Por PATRICIO RUIZ*
Colaboração especial da Cidade do México, México
Há alguns dias eu e meu companheiro, que é brasileiro, cozinhávamos e nos perguntávamos por que fazíamos teatro, em um exercício inútil de diminuir o tempo de espera até que a comida ficasse pronta e também de encontrar um sentido para o fazer artístico que cada um traz consigo em tempos de direitas latino-americanas ressentidas e golpes de Estado através dos mecanismos da democracia – quase como se o capitalismo houvesse devorado tudo, ou não. Talvez estas palavras se tratem disso.
Potencialmente Haydée foi um texto que escrevi para atriz uruguaia Federica Presa e dirigi durante 2013, ano em que comecei a viajar com as obras de que faço parte. Peças pequenas, outras grandes, que me permitiram conhecer mais mundo(s) e intercambiar experiências e formas de viver o teatro. Muitos lugares. Seja de minha Buenos Aires natal a Montevidéu, onde estreio outubro próximo a peça Cavalgar, com a mesma equipe de sempre; ou do Uruguai a Cuba (e ao amor) no início de 2016 até Guirona e Barcelona aonde vamos no segundo semestre ou México, onde estreamos três obras, mesmo lugar que já havia estado em 2015 com a peça Cerimônia sem flores, que escrevi e dirigi.
Deste último projeto surgiu minha relação com as atrizes mexicanas Fernanda Echevarría e Gabriela Guraieb, com quem vamos estrear em junho outro projeto, chamado Um vestido, também uma peça escrita e dirigida por mim.
A partir de Cerimônia sem flores, me contatou a companhia madrilena Funfanfarria, radicada no México, e juntos estrearemos neste maio dois monólogos: As plantas, do escritor espanhol Pablo Messiez, peça que adentra o mundo de uma mulher cuja pena não se vai, não sai com nada, como tampouco as manchas em seus panos, com Sara Nieto Gavilán e O que tarda em ferver a água, minha versão livre de Yerma, de García Lorca, com Gustavo Gonzalo em cena. Todos os nomes citados e os que não aparecem foram colisões para recordar, de onde levo amigxs, amor, diversidade e militância.
Voltando àquela pequena cozinha onde diminuímos o tempo, creio que a resposta que nos deixou plenos foi esta: o teatro é um encontro amoroso, um ofício honesto que defendemos com verdade e imaginação. Se não há amor, reunião ou um brinde, que não haja nada. O teatro como espaço de dizer, defender uma ideia, para a promiscuidade das ideias e formas, lugar de conhecer gente. Ainda que soe ingênuo é super poderoso quando ocorre.
Em tempos obscuros, o teatro, que é o que sabemos fazer, nos salvará, ao menos, evitando que percamos a cor, nos mantendo a voz, nos multiplicando, mantendo vivos os abraços.
Viajar podendo fazer o que gostamos e sabemos fazer é combativo e sobretudo um privilegio daquele que, já consciente e com comida na mesa, se pode sentir afortunado para voltar a declarar que fazemos teatro porque é político e porque é o que fazemos para escapar do espanto e, antes de tudo, para amar.
*PATRICIO RUIZ é diretor, ator, poeta e dramaturgo argentino. Estudou dramaturgia na EMAD e escreve e dirige suas peças em Buenos Aires, Cidade do México e Montevidéu. Indicado em 2014 ao Prêmio Teatro del Mundo por seus textos Potencialmente Haydée y Dejarse Herir. Ganhador do Prêmio Terry de Cuba melhor dramaturgia Latino-americana em 2016. Atualmente, produz a peça Un Vestido, com a produtora MartesNueve, em sociedade com o diretor brasileiro Léo Kildare Louback.