Tiradentes em Cena encerra 2024 com peça natalina dirigida por Chico Aníbal com artistas locais
Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
Com Geovane Carvalho*
Vai ser pura emoção neste sábado em Tiradentes, Minas Gerais, regada ao clima do Natal. A Mostra de Artes Cênicas Tiradentes em Cena encerra suas ações em 2024 com uma apresentação especial da peça O Boi e o Burro no Caminho de Belém encenada por artistas locais com seu Núcleo Criativo.
A montagem é fruto de uma oficina que vem acontecendo desde setembro em Tiradentes, ministrada pelo diretor e ator Chico Anibal, nome de farta trajetória nos palcos. A ideia surgiu após conversas entre o ator e diretor Chico Aníbal e a diretora e idealizadora do Tiradentes em Cena, Aline Garcia, que embalava um antigo sonho: criar um grupo de teatro na cidade histórica mineira.
Assim, nasceu a ideia de reunir pessoas que nunca tinham atuado para uma oficina de iniciação ao teatro, com a realização de um espetáculo como resultado, sob produção do Tiradentes em Cena.
A escolha foi uma obra clássica do teatro infantil brasileiro, adaptada com sotaque mineiro e arranjos especiais do maestro Ney Gouvea, figurinos e cenários artesanais criados pelo artista plástico Demóstenes Dumont, do prestigiado Grupo Matizes Dumont, e com um elenco diverso e repleto de talento.
Texto clássico
A peça O Boi e o Burro no Caminho de Belém é uma adaptação do texto original de Maria Clara Machado (1921-2001), ícone da dramaturgia de teatro infantil no Brasil e fundadora do Teatro Tablado no Rio de Janeiro.
O texto original data de 1953, quando a dramaturga nascida em Belo Horizonte resentou este que é um dos seus primeiros sucessos no Tablado.
A obra narra o nascimento de Jesus Cristo sob a perspectiva encantadora do Boi e do Burro, personagens clássicos do presépio. Com uma linguagem acessível, de classificação livre e enriquecida por músicas natalinas, a peça mistura figuras históricas presentes na Bíblia.
Entrevista com Chico Aníbal
A seguir, confira uma entrevista com o diretor Chico Aníbal, que já atuou nas novelas Fina Estampa (2011) e Travessia (2022) , na minissérie JK (2006), além de filmes como O Homem de Lagoa Santa (2000) e Mão na Luva (2014). Desde 2021, Chico tem ministrado oficinas e curso no Tiradentes em Cena. Leia o bate-papo entre o diretor e o repórter Geovane Carvalho.
Blog do Arcanjo – Chico, o que motivou a escolha de O Boi e o Burro no Caminho de Belém para essa apresentação de fim de ano?
Chico Aníbal – Conversando com a Aline Garcia, o Tiradentes em Cena tinha uma pequena verba para ser usada até o fim deste ano. Como ela sempre desejou criar um grupo de teatro para o Tiradentes em Cena, apresentei a ela este texto que acredito, vai emocionar todo mundo que for ver o espetáculo no Yves Alves nesse fim de ano. Acredito que essa peça pode dar início a formação de um novo grupo de teatro em Tiradentes. Esse é um texto clássico da Maria Clara escrito em 1953, no início da formação do Teatro Tablado do Rio de Janeiro, em 1951.
Blog do Arcanjo – Qual a relevância da obra de Maria Clara Machado para o público atual?
Chico Aníbal – Maria Clara Machado é mineira de Belo Horizonte. Sua obra é cheia de elementos que levam às Minas Gerais. Seus textos são atemporais e clássicos. A nova geração, as crianças e jovens não conhecem seus textos. Ela é considerada a mais importante autora de teatro infantil no Brasil. Sua obra vem sendo publicada desde os anos 1960 por várias editoras. É bem possível que nas bibliotecas escolares e municipais deve ter uma estante sobre teatro, ainda mais o infantil. Mas é quase certo que a Maria Clara esteja lá. E isso é muito bom.
Blog do Arcanjo – Você trouxe alguma adaptação ou atualização ao texto original para dialogar com o público contemporâneo?
Chico Aníbal – Procurei ser fiel ao seu texto modificando pouca coisa, colocando um sotaque mais amineirado e troquei a maioria das músicas para dar um toque mais contemporâneo com músicas do nosso reisado… O maestro Ney Gouvea deu um toque muito especial nos arranjos e elas são cantadas ao vivo.
Blog do Arcanjo – Como foi o processo de formação do elenco com o grupo vindo da oficina de teatro do Tiradentes em Cena?
Chico Aníbal – Pelas oficinas que venho ministrando desde 2021 em Tiradentes, muitos desses alunos vieram de diversos lugares. Alunos de teatro da UFSJ, gente de Barbacena, Barroso e região. Funcionários públicos, professores, comerciantes, adolescentes… enfim um leque de pessoas de diversas idades. Bem ao estilo de Maria Clara Machado, que sempre preservou o desejo de fazer um teatro amador com todos os requintes de um teatro profissional.
Blog do Arcanjo – Quais foram os maiores desafios na preparação deste elenco, considerando que é um grupo amador com características profissionais?
Chico Aníbal – A disponibilidade das pessoas para um trabalho que demandou mais de 05 meses para ser realizado. A gente sabe das penúrias que é fazer teatro, principalmente no interior… mas como eu sou um ator que veio do teatro de grupo dos anos 80, 90, de quando ainda não havia cursos superiores de arte cênica em Minas Gerais, a gente acaba se adaptando a essas dificuldades. Hoje o celular é um facilitador para aglutinar e agilizar as demandas de uma montagem, como também é um recurso muito simples para dispersão e acomodação das pessoas. Isso eu ainda tenho um pouco de dificuldade de juntar essa moçada toda. Mas a gente vai correndo atrás e se adaptando…
Blog do Arcanjo – A farsa-mistério é um gênero rico em simbolismos. Como você trabalhou esses elementos durante os ensaios?
Chico Aníbal: A história do nascimento de Jesus e toda a sua trajetória é uma história rica de elementos misteriosos. O mundo não é dividido por antes e depois de Cristo? A história que estamos contando é justamente esse mistério. É a natureza, os bichos, as estrelas e o povo daquela época sentindo que alguma coisa nova, cheia de esperança, estava para nascer.
Blog do Arcanjo – Os cenários e a indumentária estão sendo criados de forma poética pelo artista plástico Demóstenes Dumont, integrante do Grupo Matizes Dumont, conhecido por bordar a brasilidade com uma linguagem única há mais de 36 anos. Conte para a gente: como essa parceria tem contribuído para enriquecer a montagem de O Boi e o Burro no Caminho de Belém?
Chico Aníbal: Conheço o Demóstenes desde o início dos anos 90 quando ele fez o cenário e os adereços da peça “Caminho da Roça” em BH com a Cia. Sonho e Drama. Reencontrá-lo em Tiradentes, onde já mora há mais de 20 anos, foi uma grande surpresa. Ele é um artista maravilhoso, talentoso, e seu trabalho tem tudo a ver como o que eu estava pensando quando comecei a ensaiar essa peça. O cenário e os figurinos da peça foram criados de uma maneira quase artesanal dando um tom rústico e imagético para o espectador. As ilustrações e imagens no telão são desenhos do Grupo Matizes Dumont do qual Demóstenes faz parte.
Blog do Arcanjo – Como você imagina que o público tiradentino se conectará com essa narrativa e seus personagens?
Chico Aníbal – Contar a história do nascimento de Jesus, como está na Bíblia, de uma maneira simples e lúdica para todas as idades, nos faz refletir de como esta festa de natal se transformou nos dias atuais. Acho que já está passando da hora das pessoas perceberem que o natal é uma festa espiritual e de muita alegria, e não uma festa de consumo, luzes e cores. Papai Noel desbancou o aniversariante Jesus. Não sei até que ponto a meninada de hoje compreende tudo isso. Acho que essa história contada por um Boi e um Burro pode levar essa moçada a refletir um pouco mais sobre tudo isso.
Blog do Arcanjo – Você já colabora com o Tiradentes em Cena há algum tempo, ministrando oficinas e realizando montagens. Na sua opinião, essa produção de O Boi e o Burro no Caminho de Belém pode trazer ainda mais a criação e a consolidação de um movimento teatral mais sólido e estruturado na cidade, ideal que a Mostra Tiradentes em cena persegue faz anos?
Chico Aníbal – É tudo que a gente quer. A gente já está pensando num novo trabalho para maio do ano que vem, quando acontece mais uma edição do Tiradentes em Cena. Mas como se diz: não vou dar spoiler.
*Estudante de Jornalismo da UFSJ sob supervisão do jornalista Miguel Arcanjo Prado.
A peça “O Boi e o Burro no Caminho de Belém” estreia no Tiradentes em Cena no dia 21 de dezembro de 2024, sábado, às 19h no Centro Cultural Yves Alves, na Rua Direita, 168, Centro Histórico, Tiradentes. Retire seu ingresso.
O Boi e o Burro no Caminho de Belém
de Maria Clara Machado
ELENCO
BOI: ANTHONY MATTOS
BURRO: FLÁVIO COSTA
PASTOR: TECO CRISTELLI
PASTORZINHO: SOL SETTE
PASTORAS: DAIENE HILLARY, MARA NATASHA e MELISSA KELLY
REI BRANCO: CHICO ANÍBAL
REI PRETO: LUCAS ANJOS
REI AMARELO: RODRIGO ROSADO
RAINHA BRANCA: BIANCA VENTURA
RAINHA PRETA: DANIELA NASCIMENTO
RAINHA AMARELA: DOROTY MENEZES
MARIA : LOHA RODRIGUES
JOSÉ: NEWTON MACEDO
FICHA TÉCNICA
DIREÇÃO ARTÍSTICA: CHICO ANÍBAL
ASSISTENTE DE DIREÇÃO: RENATA DE LUCCA
CENÁRIO, FIGURINOS E ADEREÇOS: DEMÓSTENES VARGAS
MAESTRO E ARRANJADOR: NEY GOUVEA
DIREÇÃO DE MOVIMENTO: BIANCA PEREIRA
DESENHO E OPERAÇÃO DE LUZ: RENAN OLIVEIRA
OPERAÇÃO de SOM / PROJEÇÃO: RAYO GUIDIO
PRODUÇÃO EXECUTIVA: VINÍCIUS CRISTÓVÃO
COSTUREIRA: CELINHA RIBEIRO
MÚSICOS: HUMBERTO CHAGAS (TECLADO), GUSTAVO CHAGAS (VIOLÃO), NEY GOUVEA (PERCURSSÃO)
ILUSTRAÇÃO DO PROGRAMA: DEMÓSTENES VARGAS
DESIGN GRÁFICO: BRUNO GROSSI
MÍDIA DIGITAL: GEOVANE CARVALHO
PROJEÇÃO CENOGRÁFICA: ANDRÉ FRADE E DEMÓSTENES VARGAS
INTÉRPRETE DE LIBRAS: DAIANE BISPO
COORDENAÇÃO GERAL: ALINE GARCIA / TIRADENTES EM CENA
PRODUÇÃO GERAL: VINÍCIUS CRISTÓVÃO / TIRADENTES EM CENA
AGRADECIMENTOS
Espaço Cultural Aimorés, Centro Cultural Yves Alves, Pousada Boutique Oratório, Berê Berenice Bar, Ateliê Gastronômico, Cristóvão Produções, André Frade, Pousada Richard Rothe, Maria José Boaventura, Laura Câmara, Patrícia Bessa, Kaike Chaves, Ilka Nascimento, Sonia Freitas, Matizes Dumont, Marcela Paiva, Luiza Cassano, Dra. Mariana Silva Reis, Chaiane & Mateus (TragaLuz).
Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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