Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
★★★★★
DOS QUE VÃO MORRER, AOS MORTOS
Romance de Rafael Sette Câmara
Avaliação: Ótimo
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Rafael Sette Câmara faz de seu romance de estreia uma delicada e envolvente narrativa repleta de verdades, cruezas e belezas. Dos Que Vão Morrer, Aos Mortos é um dos melhores romances do ano. Não à toa, o livro lançado no começo do ano pela Editora Urutau vem fazendo retumbante sucesso desde sua pré-venda, com reimpressões constantes e concorridos lançamentos na Academia Mineira de Letras e na 27ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo.
Seu autor demonstra singular habilidade com as palavras, tecendo uma narrativa que prende o leitor da primeira à última página. O disparador é uma tragégia familiar e o luto sepulcral decorrente dela. O narrador descobre, durante uma jovem viagem de mochilão à África do Sul, às vésperas da Copa do Mundo de 2010, e justo no momento em que estava “empoleirado num avestruz”, que sua mãe morreu de forma misteriosa.
A má notícia, obviamente, muda drasticamente a vida daquele rapaz. Como é jornalista, o personagem começa uma saga investigativa para conseguir respostas para a abrupta e violenta partida de sua progenitora.
Para além do drama familiar, Sette Câmara honra a herança literária dos grandes autores de sua terra e traça em sua narrativa um retrato minucioso da vida ao redor de seus personagens, sobretudo a da cidade na qual vivem, Belo Horizonte. A capital mineira, com sua efervescência cultural e social no começo do século 21, é uma personagem presente e atuante no romance, oferecendo lugares icônicos como o tobogã da Avenida do Contorno, a rua Sapucaí, o estádio Independência e a Lagoa da Pampulha como pontos nevrálgicos dessa estimulante história.
A partir da vida de seu narrador, o autor captura um retrato potente da sociedade nas primeiras décadas do século 21, transformando o seu local em universal. A compungida narrativa consegue abarcar de forma harmoniosa questões que vão desde o avanço evangélico na sociedade brasileira, passando pela a retomada, pela juventude, de uma relação mais orgânica com a rua e com cidade, e até mesmo homenageando o combalido jornalismo, ao expor sua desistência da procura pela verdade em nome de flexões éticas subservientes ao poder.
Dos Que Vão Morrer, Aos Mortos é um romance entabulado pela morte, mas que se torna uma espécie de elegia da vida. O livro conserne uma tristeza que paira, mas também exala uma vibração única que mexe com sentimentos profundos do leitor. Afinal, a vida vai além dos momentos epifânicos e também encontra sua beleza no intangível do cotidiano. Eternizar este efêmero em literatura da mais alta qualidade é o grande mérito deste livro. Fartamente dotado de raro talento literário, Rafael Sette Câmara se torna com este romance um dos principais escritores de sua geração.
★★★★★
DOS QUE VÃO MORRER, AOS MORTOS
Romance de Rafael Sette Câmara
Avaliação: Ótimo
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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