★★★★ Crítica: Vienen por Mí com Fabia Mirassos arrebata Festival de Curitiba ao mostrar pessoas trans com sensibilidade

A atriz trans Fabia Mirassos faz história no 31º Festival de Curitiba com Vienen por Mí, peça que humaniza sua comunidade com delicadeza cênica e que merece rodar o Brasil e festivais internacionais © Blog do Arcanjo 2023 – Susan Sena – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo

ENVIADO ESPECIAL AO FESTIVAL DE CURITIBA*

Com Carolina Fayad

★★★★
Vienen por Mí
Avaliação: Muito Bom

As pessoas trans, infelizmente, ainda sofrem e muito neste país chamado Brasil, que insiste em roubar suas vozes. Para além das estatísticas terríveis do país que mais matas trans e travestis no mundo, a vida cotidiana desta população ainda é marcada por olhares de puro preconceito e falta de oportunidades profissionais, incluindo aí o mundo das artes cênicas, que engloba o teatro e o mercado audiovisual.

Interpretada pela atriz trans Fabia Mirassos enquanto cozinha calmamente aos olhos do público em uma proposta intimista, a peça solo Vienen por Mí é um dos destaques do 31º Festival de Curitiba, onde foi apresentada (e ovacionada) em duas sessões no dia 31 de março, na Mostra de Solos na Casa Hoffmann.

O espetáculo propõe um enfentamento direto, mas repleto de delicadeza, ao Brasil transfóbico, humanizando a figura das pessoas trans, com seus sonhos e singularidades.

Com sensibilidade, Fabia Mirassos une culinária e teatro para criar uma narrativa trans em Vienen por Mí, sucesso no Festival de Curitiba © Blog do Arcanjo 2023 – Susan Sena – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

Com a tentativa de conversar com as pessoas cisgêneras de forma sincera e profunda, para que algo realmente mude de fato, a peça foi escrita e interpretada por travestis, com texto da chilena Claudia Rodríguez e atuação de Fabia Mirassos, em uma interessante ponte latino-americana que já se evidencia no título em castelhano da montagem.

A obra dirigida por Janaina Leite, figura que tornou-se referência no campo da autoficção, a peça é uma mistura de diversos gêneros textuais e teatrais. O foco é retratar de forma profunda a dor e sofrimento das pessoas travestis e trans, tão preteridas no Brasil, representando as dificuldades do cotidiano árduo desta parcela da sociedade.

Assim, Vienen por Mí funciona como um sofisticado grito de resistência contra a transfobia e a falta de representatividade e de visibilidade das pessoas trans na sociedade. Incluindo aí os palcos.

Fabia Mirassos celebra chegada ao Festival de Curitiba com Vienen por Mí, com trans no topo do teatro nacional e latino-americano © Blog do Arcanjo 2023 – Annelize Tozetto – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

Chegar ao topo do teatro brasileiro deixa Fabia Mirassos fortemente sensibilizada. A atriz estreou a obra em Curitiba bastante emocionada pela consciência de sua histórica presença no evento e revelou ao público que desde a adolescência sonhava em fazer parte do icônico festival, o que levou quase três décadas para se concretizar.

Em conversa com o Blog do Arcanjo, ela defendeu que é preciso construir este lugar para as pessoas trans na área artística, mas que prefere o amor em vez de enfrentamentos ou ódio nesta construção. Evocando as trans que construíram caminhos e oportunidades em tempos ainda mais árduos, ela diz que prefere construir suas relações em forma de parcerias que possam realmente mudar as coisas. E que é menos do textão e mais da ação no dia a dia. Lembrando Belchior, Fabia Mirassos é do time do “amar e mudar as coisas me interessam muito mais”.

Vienen por Mí é um espetáculo que merece uma longa trajetória nos palcos brasileiros e também fazer percurso em festivais internacionais. Precisa viajar e atingir cada vez mais pessoas com sua sofisticada proposta. E que a delicada e ao mesmo tempo forte presença de Fabia Mirassos possa, aos poucos, abrir cabeças em prol de um mundo mais igualitário, no qual identidade de gênero ou orientação sexual não possa mais impedir alguém de exercer plenamente seus direitos. Afinal, a democracia só existe se todos, todas e todes forem iguais. Senão, é pura falácia.

Fabia Mirassos é ovacionada com solo Vienen por Mí no 31º Festival de Curitiba: atriz trans faz história no evento © Blog do Arcanjo 2023 – Susan Sena – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

*O jornalista e crítico Miguel Arcanjo Prado viajou a convite do Festival de Curitiba.

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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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