★★★★ Crítica: Gertrude, Alice e Picasso tem brilho de Bárbara Bruno rodeada de amor

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
★★★★
GERTRUDE, ALICE E PICASSO
Avaliação: Muito Bom
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Sextas e sábados, 20h
Mi Teatro, em SP – Compre seu ingresso
Gertrude, Alice e Picasso, peça de Alcides Nogueira dirigida por Vanessa Goulartt, estreou sob fortes aplausos no Mi Teatro ao elenco encabeçado por Bárbara Bruno, como Gertrude Stein, ao lado de Patrícia Vilela, como Alice B. Toklas, e Joca Andreazza, como Pablo Picasso. A peça faz sessões às sextas e aos sábados, 20h, no Mi Teatro (r. Pamplona, 310), em São Paulo, até 5 de abril de 2025.
O texto foi escrito por Alcides Nogueira há 30 anos, a pedido da saudosa Nicette Bruno, mãe de Bárbara, que queria celebrar seus 50 anos de carreira no teatro com uma peça que fosse inédita e também tivesse frescor. E assim foi em sua estreia original, em 1996, quando ocupou o Centro Cultural São Paulo.
Agora, a mesma montagem serve ao cinquentenário de carreira de Bárbara Bruno, primogênita dos lendários atores Paulo Goulart e Nicette Bruno, e que herdou dos pais o farto talento que demonstra em cena em uma verdadeira aula de atuação.

O clima em família, que sempre marcou as produções dos Bruno Goulart, também está nas coxias, já que a direção, que na primeira versão foi assinada por Antonio Abujamra e Marcio Aurelio, dessa vez marca a bem sucedida estreia de Vanessa Goulartt, filha de Bárbara e neta de Nicette e Paulo, na função.
O enredo mostra a relação entre três grandes personagens do século 20, que conviveram em Paris entre as duas grandes guerras mundiais, período em que a cidade vivia uma efervescência cultural.

A escritora norte-americana Gertrude Stein ao lado de sua companheira e conterrânea Alice B. Toklas eram disputadas anfitriãs dos gênios exilados em Paris, entre eles o espanhol Picasso. Ambas mulheres à frente de seu tempo, elas formaram um casal de lésbicas pioneiras na sexualidade sem tabus, o que as tornou icônicas, com Gertrude nos holofotes e Alice nos bastidores.

Neste caso, a peça respeita o real. Assim, a Gertrude exuberante de Bárbara Bruno, no papel que foi de Nicette, toma bem mais a cena que a comedida Alice de construção delicada e profunda de Patrícia Vilela, no papel que originalmente foi de Clarisse Abujamra.
No contraponto entre as duas, e por vezes até duelando com Stein como macho alfa, está Picasso, interpretado por Joca Andreazza — na primeira versão o papel foi de Francarlos Reis. Joca faz uma construção intensa, que serve de escada para o brilho das duas atrizes. Nada mais satisfatório, sobretudo em uma peça com Stein e Toklas de personagens centrais e na qual Picasso parece uma visita que esqueceu de olhar o relógio para dar-se conta que é hora de ir-se.

Bárbara Bruno merece todos os louros nesta obra. Ela está estupenda como Gertrude Stein, dizendo saborosamente cada palavra, em uma prosódia irretocável, típica das grandes atrizes do século 20 e coisa rara nos dias atuais. Patrícia Vilela, por sua vez, é uma adorável coadjuvante como Alice B. Toklas foi na vida real, que sabe seu momento de brilhar; quando ele surge, faz com a exatidão e o comedimento que sua personagem pede.

É preciso ainda exaltar a direção de Vanessa Goulartt, atriz que praticamente nasceu nos palcos e que estreia com propriedade na função de comandar uma encenação. Ela demonstra que possui olhar estético refinado e que consegue construir soluções criativas para manter a dinâmica do jogo cênico. Em sua mão, o intimista Mi Teatro, de Mara Carvalho, fica gigante.

O texto de Alcides Nogueira está longe de ser excessivamente histórico ou biográfico, como algumas peças de Wikipedia que vemos por aí. Tampouco é dramático. Longe disso, mistura pitadas de pós-dramático e de teatro épico, mesclando o passado e o presente, tanto na vida dos personagens quanto no olhar do público, com direito a muita ironia.
Claro que, para quem não faz ideia de quem foi Gertrude Stein, Alice B. Toklas ou mesmo Picasso — e este crítico precisa lembrar que há cada vez mais pessoas assim, inclusive ne teatro —, a peça possibilita pelo menos alguns primeiros traçados sobre os personagens e suas obras no mundo. Quem sabe assim desperta algum interesse de pesquisa posterior aos mais curiosos.

A dramaturgia foi levemente atualizada pela direção com autorização do autor, buscando aproximar as figuras dos já centenários anos 1920 aos dias atuais, atualizando citações, e também abrasileirando referências — surgem desde Anitta à Tropicália, por exemplo. Claro que tais momentos despertam o riso do público. E essa parece ser mesmo a intenção.

No time criativo, impõe-se, sofisticada e soberana, a luz de César Pivetti, iluminador cada vez mais desejado pelas mais sábias produções por sua capacidade de fazer muito com pouco, afinal, tem olhar poético, que deveria ser a tônica, mas anda cada vez mais raro neste ramo. Por isso, ele é tão requisitado.
Outro destaque é a caracterização de época de Beto França, com a irretocável peruca de Alice B. Toklas. Ainda estão no time criativo André Abujamra e Ricardo Severo na trilha e Bárbara Bruno e Paulo Goulart Filho na concepção original.

Gertrude, Alice e Picasso é uma peça rodeada de amor por todos os lados. Se no palco temos o amor do casal Stein/Toklas ou dos amigos Stein/Picasso, na plateia há o amor imenso do público brasileiro pelo legado da família Bruno Goulart, sempre merecedora de nossos efusivos aplausos de pé pelos tijolos amarelos que colocou na estrada do teatro brasileiro. Nesta peça, sobretudo, Bárbara Bruno assume com louvor o papel de porta-estandarte desta preciosa herança, emocionando a todos nós.


★★★★
GERTRUDE, ALICE E PICASSO
Avaliação: Muito Bom
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Sextas e sábados, 20h
Mi Teatro, em SP – Compre seu ingresso
Gertrude, Alice e Picasso: Blog do Arcanjo mostra artistas nos bastidores do Mi Teatro















Blog do Arcanjo mostra quem já aplaudiu Gertrude, Alice e Picasso no Mi Teatro



















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Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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