Por MIGUEL ARCANJO PRADO
Fotos BOB SOUSA
A calma no imponente saguão do hotel Maksoud Plaza contrasta com o trânsito caótico na região da avenida Paulista. Enquanto carros buzinam furiosos, Alexandre Borges surge com uma expressão tranquila e um sorriso aberto no rosto. O caos fica do lado de fora e a paz se instaura momentaneamente.
Apesar de ser uma estrela da TV e do cinema, afinal são 25 novelas e 28 filmes no currículo, ainda mantém aos 48 anos aquele menino que em 1985 saiu de Santos rumo a São Paulo com o sonho de se tornar ator.
Ele não só conseguiu realizá-lo muito bem, como agora também se aventura em outra função. Na última terça (2), estreou no Teatro Cemitério de Automóveis, a peça Uma Pilha de Pratos na Cozinha, de Mário Bortolotto, com sua direção.
Também está em cartaz na capital paulista até 26 de outubro outra peça com direção sua, Muro de Arrimo, no Teatro Brigadeiro, com Fioravante Almeida.
Nesta Entrevista de Quinta ao Atores & Bastidores do R7, Alexandre Borges falou sobre muitas coisas importantes para ele: a volta ao teatro paulistano, a relação com a família e os colegas de profissão, e até sobre a participação no último episódio de A Grande Família. E, claro, sobre o artista que quer continuar a ser.
Leia com toda a calma do mundo.
Miguel Arcanjo Prado — Quer dizer que você agora é também diretor de teatro?
Alexandre Borges — Pois é. Surgiram estes convites de amigos, pessoas que conheço há muito tempo, que admiro. Estou trabalhando com atores de uma geração mais nova. Foram pintando essas oportunidades. Resolvi topar. O Fioravante Almeida, do Muro de Arrimo, é meu amigo desde os tempos em que trabalhamos juntos no Oficina, quando ele estava começando. O Mário Bortolotto eu conheci em 2001, quando ele fez uma participação no filme O Invasor, do Beto Brant. De alguma maneira temos trajetórias parecidas. Somos de outra cidade e viemos para São Paulo.
Miguel Arcanjo Prado — Você é de Santos?
Alexandre Borges — Eu sou.
Miguel Arcanjo Prado — Estou indo agora para lá cobrir o Mirada [Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas de Santos]. Na sua época lá não tinha um festival tão grande assim…
Alexandre Borges — Não! Quem dera…[risos]
Miguel Arcanjo Prado — Como foi a estreia de Uma Pilha de Pratos na Cozinha?
Alexandre Borges — Foi ótimo! O Cemitério de Automóveis é um divisor de águas no teatro de São Paulo. O Bortolotto e aquela turma dele trouxeram uma linguagem nova. É um grupo importante, que renovou o teatro na cidade.
Miguel Arcanjo Prado — Você também começou no teatro de grupo?
Alexandre Borges — Foi. Quando cheguei fiz parte do grupo Boi Voador, fiquei dez anos fazendo peças. Vim de Santos em 1985. Já fazia teatro infantil lá com meu pai, o Tanah Corrêa [um dos grandes nomes do teatro santista]. Sempre tive o sonho de ser ator. A família sempre preocupada [risos]. Meus pais são separados, e a família da minha mãe é mais tradicional… Em 1985, tomei coragem e vim para fazer um teste com o Antunes Filho, no CPT [Centro de Pesquisa Teatral], e passei. E o Boi Voador era muito ligado ao Antunes nessa época. Meu começo foi ali no Sesc Consolação, na rua Dr. Vila Nova.
Miguel Arcanjo Prado — Como foi sobreviver nesta época?
Alexandre Borges — Poxa, Miguel, era dureza [risos]. Fazia de tudo, figuração em comercial, feiras, qualquer coisa que pintasse. Mas é assim mesmo, tem de se virar, tentar a independência na profissão, viver disso. Foi assim no começo. Aí rolou o cinema. E a televisão só surgiu depois de dez anos em São Paulo.
Miguel Arcanjo Prado — Você vive no Rio há muito tempo. Qual sua relação hoje com São Paulo?
Alexandre Borges — Quando fui para o Rio, me casei [com a atriz Julia Lemmertz], comecei a fazer televisão – estou há 21 anos lá –, mas, sempre tive o vínculo com meus amigos, meus companheiros de luta, de começo de carreira em São Paulo. Isso marca muito. Fiz com a Júlia Eu Sei Que Vou te Amar, com o Jabor, que foi aqui em São Paulo. Aí meu filho, Miguel, nasceu eu dei um tempo de teatro.
Miguel Arcanjo Prado — Por quê?
Alexandre Borges — A televisão estava me exigindo bastante e eu quis ser um pai presente, estar junto, ver a evolução. Aí dei um tempo no teatro. Quatro anos atrás, retomei minha relação com o teatro. Aí surgiu Eu te Amo, outra montagem com o Jabor, e Poema Bar, um espetáculo de poesia que já fiz no Rio, em São Paulo e na Europa. Eu faço Vinícius de Moraes e Fernando Pessoa, com um pianista de Portugal. Depois, vieram os convites desses atores que me chamaram para dirigir.
Miguel Arcanjo Prado — Como você virou diretor?
Alexandre Borges — Foi o Fábio Amaral, produtor, quem falou que eu poderia dirigir uma peça. Dois anos depois surgiu Uma Pilha de Pratos na Cozinha. E depois veio a peça Muro de Arrimo, com o Fioravante. Falei: põe meu nome aí, estamos juntos.
Miguel Arcanjo Prado — Foi difícil encarar esta mudança?
Alexandre Borges — De alguma maneira, eu sempre fui me preparando para esse lado da direção. Fui observando, trabalhando, tendo o gosto de ver a coisa. Direção é desde o trabalho do ator, mas ao mesmo tempo o figurinista te traz um desenho, o cara do cenário te mostra algo, e você vai vendo o que é legal, o que precisa mudar… Em vez de ser luz azul pode ser vermelha, a foto do programa pode ser esta… Você vai participando de todo o processo em um trabalho conjunto. Acho que me preparei para isso, porque no teatro já operei som, fui contrarregra, fiz divulgação, produzi, ajudei montar luz, fui atrás de patrocínio, viajei… Aos poucos fui caminhando para este lugar.
Miguel Arcanjo Prado — Sua mulher é atriz, sua enteada [Luiza Lemmertz] também já começou a fazer teatro aqui em São Paulo, com o Zé Celso e o Antunes. Como é ser de uma família de artistas?
Alexandre Borges — Nunca tivemos expectativa de a Luiza seguir carreira… O Miguel não sabemos o que vai ser. Acho que o artístico é importante. Os pais têm de estimular, levar ao teatro, a uma exposição, a um museu, a um concerto. A criança precisa ser estimulada a ter um senso estético. Mais do que uma carreira artística, quero que o Miguel tenha esse olhar artístico, de sacar o que é uma música clássica, o que é um rock, o que é o trabalho do ator, do músico, da dança. Isso deixa a pessoa com um refinamento para a vida, não importa se vai ser jornalista, ator, engenheiro. Ele vem ver a peça em São Paulo, comenta. A Luiza foi a mesma coisa, a gente sempre procurou que ela participasse de nossa vida artística, viajasse com a gente. Ela já decidiu que quer ser atriz. Agora, o Miguel ainda não sabemos, ele ainda vai decidir.
Miguel Arcanjo Prado — O que você anda fazendo além do teatro?
Alexandre Borges — Em cinema, lancei o Getúlio, que foi um grande sucesso [no filme ele interpreta Carlos Lacerda, rival do presidente]. Na TV estou dando um tempo. Vou participar do último capítulo de A Grande Família. Vão ligar para o Lineu e dizer que estão pensando fazer um seriado e vão estudar a família dele como referência. Aí vem o Daniel Filho e a turma da TV pra casa deles. Cada ator convidado vai fazer um personagem como se fosse de A Grande Família. Eu vou fazer o Evandro Mesquita. Adorei este convite, porque sou fã da série.
Miguel Arcanjo Prado — Como é reencontrar São Paulo depois de 20 anos no Rio?
Alexandre Borges — Tem um pouco da memória emotiva, de você andar em mesmos lugares onde andou 25 anos atrás. Reencontrando pessoas e conhecendo pessoas novas. Para mim é um reencontro muito emocional, me renova. O artista sempre tem de estar em xeque, procurar coisas novas, desafio. Quero me colocar em uma situação que não é confortável. Agora tenho uma responsabilidade maior, preciso entregar um produto para o produtor, para o ator, para o público. Saí da minha zona de conforto. E eu sou isso: esse cara que quer fazer coisas novas, participar junto dos atores da nova geração, estar na roda.
Miguel Arcanjo Prado — Voltar a fazer parte da turma?
Alexandre Borges — Sim. Isso mesmo. Não quero me isolar. Quero ser da turma do teatro. Isso me rejuvenesce, me faz voltar ao estado anterior, onde tinha de me virar fazendo figuração, feira, teatro infantil…
Miguel Arcanjo Prado — E ainda não se hospedava no Maksoud Plaza…
Alexandre Borges — Exatamente. O Maksoud é um upgrade [risos]. Isso tudo me faz sentir vivo, atuante. E tudo é para o público. O público de São Paulo me dá muito carinho.
Miguel Arcanjo Prado — Mesmo na TV, você sempre é chamado para fazer paulistanos. Eu me lembro de você em A Próxima Vítima, que era uma novela bem de São Paulo. Também agora em Tititi…
Alexandre Borges — Eu levo um pouco de São Paulo para o Rio. Adoro o Rio, adoro estar lá, mas muito da poluição de São Paulo está impregnado aqui ó [bate no braço, mostrando as veias e sorrindo].
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