★★★ Crítica: Entre Gigantes e Pigmeus nos ensina que a genialidade mora no amor e na vida simples
Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
Entre Gigantes e Pigmeus
★★★
Avaliação: Bom
O teatro constantemente revisita a temática do artista diante da obsessão em se tornar acima de média e se destacar com sua obra. Este é o cerne do espetáculo Entre Gigantes e Pigmeus – Um Ato de Composição, do Oroboro Teatro, escrito por Danilo Cianciarulo e Rogério Guarapiran, que faz últimas sessões aos domingos, 16h, no Teatro J. Safra, em São Paulo (compre seu ingresso).
A peça apresenta um músico, o violinista interpretado por um intenso Gabriel Dellilo, que trava uma relação afetiva com a dona da pensão na qual se hospeda, papel de uma graciosa Fernanda Cunácia, enquanto busca incessantemente criar uma obra que lhe catapulte ao olimpo além da mediocridade cotidiana. Ambos artistas estão em registro de intensa entrega e dosagem.
A montagem faz uma homenagem ao próprio teatro e ao fazer artístico, demonstrando essa busca incessante por auto superação e também pela validação do outro, no caso, do público e da crítica.
Ao utilizar a metáfora dos pigmeus, que seriam os seres humanos sem grandes pretensões para além do cotidiano, e os gigantes, aqueles que se destacam com obras realmente relevantes, a peça expõe a angústia que muitas vezes acompanha o tão difícil fazer artístico, do qual os profissionais do teatro ou da música não escapam.
Afinal, a obrigação de ser genial pode ser muitas vezes um carma complicado de se carregar, transformando-se em um verdadeiro tormento. Mas, trazendo a questão para vida do homem comum, quem aí nunca sentiu-se exaurido por tantas cobranças, independentemente do tipo de trabalho.
Parace que somos obrigados a alcançar sempre aquilo que é praticamente inalcancável. E enquanto focamos nas metas mais difíceis, a vida passa sem que a desfrutemos devidamente.
O texto dialoga com o mundo contemporâneo, no qual todos querem estar na janela e poucos no corredor, quando, de fato, a vida e a arte são feitas de uma dose maior de suor do que de glórias.
A direção de Danilo Cianciarulo aposta num clima soturno para o desenvolvimento desta história, ampliando a sensação de angústia na qual o protagonista vive, exacerbada pela trilha de Fabio Cardia e pela iluminação de luzes baixas pelo diretor.
Destaque para o bem acabado figurino de época de Ray Lopes e Silvana de Carvalho e a cenografia minimalista proposta pelo diretor.
Se há uma certa sisudez na montagem, os movimentos intensos da corporeidade proposta por Bárbara Cortez para os dois intérpretes — sobretudo pra os passos da dança da atriz — cria um contraponto, bem como o registro das intensas atuações.
Este crítico deixa a provocação de que modulações mais sóbrias e contidas, não só na voz como também no corpo, poderiam tornar ainda mais interessante os embates entre o aspirante a gigante e a pigmeu bem resolvida da dramaturgia.
Com o mundo cada vez mais dinâmico e veloz, este escriba também pontua que talvez fosse interessante à montagem reavaliar a reiteração de momentos silenciosos, o que poderia deixar a peça com mais ritmo e dinamismo, sobretudo com diálogos mais diretos e sem longas pausas entre as falas.
Entre Gigantes e Pigmeus acerta ao nos mostrar que o caminho da simplicidade e da verdade da vida e do amor muitas vezes é a trajetória mais direta rumo a genialidade, que é quando, de fato, deixamos de lado as tolas pretensões ególatras e entendemos a real beleza e força da vida simples. Não é mesmo?
Entre Gigantes e Pigmeus
★★★
Avaliação: Bom
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Últimas sessões aos domingos, 16h, até 11/6/2023 no Teatro J. Safra, na Barra Funda, São Paulo. Compre seu ingresso!
Siga @miguel.arcanjo
Ouça Arcanjo Pod
Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
© Blog do Arcanjo – Cultura e Entretenimento por Miguel Arcanjo Prado | Todos os direitos reservados.