Crítica: Morto poetiza instantes da vida em “As Ondas ou uma Autópsia”
Por Miguel Arcanjo Prado
Um corpo nu permanece inerte em cima de uma fria mesa de autopsia até que cria vida e deixa jorrar memórias múltiplas diante do público, enquanto uma fina chuva cai sobre si. Esta é a primeira imagem da obra “As Ondas ou uma Autópsia”, com concepção, texto, direção e atuação do ator Gabriel Miziara.
A montagem inaugura a trilogia do artista sobre a obra da escritora inglesa modernista Virginia Woolf (1882-1941), a quem Miziara estuda com intensidade desde 2002.
O corpo que surge em cena é atormentado por memórias de várias vidas que se acumulam, com inspiração no romance “As Ondas”, escrito em 1931, sobre a vida de seis amigos, com uma visão poética sobre o instante que muitas vezes deixamos passar sem perceber .Porque a vida é isso: uma sucessão de pequenas coisas no presente.
Olhares diferentes sobre a morte passeiam por personagens distintos. A obra envolve o público ao lembrar que os dias passam com a vida, sem nos darmos conta. Há um desalento presente o tempo todo. Como se a vida estivesse sendo desperdiçada (ou não houvesse sentido?).
Tal pensamento encontra abrigo na solidão misturada à urgência avassaladora que existe em uma metrópole como São Paulo, com sua futilidade fugaz.
Miziara também criou o cenário, inspirado na obra do artista plástico dinamarquês Ólafour Elíasson, que tem como costume misturar luz e água em suas grandes instalações.
Assim, o cenário-instalação de “As Ondas ou uma Autópsia” é um dos destaques desta encenação, em diálogo constante com a luz poética criada por Aline Santini, que serve para desvendar e encobrir as lembranças dos personagens ao se fundir ao vapor d’água, criando cenas sensoriais.
Miziara ainda pretende encenar as obra “Momentos de Vida”, baseada no livro autobiográfico de Woolf, e “Virginia”, texto inédito, nos próximos dois anos. Em se tratando da inglesa, não faltará uma visão cética da vida no palco.
“As Ondas ou uma Autópsia” * * * *
Avaliação: Muito bom
Quando: Sexta, 21h30, sábado, 21h, domingo, 19h. 60 min. Até 7/8/2016
Onde: Viga Espaço Cênico – Rua Capote Valente, 1323, metrô Sumaré, São Paulo, tel. 11 3801-1843
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada)
Classificação etária: 16 anos
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