Por Miguel Arcanjo Prado
Imagens Edson Lopes Jr.
Assistente Felipe Margarido
Diva da Praça Roosevelt e da Cia. de Teatro Os Satyros, Márcia Dailyn foi a grande estrela da abertura do Festival Satyrianas 2020 na tarde desta quinta, 3 de dezembro, em uma performance que causou grande impacto no coração do centro de São Paulo.
A atriz e bailarina “trans e travesti”, como pontua, raiou como um forte sol, eclipsando tudo ao seu redor, vestida por estonteante figurino de Walério Araújo e com uma pomba da paz pousada em sua tiara. Pensada cuidadosamente por semanas, a roupa representou a relação de amor de Márcia com a metrópole, trazendo uma mensagem de esperança.
A apresentação foi uma verdadeira preciosidade presencial no festival de 78 horas de arte digital que vai até este domingo, 6, com mais de 400 atrações e 1.000 artistas participantes, sob coordenação geral de Gustavo Ferreira.
Na esfera digital, Marcia Dailyn atua no espetáculo internacional Macbeth Project #6 da Universidade de Birmingham, da Inglaterra, em parceria com o Satyros, com o qual ainda faz o sucesso A Arte de Encarar o Medo e participa de papo na SatyriBlack sobre representatividade trans e negra.
Com acessórios Lavish by Tricia Milaneze, a atriz e primeira bailarina trans do Theatro Municipal, colaboradora da SP Escola de Teatro, musa do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, da The Week e do Bar da Dona Onça dos chefs Jefferson e Janaina Rueda contou com assistência de Irlane Galvão, Caio Ribeiro e Gervasio Milaneze em sua produção eloquente.
Em ensaio exclusivo para o Blog do Arcanjo realizado pelo fotógrafo Edson Lopes Jr. e com assistência de Felipe Margarido, e que contou até mesmo com um drone exclusivo, Márcia Dailyn esbanjou intimidade com as câmeras e com o público presente na praça, definida por ela como seu “habitat natural”.
“A Praça é o meu lugar, meu habitat. Carrego com orgulho o título de Diva da Praça Roosevelt, que herdei da grande Phedra D. Córdoba e me foi dado por Ivam Cabral e Rodolfo García Vázquez. Phedra hoje se tornou uma árvore deste lugar que a imortalizou e levo com respeito seu legado”, disse, emocionada. “E te garanto uma coisa: não vai chover, meu amor”, dzinedo que os céus lhe atenderiam. O que realmente ocorreu.
“Fiz questão de trazer um girassol na mão, para representar o dia de luz e esperança por dias melhores”, pontuou, resoluta, enquanto se preparava no camarim do Espaço dos Satyros Um.
Ao vestir o figurino de Walério Araújo no palco, deu detalhes da vestimenta surpreendente: “Ela representa o luto da Selva de Pedra, a nuvem cinza que entristeceu São Paulo neste 2020, mas também aponta para um futuro melhor”, explicou.
Ao entrar na praça, Márcia bradou, sensibilizada: “Estou aqui, neste marco, representando todos que perdemos nesta terrível pandemia do coronavírus”. Fez questão de citar aos prantos as amigas transformistas pioneiras Miss Biá e Vânia Mattos e ainda mencionou a eterna Divina Diva Jane Di Castro, outra amiga trans que 2020 levou.
Refeita das lágrimas, continuou seu discurso: “Hoje, também trago comigo esperança para o dia de amanhã. Teremos um 2021 melhor do que foi este 2020 que todos nós queremos esquecer”, sentenciou.
De bota preta, body preto, rabo de cavalo e uma “arte em construção” grafitada na sua saia esvoaçante, Márcia desfilou por toda a praça, como se abençoasse São Paulo com a força de seu carisma. Impactados, os transeuntes na Praça Roosevelt aplaudiram fortemente a performance.
“No Carnaval, eu disse que a cidade cinza se vestiu de alegria. Agora, representei a cidade em luto que se veste de esperança com o nascer de um novo sol, representado por este girassol”, declarou. “A arte, a inovação, a tecnologia nos permitem ter esperança por dias melhores. E digo mais: este girassol representa também as Manhãs de Setembro, que Vanusa e nós do Satyros cantamos na peça Mississipi, essa canção que é um marco do Festival Satyrianas criado pelo Ivam Cabral, o Rodolfo García Vázquez e todos os artistas incansáveis dos Satyros”.
E, com olhos ao céu, antes de se retirar, a Diva da Praça Roosevelt profetizou: “A arte jamais morrerá! Nós vamos sobreviver e vencer!”. Que assim seja.
Miguel Arcanjo Prado é jornalista, mestre em Artes pela UNESP, pós-graduado em Mídia, Informação e Cultura pela ECA-USP e bacharel em Comunicação Social pela UFMG. Eleito três vezes pelo Prêmio Comunique-se um dos melhores jornalistas de Cultura do Brasil. Nascido em Belo Horizonte, vive em São Paulo desde 2007. É crítico da APCA, da qual foi vice-presidente. Passou por Globo, Record, Folha, Contigo, Editora Abril, Gazeta, Band, Rede TV e UOL, entre outros. Desde 2012, faz o Blog do Arcanjo, referência no jornalismo cultural. Em 2019 criou o Prêmio Arcanjo de Cultura no Theatro Municipal de SP. Em 2020, passou a ser Coordenador de Extensão Cultural e Projetos Especiais da SP Escola de Teatro e começou o Podcast do Arcanjo em parceria com a OLA Podcasts. Foto: Bob Sousa.