Após ser aplaudida por dez minutos ao fim da exibição de Ainda Estou Aqui no Festival de Veneza no último fim de semana, a atriz Fernanda Torres fez observações sobre seu trabalho no filme dirigido por Walter Salles, que está na competição pelo Leão de Ouro. Durante a conversa com a imprensa, ela deu detalhes da construção de Eunice Paiva, sua personagem que existiu na vida real.
“Ela foi viúva de Rubens Paiva [deputado assassinado pela ditadura] para a mãe de Marcelo [Rubens Paiva, escritor, autor de Feliz Ano Velho]. Então, a gente nunca a conheceu de certa forma, como conhecíamos Rubens, Marcelo. Mas ela sempre estava escondida, ela nunca tinha o desejo de ser uma pessoa pública. E ela era uma heroína, ela era uma mulher que enfrentou tragédia, que evitou melodrama. Ela não queria chorar nas ruas com a família dela”, declarou Fernanda Torres, que divide a personagem com sua mãe, Fernanda Montenegro, que interpreta Eunice na etapa final da vida.
“Ela não queria que os seus filhos se tornassem vítimas da ditadura. Então, é por isso que nós tentamos, eu acho, ser fiéis à essa mulher que acreditava que a forma de lutar contra a ditadura e o autoritarismo era por meio da educação e da Justiça. Então, é uma grande personagem. E nós evitamos o melodrama. Você [falando a Walter Salles, o diretor] cortou duas cenas que chorei muito, você cortou tudo”.
Fernanda Torres
O filme Ainda Estou Aqui ainda não tem data de estreia no Brasil. O longa, que já surge nas disputas como possível representante do Brasil no Oscar, é inspirado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva sobre a história de sua família e foca especialmente na figura da mãe, Eunice Paiva. Após seu marido ser levado de casa pelos militares e dado como desaparecido, Eunice tornou-se um importante nome da luta contra a ditadura. Ela morreu em 2018, aos 86 anos.
Quem foi Eunice Paiva, ícone da resistência à ditadura
Atualmente vista como um ícone da resistência à ditadura militar, Maria Lucrécia Eunice Facciolla Paiva nasceu em 1929, em São Paulo, em uma família de ascendência italiana. Educada no Colégio Sion e uma ávida leitora, Eunice fez amizade com renomados autores, incluindo Lygia Fagundes Telles, e destacou-se ao ingressar em Letras na Universidade Mackenzie. Em 1947, conheceu Rubens Paiva, com quem se casou em 1952 e teve cinco filhos. Rubens Paiva tornou-se deputado federal em 1962, mas, após o golpe militar em 1964, teve seus direitos políticos revogados. Durante o período de instabilidade entre 1964 e 1970, a família mudou-se para o Rio de Janeiro, onde enfrentou uma tragédia em 1971. Em 20 de janeiro daquele ano, Rubens foi capturado pela polícia. Eunice foi presa no dia seguinte e interrogada por 12 dias. Após a libertação, começou a investigar o destino do marido, mas sem sucesso. Ela enviou cartas ao presidente Médici e a diversas autoridades, buscando respostas sobre o desaparecimento dele, recebendo apenas informações contraditórias. Junto a outras mulheres, como Zuleika Angel, a Zuzu Angel, Eunice se tornou um ícone na luta pela abertura de arquivos sobre as vítimas do regime. Formou-se em Direito após ficar viúva e foi fundamental na criação da Lei 9.140/95, que reconhece os desaparecidos pela ditadura. Eunice lutou contra o Alzheimer por 14 anos e faleceu em 13 de dezembro de 2018, em São Paulo, aos 86 anos.
- Fringe abre inscrições para peças do Circuito Independente no Festival de Curitiba
- Gaby Spanic, estrela de A Usurpadora, faz show em São Paulo no Carioca Club
- Restaurante Dona Lucinha resguarda o sabor de Minas Gerais em casarão histórico de Belo Horizonte
- Centro de Arte Popular de Minas Gerais tem coleção de rara beleza no Circuito Liberdade em BH
- Museu de Artes e Ofícios SESI é cartão-postal repleto de memória no coração de Belo Horizonte
Siga @miguel.arcanjo
Ouça Arcanjo Pod
Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
© Blog do Arcanjo – Cultura e Entretenimento por Miguel Arcanjo Prado | Todos os direitos reservados.