Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
O cineasta Paulo Nascimento está feliz e surpreso com o sucesso que seu filme Ainda Somos os Mesmos vem fazendo nos cinemas. O longa distribuído pela Paris Filmes estreou em 26 de setembro e rompeu a barreira da primeira semana e segue em cartaz por várias capitais brasileiras em sua segunda semana de exibição. Escrito e dirigido por ele, que o produziu com sua Accorde Filmes, em coprodução com Edson Celulari e Carol Castro, também coprotagonistas, o filme tem levado às salas de várias capitais brasileiras um público ávido por ver um bom suspense político ambientado em tempos de ditadura militar na América Latina da década de 1970. O enredo, sobre um pai empresário (Edson Celulari) que busca ajudar o filho perseguido pelos militares (Lucas Zaffari), é baseado em episódio da vida real, quando, diante do golpe militar do sanguinário general Augusto Pinochet no Chile em 1973, vários brasileiros que lá estavam se refugiaram na Embaixada da Argentina em Santiago. Estão no elenco ainda Lucas Zaffari, Nestor Guzzini, Nicola Siri, Juan Manuel Tellategui, Carlos Falero, Rogério Beretta, Alvaro RosaCosta, Evandro Soldatelli, Pedro Garcia, Gabrielle Fleck, Jurema Reis, Néstor Monasterio e Liane Venturella, entre outros. A seguir, o diretor de Ainda Somos os Mesmos e de outros filmes como Chama a Bebel (2024) e Teu Mundo Não Cabe Nos Meus Olhos (2017) e da série Chuteira Preta (Prime Video) fala com exclusividade ao Blog do Arcanjo sobre seu novo filme. Leia a entrevista a seguir.
Miguel Arcanjo Prado – Como tem sido a reação do público com o filme Ainda Somos os Mesmos em cartaz nos cinemas?
Paulo Nascimento – O público que procura o filme são pessoas que gostam de histórias. Muito mais que questões políticas, vimos que são pessoas que gostam de histórias mais densas, clássicas e contadas de uma forma que é interessante de assistir. Uma história real, jovens confinados, um pai em busca de salvar seu filho, o filme tem muitos elementos que atraem o público que gosta de boas histórias. Temos todo um contexto histórico por trás, mas, na verdade o que vemos prevalecer é a vontade de ver uma narrativa de busca pela liberdade e sobrevivência.
Temos todo um contexto histórico por trás de Ainda Somos os Mesmos, mas, na verdade o que vemos prevalecer é a vontade de ver uma narrativa de busca pela liberdade e sobrevivência.
Paulo Nascimento
cineasta
Miguel Arcanjo Prado – O filme venceu a barreira da primeira semana em cartaz, o que sabemos que é um grande feito para um filme brasileiro, e Ainda Somos os Mesmos segue em cartaz em várias salas por todo o país, já em sua segunda semana. Você está feliz com essa conquista?
Paulo Nascimento – Feliz e, de certa forma, surpreso, porque o cinema brasileiro vem enfrentando um ano muito difícil. Quando eu vi que mais de 60% das salas haviam confirmado o filme para a segunda semana, fiquei pensando: “Nossa história está chegando nas pessoas…” e isso não é pouco nos tempos atuais. Agradeço o esforço da Paris Filmes, nossa distribuidora, aos exibidores e ao público que está permitindo isso.
Miguel Arcanjo Prado – Onde ainda é possível assistir Ainda Somos os Mesmos nos cinemas?
Paulo Nascimento – O filme continuou em grande parte das salas, em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife e várias cidades.
Miguel Arcanjo Prado – Como foi trabalhar novamente com Edson Celulari? E como foi o trio com o Edson e a Carol Castro como coprodutores do filme ao lado da sua Accorde Filmes?
Paulo Nascimento – Além do Edson que é um grande amigo, além de um grande ator, eu já havia trabalhado com a Carol como produtor e foi daí que surgiu a ideia de convidá-los para fazer o filme como atores e coprodutores. Fico muito grato por eles terem “comprado a ideia”, pois foi fundamental para que o filme acontecesse. Devo muito a eles e sempre é um prazer estar no set com os dois como atores e agora também como responsáveis pela viabilização do filme.
Miguel Arcanjo Prado – Seu filme toca num assunto que o Brasil muitas vezes evita. Qual a importância disso?
Paulo Nascimento – Nunca é muito confortável falar sobre a memória. Tanto na vida privada como na vida pública, mas por pensarmos assim chegamos onde chegamos. Temos todos um compromisso com a manutenção da democracia, com todos os seus problemas, mas não podemos aceitar outra opção. Podemos e devemos respeitar opiniões contrárias, visões contraditórias, mas não a barbárie civilizatória como vem sendo apregoada nos últimos anos e sendo superado ano a ano. Parece que cada vez surge um ser com mais capacidade de afrontar a civilização, a ciência, a cultura, a diversidade e esse “ser” se diz contra “o sistema” que, na verdade é a democracia. Temos que puxar a memória pra que, principalmente os jovens, saibam o que é viver em “outro sistema”. O que é viver em meio ao medo, a tortura, a incerteza. Isso não é confortável, mas absolutamente necessário.
Miguel Arcanjo Prado – Você trabalha com um elenco diverso e muito afinado em Ainda Somos os Mesmos. Está satisfeito com o time que uniu neste trabalho?
Paulo Nascimento – Muito. Muito mesmo. É uma felicidade você ver que não existem pequenos personagens. Existem personagens fundamentais independentemente do seu tempo na tela.
Miguel Arcanjo Prado – Seu filme anterior foi um longa adolescente, Chama a Bebel. Agora, você aposta em um suspense político. Como enxerga essa versatilidade em seus trabalhos?
Paulo Nascimento – Sempre me considerei um contador de histórias. Algo que herdei da minha mãe e o hábito de ouvi-la desde que era muito pequeno e ela lia para mim e para meus irmãos sob a luz de um lampião em uma fazenda no interior do interior do Rio Grande do Sul. Assim, o que busco sempre é uma boa história que faça sentido ser contada.
Sempre me considerei um contador de histórias. Algo que herdei da minha mãe e o hábito de ouvi-la desde que era muito pequeno e ela lia para mim e para meus irmãos sob a luz de um lampião em uma fazenda no interior do interior do Rio Grande do Sul. Assim, o que busco sempre é uma boa história que faça sentido ser contada.
Paulo Nascimento
cineasta
Miguel Arcanjo Prado – Você já trabalhou com a atriz argentina Soledad Villamil em Teu Mundo Não Cabe nos Meus Olhos. Agora, em Ainda Somos os Mesmos, trabalha com o ator uruguaio Néstor Guzzini e com o ator argentino Juan Manuel Tellategui. Queria que falasse um pouco desses parceiros internacionais e por que faz questão de tê-los em seus trabalhos.
Paulo Nascimento – Eu comecei no Rio Grande do Sul e minha formação cultural é gaúcha, então há um elemento latino-americano muito forte em tudo. A mistura da cultura brasileira, gaúcha, argentina, uruguaia é algo muito mais evidente do que as pessoas do resto do Brasil imaginam. Começa na infância. Eu cresci indo comprar azeite, calça jeans e doce de leite “no outro lado da fronteira”. Algumas palavras na minha casa eram duvidosas se eram em português mesmo (e não eram). E assim a gente vai construindo uma identidade latino-americana. Por isso, é muito natural e necessário ter atores (e ainda mais com essa qualidade) em todos meus filmes. Acrescento aí também o Cesar Troncoso que fez vários trabalhos comigo. Acabamos virando uma grande família latino-americana, unindo atores brasileiros, argentinos, uruguaios, e mais, isso acontece na equipe técnica também. Temos chilenos, argentinos, uruguaios na equipe. Isso me faz muito bem e faz muito bem ao cinema.
Miguel Arcanjo Prado – Boa parte de Ainda Somos os Mesmos foi rodado em Porto Alegre. Qual a importância dessa cidade e dos artistas do Rio Grande do Sul no cinema que você faz? Sobretudo após tanto desatre por lá, como enxerga o sucesso do filme nas telonas?
Paulo Nascimento – Porto Alegre é minha base em todos os sentidos. É lá que está grande parte da minha equipe, é lá que encontro praticamente todas as locações que preciso e, por mais que ande pelo mundo, lá tenho sempre a sensação de “filmar em casa.” Agora, nesse momento pós desastre climático, é imperativo que se leve produções para lá para ajudar a recuperar a economia audiovisual. Foi muito terrível o que aconteceu e a ajuda, quando chegou, teve seus trâmites e burocracias que fez com que muito não tenha acontecido até agora. Tem sido um desafio para técnicos, profissionais de todas áreas sobreviverem este ano. Estou tentando fazer a minha parte.
Porto Alegre é minha base em todos os sentidos. É lá que está grande parte da minha equipe, é lá que encontro praticamente todas as locações que preciso e, por mais que ande pelo mundo, lá tenho sempre a sensação de “filmar em casa.”
Paulo Nascimento
cineasta
Miguel Arcanjo Prado – Você já tem novos projetos em mente? O que pode adiantar?
Paulo Nascimento – Por questões de confidencialidade não posso adiantar muito, ou quase nada, mas estou começando um novo filme neste mês de outubro que vai ser um divisor na minha carreira. Uma nova direção em termos de foco e desafio.
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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