Por MIGUEL ARCANJO PRADO
O ator e diretor de teatro musical Claudio Botelho se envolveu em uma polêmica durante a apresentação do espetáculo Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos, no Sesc Palladium, em Belo Horizonte, na noite deste sábado (19).
Segundo relatos de espectadores à reportagem, no palco, durante a encenação, ele colocou um caco [quando o ator improvisa] no texto da peça e chamou o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff de “ladrões”.
Boa parte dos espectadores mineiros não gostou e vaiou o artista. O público começou então a gritar “não vai ter golpe” e o espetáculo foi interrompido.
Muitos espectadores saíram da sessão e exigiram o dinheiro de volta na bilheteria.
Leia: Claudio Botelho pede desculpas
Inspirado na obra de Chico Buarque, nome fortemente ligado à esquerda e apoiador do governo Dilma, o musical é um compilado das canções de Buarque cantadas ao estilo da Broadway. Muitas das canções são verdadeiros hinos de resistência contra a ditadura civil-militar que vigorou no Brasil entre 1964-1985.
Um áudio divulgado pelo Mídia Ninja mostra uma tensa conversa entre nos bastidores da peça após a polêmica. As vozes, ao que tudo indica, são de Claudio Botelho e da atriz Soraya Ravenle, sua colega de elenco.
Na discussão, a atriz tenta acalmar o diretor, que fala aos berros. Ela afirma que ele não poderia ter provocado a plateia daquela forma em uma semana de tamanha tensão política no país. Ao que o diretor e ator responde:
“São neofascistas, são escrotos, são petistas, são o que há de pior no meu Brasil. Esta gente chega e peita um ator que está em cena”, diz Botelho.
“Um ator não pode ser peitado por um negro”
Aos gritos, Botelho ainda continua sua fala e solta uma frase racista: “Um ator que está em cena é um rei! Não pode ser peitado. Não pode ser peitado por um negro, por um filho da puta que está na plateia. Não pode. Não pode ser peitado. Eu estava fazendo uma ficção.” [Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Botelho afirma que falou “nêgo” como expressão que quer dizer “alguém” e não para se referir a alguém negro. “Não sou racista”, se defendeu].
Ravenle diz então que não concorda com Botelho.
“Você tocou numa ferida que está aberta a semana inteira”.
O diretor tentou se comparar a Zé Celso, outro nome fortemente ligado à esquerda, que teve sua versão da peça Roda Viva, musical de Chico Buarque, interrompida por partidários da ditadura civil-militar em 1968, com o elenco espancado, entre eles a atriz Marília Pêra.
“Olha, em 1967 [sic], os militares pararam Roda Viva, hoje os petistas pararam Roda Viva, você entende?”
Ao que Ravenle responde: “Não concordo com você”.
“Não precisa concordar não, porque sou democrático e nunca vou parar uma peça sua”, devolve Botelho.
Ravenle continua sua fala: “Mas a plateia tem direito de vaiar, você provocou, você continuou desafiando.”
“Pega seu dinheiro de volta. Essa peça é minha”, afirma Botelho.
A atriz diz que ama o diretor e fala que precisa falar uma coisa, desse lugar. Mas, avisa antes: “sei que você não vai gostar”. E segue: “Aqui a gente tem um espetáculo que é um grupo de pessoas, que também não é só você, que estava dando a cara ali, e levantar uma bandeira neste momento, nesta semana…”
Logo, ela é interrompida por Botelho, aos gritos.
“Mas eu sou o dono, sou o produtor, sou o responsável. É uma questão de sair”, afirma, sugerindo que a colega peça demissão. “O que eu fiz é o que eu faço sempre”, conclui.
“Você falou com toda a carga da semana inteira”, tenta interceder Ravenle.
“Isso aqui são bandidos. Mas ela [a presidenta Dilma Rousseff] é bandida, ela é ladra!”, grita Claudio Botelho.
Outro lado
A reportagem procurou Claudio Botelho, por meio de sua assessoria de imprensa, para que ele comentasse o caso e a frase racista que disse, mas até o momento não houve retorno.
Chico Buarque fica espantado
A reportagem também procurou o cantor e compositor Chico Buarque, para saber o que ele acha do episódio e de Claudio Botelho utilizar um musical com suas músicas para se manifestar politicamente.
Chico Buarque preferiu não se pronunciar.
Mas a reportagem apurou que, ao saber da postura de Botelho nesta manhã, o cantor teve uma reação “de espanto e de desagrado”, segundo revelou uma pessoa próxima a Buarque.
A reportagem apurou ainda que o próprio Botelho telefonou nesta manhã para Vinicius França, empresário de Chico Buarque, para tentar se explicar e dizer que, de todo modo, Belo Horizonte era a última cidade da turnê do espetáculo.
Sesc pede desculpas
O Sesc Palladium divulgou nota oficial sobre o caso e cancelou a apresentação deste domingo (20):
“Informamos que a apresentação da montagem Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos do último sábado (19/03) foi interrompida devido às reações motivadas pela manifestação política de um ator do espetáculo. Esclarecemos que o Sesc em Minas, a Pólobh e demais instituições envolvidas são apartidárias. Compreendendo o momento pelo qual o país passa atualmente e primando pela segurança de todos, a sessão prevista para este domingo (20/03) está cancelada. Os valores pagos pelos ingressos serão integralmente devolvidos […] Pedimos desculpas pelo ocorrido e por quaisquer transtornos gerados”.