Morreu Eva Wilma, aos 87 anos, uma das maiores atrizes da história brasileira, às 22h08 deste sábado (15), no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, onde havia sido internada em 15 de abril. Sua morte foi em decorrência de complicações de um câncer de ovário disseminado que levaram à insuficiência respiratória. A informação foi confirmada pela assessoria da artista, Montenegro Talents. O Blog do Arcanjo lamenta profundamente a perda de tão importante e talentosa artista, o que deixa a cultura brasileira em luto profundo, e envia os sentimentos aos filhos da atriz, John Herbert Buckup e Vivien Buckup.
É impossível não lembrar a primeira vez que entrevistei Eva Wilma, em sua casa, em São Paulo. Era 2007, e eu havia acabado de me mudar de Belo Horizonte para São Paulo, e ela estava em cartaz com a peça O Manifesto, ao lado de Othon Bastos, um grande sucesso no Teatro Renaissance. Sugeri para Denise Gianoglio, minha então diretora de redação na revista Contigo!, na Editora Abril, uma entrevista com a atriz que seria publicada junto à minha crítica do espetáculo, na coluna teatral que fazia na publicação.
Tudo acertado, a entrevista seria feita na casa da Eva, já as fotos, no dia seguinte, no teatro. Então, Eva me recebeu em seu apartamento em uma tarde de muito carinho e sem qualquer tipo de maquiagem ou pompa. Me deixou completamente à vontade. Falou de tudo sem reservas. Rememorou seu começo na dança, como bailarina do IV Centenário, e também as lembranças de seu grande amor, Carlos Zara, inclusive me levou até o escritório que era dele e deu um programa de um espetáculo que ela fez com ele, para eu guardar como lembrança. No meio da conversa, ela me perguntou: você é mineiro, deve estar doido por um café, quer um? Eu disse que aceitava, sim.
Então, aquela grande atriz que havia encantado toda a minha vida com inúmeras personagens na televisão, de repente me chamou para ir com ela até sua cozinha. Lá, ela mesma colocou a água para ferver e, em poucos minutos, passou o café na minha frente, enquanto seguíamos com a entrevista comigo já de casa. Essa atitude, de uma pessoa tão simples e acolhedora, mostra a humanidade e a generosidade de Eva Wilma, atriz de talento farto, mas que jamais se deixou afetar pela fama, como parece ter virado a tônica nas novas gerações.
Depois desse dia, entrevistei dona Eva outras inúmeras vezes, em variados espetáculos que ela fez, porque esta grande artista se manteve nos palcos até o fim. E ela sempre repetiu sua grandiosidade para comigo.
Eva Wilma era de uma geração de trabalhadores das artes que, mesmo diante de toda sofisticação, jamais perderam sua conexão com o povo. Ela sempre defendeu a liberdade da classe artística e jamais abandonou os palcos, mesmo com o sucesso na TV. Por isso foi tão amada e admirada por todos. Sua morte é como se perdêssemos alguém de nossa família.
Enorme talento
Atriz de enorme talento, Eva Wilma fez mais de 60 trabalhos na televisão, mais de 30 trabalhos no cinema e mais de 60 espetáculos de teatro. Na TV, Eva Wilma fez personagens marcantes como as gêmeas Ruth e Raquel na primeira versão da novela Mulheres de Areia, na TV Tupi, em 1973, quando contracenou com seu segundo marido e maior amor de sua vida, Carlos Zara, e também a inesquecível vilã Altiva, em A Indomada, na Globo, em 1997.
Também é preciso mencionar a série de grande sucesso na TV Tupi entre 1953 e 1963 protagonizada por ela e por seu primeiro marido, John Herbert, Alô Doçura. Ela ainda protagonizou a série Mulher, ao lado de Patrícia Pillar, na pele da Dra. Marta, em 1998. Recentemente, brilhou como a alcoólatra Fábia em Verdades Secretas, de 2015. Sua última novela foi O Tempo Não Para, em 2019, na Globo.
Ela ganhou os principais prêmios do Brasil, como Troféu Imprensa, Prêmio APCA, Prêmio Saci, Prêmio Shell, Prêmio Aplauso Brasil, Prêmio Governador do Estado e Troféu Mário Lago. Nos palcos, fez peças icônicas como Um Bonde Chamado Desejo, em 1974. Suas últimas peças de maior destaque foram O Que Terá Acontecido a Baby Jane?, em 2016, e Quarta-Feira Sem Falta Lá em Casa, em 2018, nas quais fez dupla com Nicette Bruno, que morreu em dezembro de 2020 de Covid-19. Também em 2018 ela estreou como cantora, ao lado do filho John Herbert Jr. no show Casos e Canções, apresentado no Teatro J. Safra, em São Paulo.
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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