Crítica: Celebridade desesperada com a fama é foco de “Com Amor, Brigitte”
Por Miguel Arcanjo Prado
Nunca antes na humanidade tanto se soube sobre a vida do outro. Ter a privacidade observada por muita gente passou de ser apenas uma característica das celebridades para se tornar-se algo corriqueiro na vida compartilhada em redes sociais. Tal sensação está presente de alguma forma na peça “Com Amor, Brigitte”, escrita por Franz Keppler.
Ao construir uma situação fictícia, mas não por todo impossível de ter acontecido, o dramaturgo coloca Brigitte Bardot, papel de Bruna Thedy, refugiada do assédio imprensa na casa de um funcionário do hotel luxuoso no qual se hospedou no Rio, interpretado por André Corrêa. A situação se passa no fatídico ano de 1964, quando a estrela francesa causou furor em sua passagem por aqui, perseguida constantemente por fotógrafos e repórteres que eram sua tormenta (ou sua paixão não revelada?).
Os dois atores estão excelentes em cena, afinados, críveis e dedicados na construção de personagens sutis, mas cheias de intenção, em um registro de atuação correto e que foge, ainda bem, do exagero costumeiro quando se montam dramas no Brasil.
E a grande sacada da direção é desconstruir o texto dramático, basicamente composto de diálogos de Brigitte com seu anfitrião, com recursos épicos, revelando o processo teatral ao público, jogando o espectador para fora da fantasia alienante, fazendo-o pensar.
Ock cria uma direção inventiva, utilizando recursos interessantes como as diversas câmeras que filmam a todo instante a cena e o público, projetadas em uma tela, em uma espécie de Big Brother pós-moderno, e também utilizando recursos audiovisuais que dialogam com a peça e nos quais há uma presença marcante do ator Laerte Késsimos, como os amantes do passado de mademoiselle Bardot.
Tudo isso dialoga com o cenário pequeno, mas charmoso e funcional de Pedro de Alcântara Neto, sob a luz que ambienta as emoções criada por Fran Barros e os belos figurinos de época de Zé Henrique de Paula, que trazem o melhor da vestimenta dos anos 1960, enchendo os olhos do público com a beleza da qualidade do ajuste do bom e velho “corte e costura” que se perdeu.
“Com Amor, Brigitte” mostra que as celebridades padecem, talvez, de um mesmo mal que todos nós em tempos atuais: Qual é o limite para se expor ao outro? Muitas vezes, será que criticamos o que realmente queremos? O que da vida devemos reservar para nossa intimidade e o que podemos compartilhar com o restante do mundo? São perguntas cada vez mais atuais e cujas respostas não são tão simples de se obter. Nem por Brigitte nem por cada um de nós.
Com Amor, Brigitte * * * *
Avaliação: Muito bom
Quando: Sexta e sábado, 21h, domingo, 19h. 80 min. Até 31/7/2016
Onde: Pequeno Auditório do Masp – Av. Paulista, 1578, Bela Vista, São Paulo, tel. 11 3149-5959
Quanto: R$ 50 (sexta e domingo) e R$ 60 (sábado)
Classificação etária: 16 anos