Crítica: Paula Cohen reaviva discurso feminista na peça “Carne de Mulher”
Grandes momentos históricos sempre deixam marcas nas obras de artes de seu tempo. O levante feminista deste começo de século 20, observado não só no Brasil como no mundo, já mostra forte presença no teatro brasileiro que busca diálogo com o seu entorno. Prova disso é “Carne de Mulher”, monólogo com a atriz Paula Cohen, nome potente do teatro paulistano que foi a Rocicler da novela “I Love Paraisópolis”, na Globo, e que já cumpre quarta temporada.
A peça, em cartaz em São Paulo às 18h dos sábados no Teatro Eva Herz da Livraria Cultura do Conjunto Nacional, tem como base o texto “Monólogo da Puta no Manicômio”. Ele foi escrito pelos dramaturgos italianos Dario Fo e Franca Ramme em 1977 e foi lido pela atriz ainda enquanto estudava na Escola de Arte Dramática (EAD) da USP.
Paula assume as rédeas do texto, dando ao mesmo nova identidade em comunhão com a luta feminista contemporânea, com mulheres reivindicando lugar para seus discursos mesmo sob forte ameaça de silenciamento violento. A diretora da peça não poderia ser outra: Georgette Fadel, nome com farta experiência em criar um teatro propositivo e libertário.
A ficha técnica, toda composta por mulheres, ainda traz luz em diálogo poético de Marisa Bentivegna e trilha pop contemporânea de Claudia Assef, responsável por pinçar a alegórica canção “Gasolina”, do Grupo Teto Preto, que define bem o clima da peça.
Elementos do teatro pós-dramático estão presentes em cena, como o microfone no qual a atriz dá o depoimento. Outro destaque é o efeito do vapor que jorra em direção ao sexo da atriz, simbolizando o levante feminista que tanto incomoda quem se recusa a abandonar antigas formas de enxergar e oprimir a mulher.
A direção coloca Paula a oferecer sua própria carne ao público feminino no começo da obra, com mulheres escrevendo seus nomes na pele da atriz – no que muitas espectadores se revelam bem mais do que imaginam. A partir de então, ela assume o papel da prostituta presa em um manicômio, para onde foi após tomar uma decisão extrema em defesa de si mesma. Em resposta a um contexto masculino, patriarcal, impositivo e violento, a personagem se rebela com energia, evocando a força feminina ancestral.
Em “Carne de Mulher”, Paula Cohen cria um forte e poético manifesto feminista que a cada dia que passa neste inacreditável Brasil torna-se altamente mais emblemático e político.
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
“Carne de Mulher”, com Paula Cohen
Avaliação: Muito Bom ✪✪✪✪
Quando: Sábado, 18h. 60 min. Até 8/12/2018
Onde: Teatro Eva Herz – Livraria Cultura do Conjunto Nacional (avenida Paulista, 2073, metrô Consolação, São Paulo)
Quanto: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia-entrada)
Classificação etária: 14 anos