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Crítica: Trabalhadores do sexo argentinos comovem público na peça Yira Yira

Yira, Yira, peça argentina que faz última sessão nesta quinta (21) no Estação Satyros: Juan Ejemplo (deitado), Sofía Tramazaygues, Pichón Reyna e Leandra Atenea Levine Hidalgo, trabalhadores do sexo na Argentina que contam suas vidas e dilemas em cena de forma poética – Foto: Bruno Isaković/Divulgação – Blog do @miguel.arcanjo UOL

Yira, Yira
Crítica por Miguel Arcanjo Prado

Avaliação: Muito Bom 

É realmente impactante em sua simplicidade tão desconstruída ver Leandra Atenea Levine Hidalgo, mulher trans argentina trabalhadora do sexo, cantar o tango “Yira Yira”, de Carlos Gardel. A música dá título à obra teatral na qual ela surge acompanhada de outros três profissionais do sexo do país hermano para fazer uma despretensiosa crônica de seus cotidianos. Sempre a partir do ponto de vista próprio e de serem não-atores (e mesmo assim com atuações que superam muitos atores brasileiros por aí). Estão ao lado de Leandra em cena Sofía Tramazaugues, Juan Ejemplo e Pichón Reyna.

Com produção no Brasil de Robson Catalunha em parceria com Os Satyros, o quarteto sob direção minimalista dos croatas Bruno Isaković y Nataša Rajković traz reflexões sutis e leves sobre a vida das pessoas que trabalham no mundo da prostituição, bem saciam, de certa forma, a curiosidade social em torno dessas figuras, que assumem em cena seus próprios discursos. A desesperança presente nos versos Verás que todo es mentira, verás que nada es amor. Que al mundo nada le importa, yira, yira. Aunque te quiebre la vida, aunque te muerda un dolor, no esperes nunca una ayuda, ni una mano, ni un favor” desconcerta qualquer espectador com um mínimo de sensibilidade, enquanto a música sai tremulante, e às vezes em solfejos desafinados, do frágil corpo de Leandra, tão dissidente do sistema.

Mas ainda há espaço para outros sentimentos, como a lascividade do testosterona presente em Juan Ejemplo e também em Pichón Reyna, donos de olhares hipnotizadores e resolutos para o público, acostumados que são a manter energias cativas. Já Sofía Tramazaugues, única mulher cis em cena, é quem mais se destaca no campo da atuação, com nuances para dizer o texto, como quando incorpora Eva Perón, a Evita, com mínimos recursos e fartos efeitos — um acerto da direção. Nesta cela, lembra que a mulher tão adorada pelo povo argentino até os dias de hoje também era vista como uma puta para a parcela social oligárquica, receosa de compartilhar seus privilégios com os menos favorecidos, os trabalhadores, tão defendidos por Evita.

O clima intimista perpassa toda a peça, que merece ser vista com tranquilidade, sobretudo para em seus silêncios que fazem com quem paremos dessa velocidade idiotizante que estamos, e escutemos e olhemos o outro. E ainda há a chance de escutar o bom e velho castellano — há legendas para quem não domina o idioma. Mas, atenção: quem deseja conferir de perto precisa correr, pois a obra só faz duas sessões em São Paulo, sendo a última delas nesta quinta (21), às 22h, no Estação Satyros (praça Franklin Roosevelt, 134). O ingresso é pague quanto puder ou quiser. Mas seja, no mínimo, mais generoso que os clientes dos artistas em cena. Eles merecem.

Yira, Yira
Crítica por Miguel Arcanjo Prado

Avaliação: Muito Bom 
Estação Satyros (praça Franklin Roosevelt, 134, metrô República, São Paulo, tel. 11 3258-6345). Quinta (21/11), às 22h (última apresentação). Pague quanto puder. 55 min. 18 anos.

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