Entrevista de Quinta: “Quero fazer a discografia do Oficina”, diz atriz e cantora Letícia Coura

A atriz e cantora Letícia Coura: ela gosta de samba, e de teatro também – Foto: Bob Sousa

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
Fotos BOB SOUSA

A mineirinha de Belo Horizonte Letícia Coura é uma das figuras emblemáticas do teatro paulistano. Na cidade há mais de 20 anos, logo se misturou à turma do palco e também ao pessoal da música. Transita pelas duas áreas com todo o conforto do mundo.

Ela integra o grupo Revista do Samba, que acaba de lançar seu quinto disco, Samba do Revista. O trio, que ainda tem Vitor da Trindade e Beto Bianchi, é considerado referência em seu estilo musical. Além de cantora, também é atriz e integra o elenco do Teat(r)o Oficina dirigido por Zé Celso.

Agora em setembro, estará com o grupo no Mirada, o Festival Ibero-americano de Artes Cênicas de Santos, apresentando a peça Walmor y Cacilda 64: Robogolpe, na qual vive a atriz Cleyde Yáconis, mais uma personagem emblemática para seu currículo, onde já figura Tarsila do Amaral.

Letícia recebeu o Atores & Bastidores do R7 para esta Entrevista de Quinta em uma tarde de sol no Teat(r)o Oficina, no Bixiga, região central de São Paulo.

Ao contar sua história, explicou sua batida perfeita entre a música e o teatro. E ainda revelou seu projeto futuro: construir a discografia das músicas das cinco décadas do Oficina.

Leia com toda a calma do mundo.

Letícia Coura e seu cavaquinho: ela quer construir a discografia do Teat(r)o Oficina – Foto: Bob Sousa

Miguel Arcanjo Prado — Você é de Belo Horizonte, né?
Letícia Coura — Sim, mas já estou tanto tempo aqui em São Paulo que, às vezes, parece que minha vida em BH foi em outra encarnação [risos]. Meus pais eram do interior de Minas, meu pai era desembargador e minha mãe, contadora.

Miguel Arcanjo Prado — Como era quando criança?
Letícia Coura — Era a mais animada da sala, na festa junina, então, era emprestada para as quadrilhas das outras salas. Sempre gostei de música. Fiz violão clássico, depois passei para o popular, cantei em coral… Como cantora sou ótima atriz e como atriz sou uma ótima cantora [risos].

Miguel Arcanjo Prado —E quando chegou a hora do vestibular?
Letícia Coura — Escolhi comunicação na UFMG, sou sua colega de curso. Tenho uma irmã médica e um irmão arquiteto. Já estudava música, mas fiz comunicação. Na época da faculdade, comecei a fazer performance e vídeo. Fiquei um ano fora, morei em Genebra e Londres, e um pouquinho na França. Lá na Suíça toquei numa banda. Estudei inglês, viajei…

Miguel Arcanjo Prado — E foi bom dar este tempo?
Letícia Coura — Foi bom sair de casa, porque me virei sozinha. Trabalhei em restaurante, essas coisas. Ir para a Europa me fez ver que eu era ligada à cultura brasileira. Vi que conhecia muito a música brasileira. E quis voltar para o Brasil.

Letícia Coura nasceu em Belo Horizonte, morou na Europa, mas foi parar em SP – Foto: Bob Sousa

Miguel Arcanjo Prado —Aí você terminou o curso na Fafich [Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG]?
Letícia Coura — Terminei, fiz jornalismo e publicidade. Acho que fiz curso superior porque disseram para mim que se um dia eu fosse presa teria direito à cela especial [risos].

Miguel Arcanjo Prado — E o que você fez?
Letícia Coura — Abri uma produtora com amigos lá em BH. Aí fiz um concurso para ser jornalista do Tribunal do Trabalho e passei. Acho que foi a única felicidade que dei para a minha mãe [risos].

Miguel Arcanjo Prado — Mãe mineira adora ver filho passando em concurso público [risos]. E aí você virou servidora?
Letícia Coura — Sim. Mas este trabalho me possibilitou fazer um monte de coisa que tinha vontade. Estudei dança, fiz balé, gafieira, dança afro…E continuei na música. Era um trabalho que não atrapalhava… Tive muita influência do Clube da Esquina, comecei a fazer shows pelo DCE [Diretório Central dos Estudantes da UFMG]. Aí resolvi pedir transferência para São Paulo.

Miguel Arcanjo Prado — E conseguiu?
Letícia Coura — Sim. Cheguei em São Paulo em 1991. No começo, me dava uma angústia, sabe. Aí no prédio em que fui morar tinham dois músicos. Comecei a fazer a ULM [Universidade Livre de Música] e montei um show com o Chico Amaral [compositor mineiro, parceiro em vários sucessos do Skank] lá em BH. Ficava um pé lá, outro pé cá.

Miguel Arcanjo Prado — E o teatro?
Letícia Coura — A Titane [cantora mineira] estava morando em São Paulo e me indicou para fazer uma peça com a Beatriz Azevedo, porque ela precisava de uma cantora. Chamava-se I Love. Fizemos turnê em Campinas e tudo!

Foi ao ver peça do Oficina com Raul Cortez que Letícia ficou cativada pelo grupo – Foto: Bob Sousa

Miguel Arcanjo Prado — E o Oficina?
Letícia Coura — Morava na rua Vergueiro e fui ver As Boas do Oficina no Centro Cultural São Paulo, com o Raul Cortez no elenco. Era tão bonito! Lembro que pensei: ainda bem que me mudei para esta cidade que tem uma peça como essa. Aí a Beatriz me chamou para ir num ensaio de Hamlet, no Oficina. Lembro que era um Domingo de Ramos. Neste dia conheci o Zé [Celso, diretor do Oficina]. E aí acabei entrando para o Oficina e larguei o emprego no Tribunal do Trabalho.

Miguel Arcanjo Prado — Foi uma decisão difícil?
Letícia Coura — Foi. Estava tudo muito puxado, ensaios. E vi que não queria mais. Pedi para sair e não me arrependi. Já estava ligada ao teatro, então tive de fazer uma opção. É claro que de grana foi complicado. Comecei a dar aula de canto e aquilo me abriu um mundo.

Miguel Arcanjo Prado — Você resolveu investir na música?
Letícia Coura — Sim. Gravei o disco Bambambã, que é um disco com interpretações bem teatrais. Fiz turnê. Também fiz as Bacantes, no Oficina, na virada de 1999 para 2000. Depois, fui fazer peça no Satyros. Fiz a primeira peça com eles na praça Roosevelt. Lembro do Rodolfo [García Vázquez, diretor do Satyros] passando cera no chão antes de o teatro abrir [risos]. Conheci o Ivam [Cabral, ator] quando eles estavam voltando de Portugal. Ele tinha trazido um autor francês, Bernard-Marie Koltés e eu havia feito a tradução. Fizemos Retábulo da Avareza, Luxúria e Morte, no elenco tinha o Ivam, a Patrícia Vilela, o Daniel Gaggini, o Tadeu Perroni…

Letícia Coura integra o trio Revista do Samba, reconhecido até na Europa – Foto: Bob Sousa

Miguel Arcanjo Prado — Ainda não tinha a Phedra D. Córdoba?
Letícia Coura — Não! Eu lembro do dia em que a Phedra foi ver o Retábulo pela primeira vez. Lembro que o Ivam ficou todo intrigado, perguntando quem era aquela senhora [risos]… Depois a Phedra fazia ótimas apresentações no bar dos Satyros!

Miguel Arcanjo Prado —E a música?
Letícia Coura — Aí lancei meu segundo disco, Vian, em um show no Satyros, com direção do Rodolfo, com os poemas do autor francês Boris Vian musicados. O Ivam foi muito importante nesta época e fazia o show comigo, criamos juntos. Era em linguagem de cabaret. Foi uma época boa… O Satyros tinha coisa a semana inteira. Quando não fazia meu show, ficava na bilheteria. Depois, montei a Revista do Samba, que é o trio no qual estou até hoje ao lado do Vitor da Trindade e do Beto Bianchi. Foi a gente que fez o show da reabertura do Bar Brahma, na clássica esquina da Ipiranga com São João.

Miguel Arcanjo Prado — O grupo tem muito prestígio.
Letícia Coura — Olha, gravamos o primeiro disco, Clássicos do Samba, e logo fizemos turnê na Europa. O segundo disco, Outras Bossas, só saiu na Europa. Em 2005, fizemos o projeto Revista Bixiga Oficina do Samba, resgatando sambas paulistanos e trabalhando com as crianças do bairro.

Miguel Arcanjo Prado — E aí você passou a se dividir entre o grupo e as peças do Oficina?
Letícia Coura — Sim. Fiz Os Sertões, O Banquete, tudo… Neste ano, em Walmor y Cacilda 64: Robogolpe, que agora vamos apresentar no Mirada, lá em Santos, faço a Cleyde Yáconis. Já fiz também a Tarsila do Amaral… São personagens muito ricas e emblemáticas. Sempre trabalho a música dentro do Oficina. E sabe qual é o meu grande sonho?

Miguel Arcanjo Prado — Qual?
Letícia Coura — É um dia consegui fazer a discografia inteira das peças do Oficina. Porque a história musical do grupo é muito rica e merece ser registrada para o futuro.

A cantora e atriz Letícia Coura, no Teat(r)o Oficina: onde une teatro e música – Foto: Bob Sousa

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1 Resultado

  1. Amauri de Carvalho Ferreira Filho disse:

    Primeiro ví em cena, Tarsila num banquete afrodisíaco. Meu coração disparou, suor desgarrado e mãos trêmulas. Meu Deus, de onde saiu esta mulher?
    Depois, rí muito com a “arte educadora”…..
    A ví no piano passando as vozes de “Acordes” e cantando, afinadíssima, em cena.
    Então me apaixonei e me mandei de mala e cuia pra vê-la cantando com Adriana Caparelli em “Os Contrários” no Sérgio Cardoso.
    Se estou em São Paulo, recebo seu abraço carinhoso e seu sorriso, o mais mineiro de todos.
    A elegí como minha única e definitiva musa.
    Amo Letícia!

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