Crítica: Ótima, série The Politician da Netflix é fascinante e perturbadora
“The Politician”, série da Netflix
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Avaliação: Ótimo ✪✪✪✪✪
Como se comporta prestes a chegar à vida adulta uma ambiciosa geração que se acha melhor que as demais e que ainda tem sua vida completamente atravessada pela mediação constante das redes sociais? Esta parece ser a premissa da nova série da Netflix, “The Politician”, que estreia nesta sexta (27). E o que revela é fascinante e perturbador.
A frenética trama se passa em um colégio elitista californiano, no qual os adolescentes entram em ardilosa disputa pelo poder político estudantil, certame este que é uma espécie de treinamento para o implacável mundo adulto que os espera.
Para tanto, os adolescentes mergulham em jogos sórdidos em busca do domínio da aparência pública e de discurso de alto impacto sobre a audiência, mesmo que este esteja a quilômetros de distância da verdade. Na era da representação, a autenticidade vale o quê?
E qual seria o conceito de verdade dessa geração que se vê desde sempre filtrada por algoritmos e parece esquecer-se cada vez mais da essência natural do bicho homem?
Não custa nada lembrar: a humanidade ainda integra a natureza, por mais que o mergulho profundo na tecnologia veloz nos aliene cada vez mais disso, nos colocando em confronto constante com o universo ao nosso redor e com a nossa própria essência animal.
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Tal embate é cristalizado na figura do protagonista da série, o estudante Peyton Hobart, interpretado de forma magistral por Ben Platt, que mostra na série o porquê de ser um dos atores estadunidenses mais promissores de sua geração, já ganhador do Tony por atuação brilhante na Broadway.
O personagem calculou todos os passos da sua vida para tornar-se no futuro presidente dos Estados Unidos, mesmo que, para isso, tenha de maquiar seus sentimentos cotidianamente, aprisionando sua sexualidade dentro do armário.
Peyton não se avexa em usar quem estiver em seu caminho em benemérito próprio. Afinal, o outro, em “The Politician”, nada mais é do que um recurso para chegar aonde se deseja, mesmo que para isso seja preciso transpor todas as barreiras éticas possíveis — a forma como os jovens fazem uso político próprio das pautas sociais identitárias tão em voga lembra a hipocrisia de tantos por aí.
A série trata do trunfo do parecer sobre o ser, perfeitamente representado pela ambição insaciável do protagonista, personagem repleto de múltiplas camadas tal qual uma cebola impossível de ser completamente descascada. Trata-se de um dos papéis mais complexos já apresentados em uma série juvenil, defendido com bravura pelo talentoso ator.
Falando em talento, a série ainda guarda participação especial da maravilhosa Jessica Lange no que ela anda fazendo de melhor nos últimos tempos em séries televisivas: uma avó egoísta e mesquinha que é capaz de usar a neta doente (Zoey Deutch, também em ótima atuação) para obter vantagens próprias — a cena em que ela fura a fila do restaurante é inesquecível.
A produção é do criador de “Glee” Ryan Murphy, que assinou contrato de cinco anos na Netflix com valor aproximado de US$ 300 milhões. “The Politician” é uma série que entretêm os mais jovens, filhos deste século 21, ao mesmo tempo em que perturba aqueles de uma geração mais velha, ainda frutos do século 20. Estes talvez tenham sido os últimos na história a experimentar uma vida real/natural antes do mergulho (sem volta?) na realidade virtual (e muitas vezes sórdida) do digital.
Afinal, (quase) tudo em “The Politician” é plasticamente perfeito na superfície, mas internamente é fake e apodrecido.