Peça brasileira Isto É Um Negro? ganha prêmio no Fringe do Festival de Edimburgo após comover Summerhall
Público escocês ficou impactado com obra sobre o racismo
Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
ENVIADO ESPECIAL A EDIMBURGO*
Apresentada no Summerhall, um dos mais importantes templos do teatro de Edimburgo, na Escócia, Reino Unido, a peça brasileira Isto É Um Negro? Impactou o Fringe do 75º Festival de Edimburgo, o maior evento de artes cênicas do mundo, realizado entre 5 e 28 de agosto.
A obra dirigida por Tarina Quelho, com codireção de Lucas Brandão, produção de Dani Façanha, dramaturgia de Mirella Façanha e Tarina Quelho e os atores Mirella Façanha, Ivy Souza, Raoni Garcia e Felipe Roseno, que substituiu Lucas Wickhaus, foi o único espetáculo brasileiro a participar presencialmente do evento. A peça The Art of Facing Fear, da companhia paulistana Os Satyros, participou de modo digital.
A ação de 16 sessões de Isto É Um Negro? no Fringe teve curadoria da MITsp – Mostra Internacional de Teatro de São Paulo em realização do Governo de São Paulo, por meio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa e Secretaria de Relações Internacionais do Estado com correalização da OEI – Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura e da InvestSP, por meio do programa Creative SP, que busca internacionalizar a produção cultural paulista bem como atrair investidores estrangeiros para o setor da economia criativa paulista.
Secretário de Cultura e Economia Criativa de São Paulo, Sérgio Sá Leitão assistiu ao espetáculo Isto É Um Negro em Edimburgo. “É um espetáculo que representa muito bem a potência e a diversidade da cena teatral contemporânea de São Paulo. É uma peça que traz uma temática muito atual, muito contemporânea. Que é inclusive universal. Que não é só brasileira, que é questão da identidade do negro na sociedade contemporânea. E é um espetáculo também muito bem construído do ponto de vista da dramaturgia e muito bem realizado do ponto de vista da interpretação e da execução. Então, seja pela temática, seja pela qualidade da concepção, seja pela qualidade da realização, Isto É Um Negro, como disse, nos representa muito bem e tem um potencial de causar impacto na história do Fringe de Edimburgo”.
A peça brasileira Isto É Um Negro é de uma importância enorme.
Robert McDowell, diretor do Summerhall de Edimburgo
O prêmio de Destaque na Programação do Summerhall no Fringe foi entregue a Isto É Um Negro? pelo fundador e diretor do espaço, Robert McDowell, que ficou encantado com o espetáculo brasileiro. “Esta peça é de uma importância enorme”, definiu o executivo teatral escocês. A peça ainda ficou entre os 50 destaques do Fringe listados pelo jornal britânico The Guardian.
Público emocionado
O Blog do Arcanjo acompanhou a penúltima sessão da peça, na noite de sábado, 28 de agosto. O diverso público do Fringe acompanhou, impressionado, a montagem que fala das mazelas do racismo estrutural brasileiro, com o elenco completamente nu dizendo um sofisticado texto.
Ao fim, o público aplaudiu de forma efusiva, com muitas pessoas profundamente emocionadas e impactadas com a montagem. O Blog do Arcanjo conversou com algumas delas assim que deixaram a sala Mail Hall.
“Foi um espetáculo muito intenso a todo momento, me senti surpreendido e sempre a cada momento minhas expectativas eram quebradas. O que achei interessante é que a dramaturgia e coreografia envolvem histórias pessoais deles junto com as histórias do Brasil”, opinou o estudante alemão Constantin Rintelmann, de 21 anos.
Já o estudante filipino Joshua Belleza Banket contou à reportagem que Isto É Um Negro? foi primeira peça de teatro do Brasil à qual assistiu: “Essa é a primeira peça brasileira que eu vejo. Fiquei muito emocionado, achei muito poderosa, principalmente com as minhas experiências com o racismo”, pontuou o universitário.
A estudante polonesa Magda Podelska, de 26 anos, também saiu impactada do espetáculo paulista em Edimburgo. “Achei a peça muito poderosa, não é uma peça de confronto, mas um convide para uma conversa. Fez eu refletir sobre as questões de racismo e encarceramento. Eu não achei pesada, achei muito interessante a questão das grades, pois não falamos sobre isso aqui na Escócia, não sei muito bem como é a questão do encarceramento no Brasil, mas aqui na Escócia não falamos muito sobre, precisamos de diferentes vozes para falar sobre o racismo na Europa. As performance dos atores são muito bonitas e tocantes”, declarou a jovem ao Blog do Arcanjo no saguão do Summerhall.
Desafio e vitória
Na saída, os atores de Isto É Um Negro? estavam profundamente tocados e receberam o carinho do público.
“As pessoas ficam extasiadas e querem agradecer. O feedback que recebemos foi muito positivo”, contou o ator Filipe Roseno. “Nossa presença em Edimburgo revela um certo embate, ao revelar as situações de estruturas e construções raciais. Estou feliz em poder fazer teatro, com esta temática, para essas pessoas”, acrescentou, antes de revelar que esta foi sua primeira viagem à Europa. “Estou substituindo o meu querido amigo Lucas Wickhaus, que me convocou para esta missão, pois ele está fazendo o musical Alcione no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo, e não conseguiu viajar”, explicou.
Para Dani Façanha, produtora da peça Isto É Um Negro?, a aventura na Europa começou na Alemanha, onde o espetáculo fez apresentações antes de aportar no Fringe de Edimburgo. “É um festival que tem uma dinâmica de networking. Fomos muito bem recebidos e ganhamos um prêmio das mãos do diretor do Summerhall”, revelou.
Para a atriz Mirella Façanha, também do elenco de Isto É Um Negro?, a temporada em Edimburgo foi “uma verdadeira ginástica, sobretudo pelo pouco tempo de montagem e desmontagem, apenas 15 minutos”. Ela conta que a obra precisou ser adaptada para se encaixar na dinâmica do maior evento das artes cênicas do mundo. “Nossa peça originalmente tinha 1 hora e 40 minutos, e editamos para 1 hora. Então, foi um desafio para todos nós estar nesta engrenagem tão rápida”, explicou. “Cumprir essa temporada é um lugar de vitória para todos nós. Houve troca e conseguimos fazer o diálogo. E é isso que importa”, celebrou.
Colaboraram Danielle Nigromonte, Luiza Amaral e David Godoi.
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*O jornalista e crítico Miguel Arcanjo Prado viaja ao Festival Fringe no 75º Festival Internacional de Edimburgo, na Escócia, Reino Unido, a convite de Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, a Ciência e a Cultura no Brasil (OEI) e Invest SP.
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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