Morre Jane Di Castro, artista travesti pioneira na cultura
Por Miguel Arcanjo Prado
Morreu Jane Di Castro, artista travesti pioneira na cultura, aos 73 anos, após enfrentar luta contra o câncer, nesta sexta, 23, no Rio, apurou o Blog do Arcanjo. Ícone das artes, ela integrou uma geração de artistas que abriram caminho para a representatividade trans e travesti no mundo do entretenimento. Gostava de se definir como “atriz, cantora e show woman”.
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Amiga de décadas de Jane Di Castro, Eloína dos Leopardos, também atriz travesti pioneira, lamentou a partida da amiga ao postar uma foto em sua companhia e do estilista Walério Araújo. “Notícia péssima, acabei de receber! Minha melhor amiga, Jane Di Castro, nos deixou!”.
O Blog do Arcanjo conversou por telefone com Eloína dos Leopardos. “Estou sofrendo muito, porque Jane era minha melhor amiga. Mas ela descansou, não merecia ficar sofrendo. O corpo será cremado e não poderá ter velório, a irmã dela está cuidando de todos os trâmites”, afirmou.
“Jane Di Castro foi inspiradora de tudo, um ícone de todas as artes. Se existe Divinas Divas e outros espetáculos, foi a Jane que batalhou e criou, sempre de forma impecável. Ela era uma verdadeira artista, que amava o que fazia. Foi um talento do mundo”, definiu Eloína dos Leopardos, ainda muito emocionada.
Divinas Divas fazem sucesso no Theatro Municipal
A atriz Márcia Dailyn, primeira bailarina transexual da escola de bailados do Theatro Municipal de São Paulo, diva da praça Roosevelt e da Cia. de Teatro Os Satyros, também falou por telefone com a reportagem. “Estou sem chão, perdemos Jane Di Castro, artista travesti pioneira que marcou a história. Tive a honra de ter podido dividir com ela o palco do Municipal em janeiro deste ano em Divinas Divas. Ainda não consigo acreditar que ela se foi”, lamentou.
Admirada e respeitada pelo público e pela crítica, a atriz está no ar na Globo na reprise da novela A Força do Querer, de Gloria Perez. Na trama, Jane interpreta ela mesma, ídolo de Nonato, personagem de Silvero Pereira.
No último dia 14 de outubro, Jane escreveu em suas redes sociais: “Amo ter feito essa novela, obrigada Gloria Perez”.
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Ter sido convidada a atuar em uma trama do horário nobre foi importante para quebrar preconceitos e estereótipos que artistas trans e travestis ainda sofrem nos dias de hoje.
Em setembro deste ano, já em tratamento, Jane declarou: “Mesmo de cama, me recuperando de uma cirurgia, não posso deixar de assistir à novela que me projetou para o mundo”, comentou sobre sua participação no folhetim global.
Jane Di Castro foi ainda uma das estrelas do premiado documentário Divinas Divas, que ganhou o Troféu Barroco na Mostra de Cinema de Tiradentes, dirigido por Leandra Leal, que retratou com perspicácia e poesia a trajetória das travestis pioneiras nos palcos brasileiros.
Em janeiro deste ano, Jane Di Castro esteve em uma noite histórica no Theatro Municipal de São Paulo, no show Divinas Divas, que reuniu as trans e travestis pioneiras da cultura no palco mais emblemático do país. O espetáculo foi uma ação do então diretor do Municipal e atual secretário de Cultura da Cidade de São Paulo, Hugo Possolo, e direção de Robson Catalunha.
“Jane criou o Divinas Divas pra poder seguir juntas com suas amigas que marcaram uma época de ouro das travestis brasileiras. Foram precursoras ela, Rogéria, Valeria, Cláudia Celeste, Camile K, Eloína. Passaram pela ditadura de 1964 e em 1966 eram um sucesso pelos teatros do Rio de Janeiro”, lembrou a amiga Divina Núbia em conversa com o Blog do Arcanjo.
“A arte falou mais alto que o preconceito! Viveram o glamour, viajaram, amaram, foram felizes. Eu sou eternamente grata por todas as palavras de afeto e respeito para com o meu trabalho que Jane me falava. A prova maior foi o convite para fazer Rogéria com elas em Divinas Divas no Municipal. Que orgulho! E fizemos uma noite memorável. Jane Di Castro, Evoé!”, afirmou Núbia, emocionada.
Não fosse a pandemia, o espetáculo Divinas Divas teria feito parte da programação da Virada Cultural 2020, que foi cancelada por conta da quarentena. Elas negociavam uma apresentação no Teatro Anchieta do Sesc Consolação.
Na montagem, Jane Di Castro dividiu o icônico palco com Eloína dos Leopardos, Divina Valéria, Camille K, Márcia Dailyn e Divina Núbia, sob direção de Robson Catalunha. Todas foram ovacionadas pelo público que lotou o Municipal em 29 de janeiro, Dia Nacional da Visibilidade Trans.
Jane teve disputado salão de beleza no Rio na década de 1960, onde atendia a nata artística da época. Ela nunca abandonou o ofício da beleza, e até o fim atendeu em seu disputado salão em Copacabana, cuidando dos cabelos de um grupo seleto de clientes.
Logo, passou a brilhar nos palcos cariocas, fazendo temporadas históricas no Teatro Rival, fundado por Américo Leal, pai de Angela Leal e avô de Leandra Leal. Lá, foi colega de nomes como Phedra D. Córdoba, Eloína dos Leopardos e Rogéria.
Em 1981, ela atuou em um marco do teatro brasileiro, o espetáculo Gay Fantasy, dirigido por Bibi Ferreira e que contou no elenco com nomes como Rogéria e Ney Latorraca. A direção de arte da montagem foi assinada pelo lendário carnavalesco Joãozinho Trinta.
Carioca do bairro de Oswaldo Cruz, Jane Di Castro voltou a se encontrar com o amigo Ney Latorraca nos palcos em 2019, em seu espetáculo solo As Canções de Uma Divina Diva, que cumpriu temporada de sucesso de público e de crítica no Espaço dos Satyros na praça Roosevelt, centro de São Paulo. Com a montagem, ela celebrou seus 50 anos de carreira. “Foi uma honra ter Jane Di Castro conosco fazendo seu último solo no Espaço dos Satyros. Sua morte é uma grande tristeza”, declarou o ator Ivam Cabral.
Dona de trajetória artística irretocável, Jane Di Castro se apresentou nos principais palcos do Brasil e do mundo, incluindo aí o Lincoln Center de Nova York. Ela foi casada por cinco décadas com Otávio Bonfim, que morreu em 2018, vítima do câncer. Após o casamento LGBTQIA+ se tornar um direito legal no Brasil, ela fez questão de oficializar a união em 2014.
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