um dos oficineiros e pediu que o ajudasse a embalar algumas coisas. Obedeceu. Está no Oficina até hoje.
O convite inicial foi se mudar para São Paulo, para ser assistente de Elisete, que logo virou mestre. Sua mãe, Denise, ficou preocupada. Mas apoiou o filho. É do tipo “protetora à distância até hoje”, define.
Fez as malas sem pensar muito e chegou em São Paulo em 27 de novembro de 2010, justamente quando o grupo fazia Dionisíacas, logo após Silvio Santos ceder o terreno ao lado para o Oficina utilizar em suas peças, marco histórico na disputa entre Zé Celso e o empresário.
Após mais de três anos na cidade, diz que ainda não conhece a metrópole direito — a primeira vez que pisou no Memorial da América Latina foi para fazer esta reportagem. Também conta que ainda sofre com o frio. Revela que estar no Oficina é uma espécie de mergulho intenso, com uma relação de afeto com os companheiros de cena.
Dois anos depois que chegou, Elisete Jeremias deixou o Oficina. Otto precisou assumiu as rédeas da função de diretor de cena. Já a tinha substituído certa vez, em Macumba Antropofágica, quando ela precisou ausentar-se para participar da Quadrienal de Praga.
“Sem dúvida foi uma passagem de bastão. Mas não foi uma substituição. Não cheguei porque ela saiu. Ficamos dois anos trabalhando juntos. A saída da Elisete foi algo natural. Sinto que ela vai voltar em algum momento. Ela é de casa. O Oficina sente assim. Ela só está dando um tempo”. Conta que os ensinamentos de Elisete são utilizados em seu cotidiano. “Quando surge um problema, eu penso: ‘como que a Elisete resolveria isso?’. Sempre me ajuda. Ela ainda está presente. Deixou um legado.”
No Oficina, o diretor de cena está evidente o tempo todo. Integra o elenco no teatro projetado por Lina Bo Bardi que aboliu a diferenciação entre palco, plateia e coxia. Não há bastidores. Tudo é cena. Otto considera isso maravilhoso: “Tudo se mistura e passa por mim”.
Como sua função que exige atenção o tempo todo — é responsável pelo bom andamento técnico dos espetáculos, que no Oficina podem ultrapassar as cinco horas —, diz que é um trabalhão atuar e manter-se atento ao mesmo tempo. Mas sempre tudo dá certo. “Tem uma magia, as pessoas estão atentas aos sinais”. Para estar alerta, faz questão de chegar cedo e se aquecer por pelo menos duas horas.
Revela que a maquiagem pesada e o figurino que usa em Walmor Y Cacilda 64: O Robogolpe, a atual peça do Oficina, o ajuda a entrar no clima: “É uma pintura quântica. Tudo parece um quadro de Picasso”.
Otto conta que Zé Celso virou um “amigo muito querido”. Afirma que o diretor “é um encenador muito esperto, que sabe o que quer e aproveita muito as pessoas no jogo”. “O Zé é um gênio do amor, da sensibilidade e do teatro. Traduz nele mesmo sua direção. Ele faz um movimento e eu já saco o que ele quer. E não tem essa coisa de mito. Eu chego ao teatro e ele está lá, se alongando. Quando pede para eu ir buscar um lanche, o chapeiro da lanchonete já sabe fazer do jeito que ele gosta. O Zé é simples. E genial ao mesmo tempo”, define.
Quando precisa de tempo para si, vai para a varanda de seu apartamento, no alto do 19º andar do edifício na esquina de avenida São João com Duque de Caxias, coração do centro paulistano. “Gosto do centro, da cidade. Essa coisa de ficar no campo andando a cavalo e comendo fruta não é comigo. Não consigo”. É claro que há inconvenientes, mas prefere ver o lado bom. “Outro dia roubaram minha bicicleta, mas agora estou andando a pé e estou achando ótimo”.
Sobre o futuro, diz não fazer planos: “Acho ótimo não saber tudo o que quero. Estou vivendo. Só sei que quero continuar no teatro. Ah, e quero mais dinheiro para o teatro do que para a Copa”.
Walmor y Cacilda 64: O Robogolpe
Quando: Sábado, 21h; domingo, 19h. 120 min. Até 29/6/2014
Onde: Teat(r)o Oficina (r. Jaceguai, 520, Bixiga, São Paulo, tel. 0/xx/11 3106-2818)
Quanto: R$ 40 (inteira); R$ 20 (meia-entrada) e R$ 5 (moradores da Bela Vista, com comprovante de residência); grátis no dia 17/5/2014 por conta da Virada Cultural, ingressos distribuídos a partir das 20h
Classificação etária: 16 anos
Agradecimento: Memorial da América Latina (Marília Balbi) e Oficina (Beto Mettig).
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Miguel,por falar no teatro oficina,você poderia fazer uma matéria com o Roderick Himeros né?Queria saber mais da trajetória dele e além do mais vamos combinar,o cara é lindo(fiquei impressionada com a beleza dele)beijos
Otto! Enorme coração de menino! Sorriso de anjo que olha esse mundo com complacência, então não poderia ser menos do que é: um grande ator e diretor de cena no palco e na vida!!!
Achei as declarações do Otto todas muito espontâneas. Ele me soou como alguém muito genuíno, que não fica posando de algo que não é, como às vezes tristemente me deparo em entrevistas de alguns que se autointitulam “descolados” e estão sempre com um ar “blasé”, como diria a Fabíola Reipert. Toda a boa sorte para ele!
O Otto é um cara que tem presença, Phillipe. Não é à toa que virou braço direito do Zé Celso tão jovem. Abração!