Marilia Marton fala sobre CultSP Pro e diz que Oswald de Andrade não fecha: ‘A cultura é de todo mundo’ – Entrevista do Arcanjo

Marilia Marton fala da reformulação das Oficinas Culturais para criação do CultSP Pro em entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado em seu gabinete em São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
Foto BOB SOUSA
@bobsousa

Nos últimos dias, houve ebulição no setor teatral e cultural paulistano. Tudo por conta da criação do CultSP Pro, novo programa da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, sob comando da secretária Marilia Marton. O novo projeto reformula o programa Oficinas Culturais, gerido pela OS Poiesis e até então com sede no prédio Oswald de Andrade, no bairro do Bom Retiro, que passa a sediar o CultSP Pro. Em entrevista exclusiva ao jornalista Miguel Arcanjo Prado para o Blog do Arcanjo, em seu gabinete, no bairro da Luz, no centro da capital paulista, na tarde da última sexta, 22 de março, Marilia Marton deu detalhes sobre a mudança. Ela garantiu que o prédio Oswald de Andrade não será fechado e que seu teatro seguirá funcionando. E explicou que o CultSP Pro terá cursos especializados com foco em qualificação para distintas carreiras artísticas, em 12 categorias, com 100 turmas iniciais em 20 diferentes cursos e expectativa de 250 turmas em mais de 50 cursos já em 2025. A secretária disse ainda que fará parceria com os municípios, para que profissionais da cultura no interior paulista sejam atendidos. Leia a entrevista exclusiva a seguir. Procurada pelo Blog do Arcanjo, a Poiesis preferiu não se manifestar.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – Marilia, por que as Oficinas Culturais vão ser reformuladas para dar espaço ao CultSP Pro?
Marília Marton –
Porque era um projeto de mais de 40 anos, e a gente entende que a gente chegou no século 21 e há uma demanda dos próprios fazedores de cultura por essa atualização. A gente tinha nas Oficinas cursos muito rápidos, com percursos formativos que já não atendem mais à demanda do setor. E olha, ouvimos muita gente do setor por muito tempo. Desde o dia em que eu cheguei aqui, a gente fez reunião com o interior, com a capital, viajamos, conversamos com todos os setores. Fizemos reuniões para os editais da Lei Paulo Gustavo… A gente foi ouvindo. E uma coisa que passava por todos era o problema da formação. E quando a gente fala de percurso formativo, a gente está falando de formar para a arte, para a gestão da arte e para o plano da carreira da arte. Eu sou um incrível artista, mas o que eu faço com isso? Então, a gente hoje olha para esse conjunto de coisas e pensa de uma forma orgânica, holística. Então, acho que é isso que a gente espera desse novo programa o CultSP Pro, dessa reformulação: que a gente possa olhar para a cadeia produtiva da indústria criativa e realmente entender que é necessário ter vários olhares para lá.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – Como vai funcionar o CultSP Pro, esse novo programa da Secretaria da Cultura, Indústria e Economia Criativas que substitui as Oficinas Culturais?
Marilia Marton –
A gente deve soltar o edital agora nas próximas semanas. Já está na costura jurídica para este novo contrato. A gente conseguindo, sai em abril. E mais ou menos em junho o contrato deve ser assinado. E a ideia é que a organização social que ganhe já abra as inscrições em julho. E aí, a partir disso, eles podem fazer as inscrições e começarem os cursos já em agosto. A gente deu 12 vertentes para quem concorrer apresentar suas propostas nas 12 linguagens. E aí a gente pode ter isso a partir de agosto, com 100 turmas em 20 diferentes cursos. A expectativa é atuar no segundo semestre com duas mil pessoas, mais ou menos, de forma descentralizada já. O que que a gente imagina, Miguel, é que a gente vai fazer, por exemplo, audiovisual. Então, quais são as diferentes carreiras no audiovisual? Para além da artística, onde essas pessoas podem se profissionalizar tecnicamente? Porque a gente aprende na cultura fazendo. Acho que isso é uma coisa que não adianta querer ter só faculdade, porque você faz faculdade e depois você vai aprender na vida. O que a gente quer é facilitar essa jornada, a partir de professores que tenham alta capacidade e experiência prática. Que esses trabalhadores da cultura que fizerem os cursos consigam fazer essa jornada mais fácil. Então, quando a gente pensar em audiovisual, estamos falando do câmera, do fotógrafo, do visagista, do figurinista, do continuísta, de todo mundo. Porque, caso contrário, é só para o ator. E estamos falando de toda a cadeia produtiva da indústria e economia criativas. A falta de técnicos é o que vem dificultando a gente levar as produções para o interior, porque no final das contas, quando vai uma peça de teatro, tem que ir a caravana inteira. E isso tem deixado o teatro muito caro. Para quem é produtor, uma coisa é levar os atores. Mas, por exemplo, uma camareira, um técnico de luz e de som, um técnico de palco, pode ser alguém da cidade. Quem conhece os bastidores do teatro sabe que cada detalhe, cada segundo, faz a diferença, e é preciso ter pessoas especializadas. Na moda também. Num desfile de moda, a modelo sai da passarela e logo volta com outra roupa: quantos segundos tem ali para fazer essa troca? Ela não faz sozinha. Tem uma pessoa ali que é especialista nisso, ajudando ela a se vestir. Que faculdade ensina isso? O CultSP Pro é sobre isso.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – O prédio da Oswald de Andrade, que entrou em tema na classe artística nos últimos dias, até porque toda a classe teatral só falou sobre isso, no Bom Retiro, é da secretaria? O que vai acontecer com ele a partir dessa reformulação? E não só com ele, como também com os outros prédios que abrigavam as outras Oficinas Culturais?
Marilia Marton – 
O prédio Oswald de Andrade é um prédio próprio da Secretaria, administrado pela Secretaria há muitos anos. Então, ele vai continuar sendo o prédio central deste novo programa CultSP Pro. E  claro, ele já é ocupado, em parte, pela São Paulo Companhia de Dança, então ele continua sendo ocupado pela São Paulo Companhia de Dança, e ele vai receber também esse novo programa. Há dentro do prédio alguns programas de difusão, por conta até do teatro que está lá e do espaço expositivo. Isso tudo, Miguel, continua normal. Fora a Oswald, a gente tem outros dois prédios, um que fica em Taipas, e é um prédio próprio do Estado, e nesse vai ser feita uma extensão da Fábrica de Cultura da Brasilândia, que é a mais próxima, inclusive, administrada pela própria Poiesis, que é a organização social que cuidou das Oficinas Culturais. Então, eles vão abraçar esse prédio e lá continuará tendo, ininterruptamente, as atividades. O prédio que fica em Itaquera, que é o Volpi, é alugado. Esse a gente vai direcionar as pessoas para outros programas na região, que inclusive têm ali próximo, Casas de Cultura do município, e as pessoas vão se adaptar a esse outro espaço.

Fachada do prédio Oswald de Andrade, que passará a sediar o programa CultSP Pro no bairro do Bom Retiro, em São Paulo © Divulgação Arquivo Blog do Arcanjo

Miguel Arcanjo Prado –  A Oswald de Andrade é um espaço muito tradicional e que faz parte da formação cultural em São Paulo. Tanto que houve manifestações nas redes de artistas que contam que passaram por lá, fizeram oficina, ensaiaram peças. Esse espaço ainda vai ter ligação à linguagem teatral e terá espetáculos de teatro independente em cartaz?
Marilia Marton – Vamos combinar, Miguel, que a gente está sem teatro, né? Se a gente abrir 50 teatros aqui em São Paulo, acho que a gente tem demanda. Então, não existe a possibilidade de a Secretaria não utilizar o teatro da Oswald de Andrade para a difusão. Não existe isso. Eu acho que o que as pessoas vão entender é que ali vai virar o polo das diversas linguagens. Claro que vai ter teatro, a gente sabe que ali tem uma vocação para o teatro maior. Mas quando a gente fala de teatro, a gente também fala de cinema, a gente também fala sobre todas as linguagens. Porque as linguagens são transversais. A gente não separa uma da outra. Então, eu acho que quando a gente olha pra Oswald de Andrade como estava, e às vezes fica com dó, porque domingo, por exemplo, não abre. E a gente poderia ter mostras ali de domingo, feiras criativas, e a gente não tem isso ali atualmente. Então, eu acho que a ocupação também está num momento de ser repensada. E claro, o prédio da Oswald de Andrade é um espaço dos artistas.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

O prédio da Oswald de Andrade é um espaço dos artistas. Ele continua sendo utilizado, claro, como impulsionador de toda a nossa arte.

Marilia Marton
Secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo

Miguel Arcanjo Prado – Então a Oswald de Andrade, enquanto instituição cultural, enquanto prédio da cultura no Bom Retiro, não vai fechar?
Marília Marton –
Não, ele continua sendo utilizado, claro, como impulsionador de toda a nossa arte.

Miguel Arcanjo Prado – E como ficam as oficinas no interior do estado?
Marilia Marton –
No interior, até por conta da pandemia, as oficinas acabaram não voltando, e vinham sendo feitas de forma EAD (ensino a distância). Isso pra gente é muito ruim, e eu acho que é ruim pra própria arte. A gente tem essa coisa de contato, de vivência, isso é importante. Os programas de qualificação, que são esses programas que têm essa tutoria da jornada, esses continuam. Que era o antigo Ademar Guerra, que acho que era um programa que todo mundo conhecia bem e quem seria eu, que sou uma apaixonada por Ismael Ivo, se terminasse com qualificação em dança, por exemplo, que ele comandou. Então, assim, esses programas de qualificação não só permanecem, como a gente está conversando para que eles, inclusive, cresçam, ensinando, inclusive, como participar de editais.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – É preciso pensar o lado da gestão artística também?
Marilia Marton –
Exatamente isso. Não dá só para fazer o percurso formativo artístico.  E depois? Participar de um edital, concorrer a prêmio, conhecer tudo o que é possível, festivais internacionais… a gente tem tanta coisa para mostrar. A gente precisa que os artistas comecem a se mexer, a gente é dinâmico. E acho que é isso que o novo projeto propõe. Esses cursos livres, esses percursos mais bem elaborados, estão para olhar de forma holística e se adaptar ao mundo de hoje. E por isso que também não se pode dizer que é profissionalizante ou técnico, porque aí teria que ter o Ministério da Educação no meio. O CultSP Pro é um projeto que se adapta à realidade e à demanda necessária daqueles artistas de cada região do Estado de São Paulo.

Miguel Arcanjo Prado – Esses cursos vão acontecer na Oswald de Andrade e também no interior? Em quais lugares?
Marília Marton  –
Na verdade esse prédio central, o prédio Oswald de Andrade, é como se de lá partisse tudo, mas a ideia é: assinar parcerias com os municípios para realizar os cursos nas próprias cidades. Então, os municípios darão as estruturas. Mas não vamos concorrer com eles. Muitos municípios já fazem cursos iniciantes. Fui pra Jundiaí agora, lá tem o Galpão Criativo. Ali dentro você tem um monte de curso de iniciação. Eu estou indo meio para a “pós-graduação”, vamos chamar assim. A cada município vai cedendo uma sala e fazemos um curso mais especializado lá. A gente vai usando as estruturas locais, e isso agrega valor ao equipamento do município. No final das contas, a cultura não tem limite, não é minha, não é do município, não é do Governo Federal, é de todo mundo. Porque, na verdade, ela é apropriação do próprio setor, então é uma dinâmica muito simples. E veja, Miguel, de novo, a gente vem conversando com os municípios há muito tempo e a gente sente que tem uma demanda enorme por formação especializada. Vou te dar um exemplo: Música, a gente tem criado e feito mais programas para iniciação. Mas eu também tenho de preparar um músico pra ele aprender a dar aula para criança. E quem está dando isso? O Conservatório de Tatuí tem demanda represada. A gente está pedindo pra abrir mais vagas, mas eu vou continuar não atendendo todo mundo, porque eles têm uma fila de mais ou menos 250 músicos esperando, e eles atendem aulas de 20 em 20. Quanto tempo vão esperar? Porque isso vai girando e a gente aumentando a demanda. Então, como que eu faço? O CultSP Pro possibilita ao músico ampliar o seu conhecimento e sua renda, e atender melhor as crianças lá na ponta.

A cultura não tem limite, não é minha, não é do município, não é do Governo Federal, é de todo mundo.

Marilia Marton
Secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo

Miguel Arcanjo Prado – Uma questão muito pontuada nas redes foi sobre os trabalhadores atuais da Poiesis, que é a OS que conduz atualmente as Oficinas Culturais. O que aconteceria com eles? Eles poderiam ser realocados nessa reformulação?
Marilia Marton –
É preciso pontuar que eles não são servidores públicos, eles são colaboradores da organização. A organização social ali [Poiesis] tem outros dois contratos com a Secretaria. Então, como ela vai alocar esses funcionários, seria uma pergunta a ser feita à própria Poiesis. É claro gente que se a gente está falando de um novo contrato, que tem a intenção de ter professores, e a gente sabe que professor da área de arte no geral são os próprios fazedores de cultura, então há possibilidade real de que alguns desses professores sejam alocados em algum projeto ou outro novo. Também vai pesar a disponibilidade de poder viajar para o interior, porque acho que a grande mudança também é essa. A gente precisa ir para o interior, a gente precisa fazer essa formação. Se a gente quer ter cuidado nos equilíbrios das divisões dos recursos da Secretaria, que é de todo o Estado de São Paulo e não só da Capital, é necessário que o interior também tenha acesso a essa formação, não fique centralizada na Capital. Precisamos de pessoas dispostas a isso. Esse não é um problema para os artistas, que na verdade eu acho que todo artista gosta de viajar, seria ótimo que esses profissionais fossem abarcados pela nova instituição, que a gente não sabe ainda quem vai ser, por que vai ter novo chamamento, que inclusive a própria Poiesis pode ganhar.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – Marília, como que esse novo programa, o Cult SP Pro, chega dentro da área de formação que já existe na Secretaria? Vai haver diálogo entre o programa e as formações já existentes?
Marilia Marton –
Claro, tanto a SP Escola de Teatro quanto a SP Escola de Dança foram chamadas para a gente conversar bastante. Inclusive porque a gente não quer ter conflito, nem é uma sobreposição, mas obviamente a gente tem coisas ali, experiências vivenciadas, que a gente pode aprender. Chamamos o Ivam [Cabral, diretor da SP Escola de Teatro] e a Inês [Bogéa, diretora da SP Escola de Dança], para saber mais o que estão fazendo e como a gente pode fazer mais juntos. Chamamos o Conservatório de Tatuí e o Projeto Guri, para falar sobre música, até porque o Guri tem ampliado demais as suas parcerias nos municípios para levar o Guri nas escolas. O próprio Guri está começando a ter problema de contratar professores, porque estes precisam estar preparados para ir para sala de aula. Só em 2023, abrimos 30 polos de Guri nas escolas. Então, a gente foi chamando todos esses para dentro da conversa. Claro, as Fábricas de Cultura também, toda a experiência que essas Fábricas têm. Então, as pessoas que falam que a Secretaria está abandonando a iniciação artística estão equivocadas. A gente não está. A gente tem Fábricas de Culturas aqui na capital, são nove prédios dentro da cidade de São Paulo, e eu acho que, por uma questão de logística, foi-se negligenciando o interior. Essa é uma grande preocupação que a gente tem. Por isso que eu estou lhe dizendo, Miguel: aquilo que é feito na capital, voltado para a cultura, está tudo mantido. Agora, a gente tinha que olhar para o interior, em como que a gente atende essa demanda do próprio interior.

Miguel Arcanjo Prado – Numa entrevista passada conversamos sobre como o mercado da cultura muitas vezes se ressente do próprio mercado. De entender que é gerador de renda e emprego, que precisa se colocar como mercado, se precificar, se atualizar, como todas as profissões se atualizam com o passar do tempo, porque as coisas vão mudando. Como enxerga o CultSP Pro diante dessa perspectiva?
Marilia Marton –
A ideia é não ser engessado de jeito nenhum. A ideia é ele poder ir se adaptando justamente para que a gente atenda à demanda do mercado. Você tem razão. A gente ainda acha romântico que um músico trabalhe no bar à noite por um prato de comida. Prato e uma cerveja. Não dá mais, entendeu? A gente da cultura oferece o que a gente tem mais de intrínseco, porque a gente não faz manufatura, a gente dá o produto bruto, que somos nós mesmos. A própria alma. Então, assim, claro que o romantismo é o que faz a criação, e, pelo amor de Deus, a gente não pode perder isso de jeito nenhum. Mas, ninguém vive só disso. A gente não enche a barriga com isso. Então, poder pensar a sua carreira, poder saber montar o seu portfólio, saber vender, saber entrar nos aplicativos, procurar os melhores lugares e oportunidades, fazer seu marketing, isso tudo é fundamental. Não poderia deixar os profissionais da cultura sem terem esse acesso, e esse programa CultSP Pro vem exatamente para isso.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – Com foco na atualização profissional?
Marilia Marton –
Ele é um programa para desenvolver as suas habilidades, mas ele é também para dar as técnicas que são necessárias para que essa pessoa sobreviva da sua arte. A gente anda pelo interior e vê coisas magníficas no artesanato, mas muitos ainda não conseguem transformar isso no potencial de renda que esse produto tem. Você vai para Iguape, para essas regiões, você vê coisas belíssimas, produzidas do caule, da natureza. Essa pessoa precisa aprender a vender isso. Eu preciso de um bom fotógrafo para tirar foto, eu preciso de alguém que escreva bem aquele texto para a rede social. Não é simplesmente entrar na internet, escrever qualquer coisa e postar uma foto feia. Como se desenha uma marca? Porque é preciso lembrar: no século 21, os publicitários somos nós todos. Não tem como mais contratar a agência mais cara do Brasil para fazer o seu logo, a gente precisa aprender essas habilidades. Graças a Deus, o brasileiro é muito criativo, faz isso muito bem. Então, eu acho que esse é o grande caminho. A gente está pensando nessa coisa integrada mesmo da cultura. Sem abrir mão da nossa qualidade, do senso crítico, da formação experimental. Não é sobre isso, é sobre ser mais do que isso.

Secretária Marilia Marton concede entrevista exclusiva a Miguel Arcanjo Prado no gabinete da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo © Bob Sousa Blog do Arcanjo 2024

Miguel Arcanjo Prado – Como desenvolveu essas mudanças que está implementando?
Marilia Marton –
Essa é uma preocupação que a secretaria tem, analisar, pensar cada etapa. A gente tem olhado para todos os contratos, não só no caso do CultSP Pro, mas todos. Será que a gente está conseguindo ver realmente os resultados das políticas públicas do Estado de São Paulo a partir das informações que a gente recebe? Porque tem contrato que é mais claro e objetivo. Mas, quando você pega uma coisa que é mais transversal, o número pode ser distorcido. Vão dizer: atendem tantas mil pessoas com cursos de quatro horas. E o que que isso forma? Números não necessariamente representam resultados. Essa é uma Secretaria da Cultura. Qual é o resultado cultural que isso traz? É claro que é difícil mudar. Entendo que as mudanças trazem aflições, mas se fosse pra ser uma secretária que ficasse aqui quieta, não seria eu. Eu não consigo ficar parada e quem me acompanha sabe o quanto eu me dedico pra gente fazer mais e melhor, porque também não basta ser mais, tem que ser melhor.

Entendo que as mudanças trazem aflições, mas se fosse pra ser uma secretária que ficasse aqui quieta, não seria eu.

Marilia Marton
Secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo

Miguel Arcanjo Prado – Eu queria que você explicasse, Marília, o que é um contrato de OS. Ele pode ser encerrado? Isso faz parte do contrato desde o início?  Quando uma OS assina, ela sabe que pode cumprir o contrato e ele pode não ser renovado? Para as pessoas entenderem esse modelo de gestão pública.
Marilia Marton –
O contrato de gestão pelas OS é a forma que a Secretaria da Cultura encontrou desde 2002, em 2004 foi assinado o primeiro contrato de gestão, há 20 anos. A Claudia Costin era secretária. Olha só, são as mulheres que transformam aqui. Ela implantou o primeiro contrato logo em abril. Então completa agora, 20 anos, do primeiro contrato. E ele é uma parceria da Secretaria com uma instituição do terceiro setor, OS [Organização Social] que vai realizar a política pública. Até o ano passado, o entendimento era que esses contratos são ciclos de até cinco anos. Então, claro, quando a gente faz o chamamento público, está escrito “esse contrato terá prazo máximo de execução de cinco anos”. Todos que assinam sabem que ele tem um ciclo. Hoje, os contratos podem ir até 10 anos pela nova lei. A gente até está aí passando por alguns entendimentos com a consultoria jurídica se isso está se aplicando agora, para o contrato de gestão, e a gente está entendendo que sim, que ele pode, inclusive, ser renovado por mais cinco anos automaticamente. É importante que as pessoas saibam que a política pública precisa ser do Estado. Ela não pode ser terceirizada. O que é terceirizado é o know-how, só porque a secretaria entende que ela não tem essa capacidade de execução. Todos que vieram aqui ou com quem me reuni falaram: “falta formar e capacitar”, em todas as reuniões que faço. Não dá para a gente ter um contrato que existe há 40 anos para formar e a gente ainda está patinando nisso. Então, a gente parou, o contrato foi olhado internamente pela Secretaria sob vários olhares, a gente inclusive fez uma última rodada com os próprios coordenadores, batendo todos os pontos do contrato para ver se a gente estava conseguindo atender todo mundo, é isso mesmo? Tivemos esse cuidado de olhar, foi uma construção muito grande, para criar um novo contrato que traga um resultado positivo. Tenho absoluta certeza que dará. Daqui um ano você volta aqui no meu gabinte, Miguel, e a gente conversa.

Miguel Arcanjo Prado – Marília, você gosta de teatro? 
Marilia Marton –
Eu amo teatro. Fui assistir agora, antes de ontem, a estreia da peça da Marisa Orth, Radojka — Uma Comédia Friamente Calculada, com a Tania Bondezan, no Teatro Faap. Até brinquei, não vou dar spoiler de teatro, porque não pode, mas a brincadeira ali do nome é bem engraçada. Enfim, eu assisto bastante teatro, já nos vimos diversas vezes nas plateias e estreias, você sabe disso, Miguel. Eu até brinquei que eu vou fazer um carrossel no Instagram de todos os teatros que eu fui, porque eu vou tanto que às vezes até confundo as histórias. Não tanto quanto você, né, Miguel [risos]. Acho que vou tirar uma terceira história de tanta peça que eu estou indo, mas tudo que todo mundo me convida eu tento prestigiar. Para mim é importante. É claro que às vezes estou numa agenda mais complicada, mas na medida do possível eu entendo que a gente precisa prestigiar todo mundo da cultura. E teatro você sabe, tem de sentar e assistir bonitinho. Então, eu acho que a gente gosta muito de teatro, eu adoro teatro, eu acho que o teatro é muito diverso. Tem palco italiano, tem palco de arena, que eu gosto mais, inclusive, que dá aquela sensação que você tá dentro do palco, pertinho dos atores. Confesso que eu gosto de teatro mais aconchegante, mais assim, um pertinho do outro. Fui assistir o Iron – O Homem da Máscara de Ferro e era uma imersão completa! O ator passa do teu lado, de repente alguém canta, eu amo. Eu fiquei toda focada na peça, e de repente teve um ator do meu lado surgiu falando. E pensei: como que essa pessoa apareceu aqui de uma hora para outra? Eu adoro teatro, eu sou apaixonada pelo teatro!

Gosto do teatro mais aconhegante, mais assim um pertinho do outro. Eu adoro teatro, eu sou apaixonada pelo teatro!

Marilia Marton
Secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo

Miguel Arcanjo Prado – É preciso ser executivo da sua própria arte?
Marilia Marton –
Exatamente, porque senão, não adianta. Que é uma outra reclamação, dizer “eu tenho que entregar para um produtor cultural porque eu não sei fazer”. Mas, você quer aprender? Porque também é uma decisão. Não estou dizendo para abandonar os produtores culturais, tá? Eventualmente, tem pessoas que dizem que eu entrego porque eu não quero ter esse trabalho. E tem gente que fala que eu entrego porque eu não tenho conhecimento e gostaria de ter para fazer eu mesmo. Ou, eu gostaria de ter conhecimento para saber se ele está fazendo certo. Porque eventualmente eu não tenho paciência para fazer, mas quero saber fazer, conhecer o processo. Essa é a liberdade que a gente quer proporcionar para cada um. É a sua carreira, você quer fazer, quer dar para alguém gerenciar, quer acompanhar? Tem que ter liberdade de escolha. Eu brinco com o seguinte: Liberdade só é bom se você tem a liberdade de escolher. Caso contrário, você é escravo da sua própria ignorância. Acho que esse é o lugar que a gente tá indo. Eu entendo também que as pessoas ficam aflitas. Ouvem histórias de “vai fechar, vai acabar”. “É um programa de 40 anos, pelo amor de Deus”. Mas, gente, precisamos olhar para o século 21. Tá lindo o romantismo, mas não é só ele. A gente tá indo para um monte de lugar, a gente tá indo com inteligência artificial, com inovação, com tecnologia, tem coisas que vão chegar na nossa porta. Se a gente não estiver preparado pra isso, como é que fica?

Precisamos olhar para o século 21. Tá lindo o romantismo, mas não é só ele. A gente tá indo para um monte de lugar, a gente tá indo com inteligência artificial, com inovação, com tecnologia, tem coisas que vão chegar na nossa porta. Se a gente não estiver preparado pra isso, como é que fica?

Marilia Marton
Secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo

Nota do editor: A Poiesis não se manifestou publicamente sobre o fim do programa Oficinas Culturais. Procurada pelo Blog do Arcanjo a respeito desta entrevista, a Poiesis optou por não comentar.

Editado por Miguel Arcanjo Prado

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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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