Mauricio Pazz lança Sarau para Alforria e selo Atlântico Sul Music| Podcast do Arcanjo
Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
Mauricio Pazz faz um lançamento duplo nesta sexta (29): o do single Sarau para Alforria, música inspirada na obra de Paulinho da Viola, e de seu selo Atlântico Sul Music, que pretende conectar a música das afro-Américas à da África, do outro lado do sul do oceano. Com mais de dez anos de carreira, na qual já fez parcerias com nomes como Chico César, Luedji Luna, François Muleka e Anaïs Sylla, o músico paulistano aposta nas composições próprias com diversas interlocuções artísticas. O talentoso instrumentista e compositor sensível é o convidado do Podcast do Arcanjo, feito em parceria com a OLA Podcasts, no qual fala sobre os lançamentos e sua trajetória. “As pessoas negras fazem vários sons, não apenas funk, samba e rap”, afirma.
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As pessoas negras fazem vários sons, não apenas samba, funk e rap.
Mauricio Pazz
músico que lança o single Sarau para Alforria e o selo Atlântico Sul Music
Sarau para Alforria
de Mauricio Pazz
Sarau para Alforria, composição de Mauricio Pazz, já está disponível em todas as plataformas digitais. A faixa tem clima guiado pelos tambores malinkes do oeste africano e universos harmônicos melódicos das afro-américas.
“Sarau para Alforria surgiu de uma reflexão profunda sobre a presença do lamento em diversas musicalidades negras ao redor do mundo, sobretudo o lamento na melodia. Fiquei pensando no quanto este traço pode estar relacionado às adversidades oriundas dos racismos deste sistema de opressão e exclusão. O lamento é algo que me toca profundamente e que, inclusive, eu acho de uma beleza transcendental… No entanto, comecei a imaginar o quão lindo será o dia em que nós negros e negras poderemos utilizar o lamento apenas como um recurso estético e não como uma forma de sublimar as dores vividas por narrativas concretas e objetivas oriundas das tensões raciais. Esse foi o fio condutor da obra”.
Mauricio Pazz, músico
Inspiração
Paulinho da Viola
Mauricio Pazz conta que Sarau para Alforria tem como inspiração o Choro Negro, de Paulinho da Viola. E que o termo “sarau”, presente no título da música, é em referência ao “Sarau para Radamés”, composta por Paulinho para homenagear o maestro Radamés Gnattali, e Um Sarau para Raphael, que celebra o violonista Raphael Rabello. Mauricio Pazz toca cavaco e violão tenor em Sarau para Alforria, que conta ainda com participações especiais de Vanessa Ferreira (contrabaixo), Alysson Bruno (percussão), Fábio Leandro (Teclado) e Allan Abbadia (trombone).
“Brindo aqui o Paulinho, mas também faço esse movimento, este exercício, de nos imaginar em uma condição diferente enquanto população negra… Alforriados daquilo que nos faz lamentar. Embora a tristeza e o sofrimento façam parte da vida, não é deles que lhe falo. Eu estou falando dos lamentos que surgem como desdobramentos das péssimas sensações e vivências que o racismo promove”, pontua o compositor.
“A introdução dessa música, com o solo de cavaco, chega para pedir a benção ao mestre, reverenciá-lo e dizer “olha!!! Eu te ouvi, viu?” e depois disso pedir licença pra dizer o que eu vim dizer. Tenho acreditado muito nessa potência do desejo. De imaginarmos o que queremos e buscar construir isso tudo”, acrescenta.
“Em tempos em que as distopias brotam a cada instante, a cada esquina, nas encruzilhadas do online e off-line, eu acho potente, transformador e, quiçá, subversivo relembrar que não precisa ser um King pra ter um sonho… O Martin tinha o dele, Dandara o dela e eu também tenho o meu… E acho que todos estes sonhos, pro desespero neoliberal, são mais coletivos do que individuais. We have a dream… Creio que posso afirmar que esse projeto é sobre isso e sobre tudo o que foi dito”, afirma Maurício Pazz.
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Selo
Atlântico Sul Music
Sarau para Alforria marca ainda o lançamento do selo Atlântico Sul Music, que tem Mauricio Pazz como CEO. O propósito é lançar trabalhos de artistas periféricos, sobretudo negros e negras, engajados com estéticas distintas daquelas entendidas como tipicamente periféricas.
“Em muitos momentos é como se apenas houvesse espaço para esses e essas artistas em determinados gêneros musicais. Vivemos um tempo em que o essencialismo impera: mulheres são lembradas em março, indígenas em abril, pretes em novembro… E, no caso de artistas negros de São Paulo é como se apenas pudéssemos tocar funk, samba e rap. Podemos. Mas podemos transitar por muitos outros gêneros também. E é por isso que eu tenho o desejo de que esse selo possa contribuir com esses outros lugares de pertencimento da cena musical e artística pretas da cidade”, diz Mauricio Pazz.
Sarau para Alforria
Ficha Técnica
Composição e Arranjo: Maurício Pazz
Cavaco: Maurício Pazz
Contrabaixo: Vanessa Ferreira
Percussão: Alysson Bruno
Teclado: Fábio Leandro
Trombone: Allan Abbadia
Violão Tenor: Maurício Pazz
Gravação e produção musical: Maurício Pazz
Mixagem: Gabriel Spazziani
Masterização: Maurício Gargel
Gravado em março de 2020 (São Paulo, SP)
Mixado e masterizado em maio de 2021 (São Paulo, SP)
Capa: Juão Vaz
Colaboração: Renata do Santos e Henrique Pessoa
Realização: Atlântico Sul Music
Entrevista
Mauricio Pazz
“As pessoas negras fazem vários sons, não apenas funk, samba e rap”, afirma Mauricio Pazz ao Podcast do Arcanjo. Discorrendo sobre a sonoridade e seus projetos, Pazz ainda recorda o projeto Cor do Som – Memória da Música Negra, trabalho que pesquisa e difunde a memória de artistas negros. “Eu, buscando referencias enquanto artista negro, identifiquei referências de artistas em geral e que se encontra de artistas brancos com facilidade, diferente de artistas negros. E Cor do Som é isso, sobre produção de memória”, afirma ao explicar o impulso para o projeto. A primeira temporada está disponível no Youtube.
E Mauricio fala sobre o nome e o nascimento de seu selo, o Atlântico Sul Music, além de sua sonoridade que mistura tambores malinquês da África do Oeste e cavaquinho de Paulinho da viola. “Fala-se muito do Atlântico Negro. Mas quando a gente vai ler no livro (Altântico Negro) a gente vê muito do norte, da sonoridade do norte do Atlântico. Eu estou pensando sobre a sonoridade do sul. É basicamente isso”.
Enquanto se preparava para estudar composição na USP, Pazz fez aulas e se apaixou pela música Choro Negro de Paulinho da Viola e lhe instigou o lamento nas melodias musicais a partir disso. “Com isso, veio o desejo de fazer um Sarau para Paulinho, passando os anos nasceu Sarau para Alforria, que é uma canção para nos alforriar daquilo que nos faz lamentar”.
“Eu fiquei pensando: Vai ser tão bonito quando a gente puder usar o lamento só como elemento estético. Então é isso, vou fazer uma música pra esse momento. Quando nós negros e negras pudermos ultilizar o lamento só como recurso estético. Então esse é meu desejo e meu sonho. Fazer música libertos da condição que nos faz lamentar, compartilha o artista de forma serena, poética e filosófica.
Mauricio Pazz
Hábil compositor e multi-instrumentista de cordas — violão tenor, guitarra e bandolim – o paulistano Maurício Pazz segue influências que vão do choro ao jazz, espraiando para ritmos de matrizes africanas presentes em diversas vertentes da música brasileira. Graduado em Música pelo Instituto de Artes da UNESP (2018) e mestrando em Processos de Criação Musical pela Escola de Comunicação e Artes da USP (2021), atua profissionalmente na música desde 2008 tocando com diversos artistas. Entre eles, Anaïs Sylla, Chico César, Coletivo Roda Gigante, François Muleka, Luedji Luna, Marco Mattoli, Natália Matos, Nath Rodrigues, Renata Jambeiro e Zumbiido-Afropercussivo. Além disso atua também em projetos interlinguagens envolvendo dança, cinema, vídeo-arte e circo. Atualmente, dedica-se à série audiovisual documental que idealizou e dirigiu – “Cor do Som – Memórias da Música Negra” (2019) – e ao desenvolvimento do seu próximo trabalho autoral. @mauriciopazzmusic
Colaboraram Yasmim Bianco, Rafael Sales e Rodrigo Barros.
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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