Karingana chega ao Sesc Bom Retiro com ilutrações negras em livros para as infâncias com perspectiva antirracista | Entrevista do Arcanjo

Abertura da exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias lotou o Sesc Bom Retiro em São Paulo © Rafa Marques Blog do Arcanjo 2023

Curadora Ananda Luz fala sobre mostra que pode ser vista com entrada gratuita até 28 de janeiro de 2024 em São Paulo

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo

Foi um sucesso, com forte presença da comunidade negra, a abertura da exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias no Sesc Bom Retiro, em São Paulo, no último sábado, 15. A mostra pode ser vista de graça até 28 de janeiro de 2024, com um recorte da produção de ilustradores negros e negras dedicados à ilustração de livros infanto-juvenis. São 92 trabalhos de 47 autores que valorizam as culturas afro-brasileiras e a diversidade na infância. O público mergulha em reflexões sobre negritude, ancestralidade, pertencimento e antirracismo. O Blog do Arcanjo conversou com exclusividade com Ananda Luz, cocuradora à frente da exposição junto do Sesc São Paulo e que integra o Omodé: Festival Sesc de Arte e Cultura Negra para a Molecada. Não custa lembrar que a mostra pode ser vista de graça de terça a sexta, 9h às 20h, sábado, 10h às 20h, e domingos, 10h às 18h. O endereço do Sesc Bom Retiro é Alamda Nothmann 185, Campos Elíseos, São Paulo. Leia a Entrevista do Arcanjo a seguir.

Ananda Luz está na curadoria da exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias no Sesc Bom Retiro © Rafa Marques Blog do Arcanjo 2023

Miguel Arcanjo Prado – Qual a importância de uma exposição como a Karingana?
Ananda Luz – A exposição reúne 47 ilustradores negros e ilustradoras negras de todo o Brasil com 92 obras que apresentam diversas de técnicas artísticas. Apresentar diferentes técnicas e mostram o quão plural é a arte negra na ilustração brasileira nos livros para as infâncias.
É importante dizer que a entrada de ilustradores de autoria negras nos livros para as infâncias muda uma perspectiva sobre as personagens negras, bem como às histórias e culturas afro-brasileira e africana que por muito tempo foram invisibilizadas ou estereotipadas nos livros. As personagens apresentadas na exposição são belas porque os e as artistas que as fazem reconhece a beleza em si mesmo sendo espelho para muitas infâncias que visitam/visitarão a exposição. E o espelho é elemento constante, porque é um convite para ver a sua história, a si mesma e suas potências. A exposição é um convite para que possamos vivenciar a existência. Tanto as crianças quanto os adultos e as adultas que encontram com as suas infâncias porque a exposição apresenta o quão plural são as infâncias.

Detalhe da exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias no Sesc Bom Retiro © Rafa Marques Blog do Arcanjo 2023

Miguel Arcanjo Prado – Muito se fala hoje em dia em representatividade. De que forma essa palavra dá força a esta exposição?
Ananda Luz – A todo momento, quando a criança vê a instalação com o rosto dos ilustradores e das ilustradoras e ela percebe que os artistas presentes na exposição são negros e negras. Quando ela observa que há possibilidade de uma criança negra ser astronauta, bailarina ou uma importante escritora como a Maria Firmina dos Reis. Quando ela vê crianças negras em espaço de afeto, sendo cuidada pela avó que trança seu cabelo com carinho, ou o pai que dá boa noite ao filho na hora de dormir. Quando a criança vê que ela pode brincar, fazer pipa ou ler um livro e compartilhar com os adultos ao redor uma relação de amorosidade. A exposição de muitas formas fala para crianças negras que ela pode ser o que quiser, que ela tem direito de ser cuidada e que são belas suas formas de ser. Também diz para as crianças não negras que corpos diversos existem com boniteza e apresenta para adultos e adultas que hoje, de muitas formas, está se reescrevendo essas histórias a partir das ilustrações dos livros para as infâncias.

Abertura da exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias no Sesc Bom Retiro © Rafa Marques Blog do Arcanjo 2023

Miguel Arcanjo Prado – Qual foi o maior desafio no processo de feitura desta mostra?
Ananda Luz – Talvez a selecionar em um panorama grande de ilustradores o que participaram, que como já disse de alguma forma tivemos alguns critérios, entre eles apresentar ilustradores de todo o país, as muitas técnicas (digital, carimbo, acrílica, aquarela, entre outra), bem como trazer diferentes gerações de ilustradores. Temos na exposição, por exemplo, Maurício Veneza que ilustra desde 1986 ou Rubem Filho que ilustra de da década de 90. Também trouxemos os recém-lançados como o “Fevereiro” de Carol Fernandes pela editora Caixote, 2023. Outro aspecto é de que um livro é um território de muitos encontros, portanto quando trazemos o ilustrador Rodrigo Andrade, por exemplo, trazemos com ele outras pessoas, como a Waldete Tristão, a Kiusam de Oliveria e a editora negra Aziza. Um livro como um aquilombamento.
A exposição também teve uma narrativa, pois as imagens foram escolhidas dos livros e dialogaram com os Valores Civilizatórios Afro-brasileiros proposto pela pesquisadora Azoilda Trindade. Talvez esse tenha sido outro desafio, mostrar na exposição que a todo momento era sobre livros, eram artes que habitavam livros. Para que isso ficasse evidente, as capas dos livros estão presentes em todas as legendas, na brincadeira do “carômetro” e na instalação na Biblioteca que é extensão da exposição e tem no seu acervo todos os livros que estão expostos.

Exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias no Sesc Bom Retiro © Rafa Marques Blog do Arcanjo 2023

Miguel Arcanjo Prado – A infância é um lugar de construção da subjetividade do adulto que virá. Diante disso, como você vê a necessidade de uma literatura infantojuvenil que aborde questões da população negra?
Ananda Luz – Heloisa Pires Lima, que coordena o catálogo e é uma grande pesquisadora e autora de livros para as infâncias, diz que “se nos livros cabem mundos, tá faltando mundo em muitos lugares”. A necessidade de acessar literatura que abordem diferentes perspectiva é acessar muitos mundos, muitas narrativas, muitas histórias. Alargar visão de mundo e, principalmente, em um país racista como nosso acessar subjetividades – de adultos e crianças – para que possa encontrar na ficção com outras culturas e modos de viver, de ser e estar nesse mundo e, para quem foi negado estar nas histórias, encontrar consigo mesma. Ampliando possibilidades de existências. Em uma literatura de autoria negra é possível romper com o racismo e trazer a vida vivida, não a invisibilidade que é morte em vida como diz a Azoilda Trindade.

Exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias no Sesc Bom Retiro © Rafa Marques Blog do Arcanjo 2023

Miguel Arcanjo Prado – O que você quer que o público que visite a exposição sinta?
Ananda Luz – Alegria, que saia da exposição com a alegria de encontrar com tanta gente, com tantas obras e de tantos artistas. Que mergulhe na ludicidade das obras e que, principalmente, sinta o desejo de ler as histórias que aquelas imagens narram. Desejamos também que educadores e criadores de livros saiam da exposição ampliando percepções dos seus fazeres e, por que não, se questionando se há esses livros e esses/as ilustradores/as ao seu redor. Enfim, o desejo é que de muitas formas a exposição apresente o quanto os livros para as infâncias contribuem no debate de uma sociedade antirracista, quanto eles trazem em si muitas vozes, nesse caso vozes expressa nos traços de ilustradores e ilustradoras negros e negras.

Exposição Karingana – Presenças Negras no Livro para as Infâncias: Blog do Arcanjo mostra quem esteve na abertura no Sesc Bom Retiro

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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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