Crítica: Com Mel Lisboa, “Luz Negra” recupera história negra esquecida
Por Miguel Arcanjo Prado
O musical “Luz Negra”, escrito e dirigido por Paulo Faria com seu grupo Pessoal do Faroeste, que tem Mel Lisboa no elenco, é exemplo de teatro resistente em uma das regiões mais temidas de São Paulo: a cracolândia, no bairro da Luz.
Ali é o lugar onde eles investem em um teatro musical brasileiro para contar parte de nossa história que foi esquecida: a criação, na década de 1930, do primeiro partido negro brasileiro, a Frente Negra Brasileira, que foi posto na ilegalidade por Getúlio Vargas durante o Estado Novo.
O texto apresenta a efervescência política, artística e intelectual de uma charmosa São Paulo dos anos 1930, com os primeiros negros com real possibilidade de mobilização artística e política em prol de sua etnia, em um Brasil ainda de ares escravocratas.
Para trazer poesia, a história é ambientada em uma rádio, na qual artistas e intelectuais negros trabalham. Nomes reais como Abdias do Nascimento (1914-2011), que criou o Teatro Experimental do Negro, viram personagens do musical, com letras também assinadas por Faria e música de Melvin Santhana, Thais Dias, William Simplício e elenco.
Em busca do diálogo, o diretor convocou três atores do grupo Coletivo Negro para assumirem os principais papéis: Raphael Garcia, Flávio Rodrigues e Thais Dias — esta última, atriz potente e de forte presença, domina o espetáculo como a primeira negra formada na Faculdade de Direito do largo de São Francisco. Todos cantam bem, cativando o público, sob direção musical de Felipe Roseno e Michi Ruzitschka.
No embate com a personagem de Thais Dias e fazendo o contraponto étnico, Mel Lisboa apresenta atuação envolvente e bem humorada, como uma ambiciosa atriz que tenta subir na carreira e acaba presenciando um crime lendário.
O elenco surge em cena misturado aos músicos, o que dá ritmo à encenação. Complementam o time de artistas Clency Santana, Cloddoaldo Dias, David Guimarães, Leona Jhovs, Melvin Santhana e William Simplício.
O espetáculo ainda faz conversar a movimentação política dos negros com a criação do mercado de cinema na região da Luz, que mais tarde se transformaria na Boca do Lixo. “Luz Negra”, assim, encerra a trilogia sobre a Luz feita pelo Pessoal do Faroeste — e que teve também as peças “Cine Camaleão”, em 2011, e “Homem Não Entra”, em 2013 — jogando holofote para uma história negra esquecida, mas merecida de ser lembrada à altura de sua importância.
“Luz Negra” * * * *
Avaliação: Muito bom
Quando: Segunda e terça, 21h. 75 min. Até 26/4/2016
Onde: Sede Luz do Faroeste – Rua do Triunfo, 305, Luz, São Paulo – tel. 11 3362-8883
Quanto: pague quanto puder
Classificação etária: 14 anos