Um ano sem João Gilberto, o artista que significou o Brasil
Por Márcio Tito
João Gilberto é o artista com mais decisões tomadas a cada “metro quadrado” dos discos que lançou e, sobretudo, dos discos que não lançou.
Para cada um segundo de canção, mil, dez mil decisões.
O significado profundo de Brasil utópico e ainda assim real, o tom, o timbre, o ritmo, a respiração e a inspiração, a escolha do repertório simbólico, o ajuste da captação, a audição do todo, a mixagem espiritual ou qual porta fechar para que ventos estrangeiros não cruzassem o palco sensível.
João, o homem orquestra de samba, realizou o projeto mais autoral de toda a civilização até então.
Foi ele “a conquista da ordem civilizada e a resistência do coração iorubá”.
O primeiro Bach do novo mundo.
João é o maior artista do século 20.
Realizou a obra de um branco que se definiu pela matemática preta, pelo efeito caipira, pela paz indígena, pelo sublime europeu, pela energia feminina, pelo sentimento de criança, pela falta de filtro dos animais e por tornar menos inefável a face de Deus.
Até significar o Brasil.
*Márcio Tito é dramaturgo, escritor e criador do site cultural Deus Ateu. Ele escreveu este texto a convite do Blog do Arcanjo em memória ao aniversário de um ano de morte do cantor, compositor e violonista baiano João Gilberto (1931-2019), maior ícone da música brasileira no mundo.