Cortejo da Arte pede tombamento da Serra de São José em festa de rua na Mostra de Cinema de Tiradentes

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
Enviado especial a Tiradentes, Minas Gerais*
Reportagem de FELIPE ROCHA**
A charmosa cidade histórica de Tiradentes, em Minas Gerais, na região do Campo das Vertentes, é palco de inúmeros eventos culturais e artísticos. Seus casarões e igrejas coloridas, seu calçamento de pedras e a Serra de São José compõem um cenário totalmente poético e repleto de vigor para a realização dessas festas. Desde a última sexta, 24 de janeiro, acontece um dos principais festivais da cidade, a 28ª edição da Mostra de Cinema de Tiradentes, evento pioneiro que impulsionou e projetou a cidade mundialmente, e que movimenta bastante a cidade de 8.000 habitantes, trazendo inúmeros turistas e mais de 100 jornalistas de várias partes do país.
Com uma programação extensa, a Mostra apresenta ao público a diversidade e a essência da produção audiovisual brasileira em 140 filmes, vindos de 21 estados. Como é tradição, este sábado, 25 de janeiro, foi marcado por um evento que fez o público dançar ao ritmo das batucadas: o Cortejo da Arte, com direito a bolo e parabéns aos 307 anos de Tiradentes.

Salve a Serra de São José
Trata-se de um passeio musical, circense e teatral pelas ruas tricentenárias da cidade, que acaba de completar 307 anos, em meio a um dia radiante. Neste ano, a festa teve caráter político e homenageou e defendeu da especulação imobiliária um patrimônio natural e importantíssimo de Tiradentes, a Serra de São José, pedindo o seu tombamento a nivel federal.
Os moradores e participantes do evento chamaram a atenção para o tombamento dessa importante formação quartzítica, que possui valor estético, histórico e cultural.

Em comemoração ao aniversário da cidade, o Cortejo iniciou seu percurso pela rua principal, a Rua Direita, saindo da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, a mais antiga de Tiradentes e construída pelos negros escravizados.
Mas a caminhada não foi ligeira: o público pôde se divertir bastante e interagir com os grupos presentes. Por fim, a trajetória terminou no Largo das Forras, onde os escravizados recebiam sua carta de alforria e, depois, se tornou a principal praça e o coração da cidade e onde está montado o Cine Praça.

Grupos em festa
Inúmeros e diversos eram os grupos presentes no Cortejo da Arte. A começar pelas atrações que encantaram, principalmente, o coração do público infantil. O primeiro deles é um grupo de mulheres palhaças chamado “Calcinha de Palhaça”, que trouxe números clássicos da palhaçaria adaptados ao universo feminino, divertindo bastante as crianças.
Também nesse universo, marcaram presença o Palhaço Pitoco, também ilusionista e malabarista; e a Palhaça Solulu, devota de Nossa Senhora do Bom Humor. Outro queridinho dos pequenos foi a Turma do Pipoca, um grupo de bonecos formados por personagens que representam elementos do cinema, como: o Pipoca, o Lanterninha, a Baleira, o Projecionista, o Diretor, o Produtor, o Ator, a Artista e Assistente de Produção, já tradição nas mostra fã Universo Produção em Tiradentes, Ouro Preto e Belo Horizonte.
Já para o público em geral, a Batucada das Minas se destacou por sua energia e astral alto. Um coletivo de 45 mulheres residentes da região que promovem o acolhimento e o empoderamento desse grupo através da música e da cultura popular, que trouxe o espetáculo “Roda de Palhaças”.

Juntamente, o bloco Unidos do Samba Queixinho, formado em 2009 em Belo Horizonte, trouxe uma variedade de instrumentos musicais e batucadas clássicas de Carnaval, além do bom e velho samba-enredo transformando a Rua Direita em um sambódromo instantâneo.
Houve também uma intervenção, a Folia dos Reis, um passeio de três bonecos representando os Três Reis Magos, que interagiram com o público presente e difundiram sua fé, amor, bondade, alegria e o espírito natalino.
E, claro, não poderia faltar, ela, que é indissociável de Tiradentes, a tradicional Orquestra e Banda Ramalho, que tem 164 anos e é um importante patrimônio cultural da cidade, mantendo viva a tradição musical local.

Público em êxtase
O Blog do Arcanjo entrevistou seis pessoas de áreas distintas durante o cortejo, sejam realizadores ou pertencentes ao público em geral. Os entrevistados foram questionados sobre a importância e o significado do Cortejo da Arte e suas impressões sobre esse evento realizado pela Mostra de Cinema de Tiradentes.
Na visão de Marisol Jotta, 52, empresária e produtora da Batucada das Minas, o Cortejo da Arte tem uma importância em todos os níveis. “É trazer a arte para a rua, né? Que é onde ela realmente se manifesta. Porque aqui a gente tá junto, a gente congrega, a gente luta junto como hoje. Além de a gente estar fazendo um Cortejo da Arte, a gente tá fazendo um cortejo de manifestação em nome da nossa Serra de São José”, reforçou.
Já Aline Garcia, 45, empresária, curadora e diretora da mostra de artes cênicas Tiradentes em Cena, afirma que o Cortejo de Rua é uma unificação cultural. “Eu acho legal que tem essa coisa da ocupação do espaço, do urbano, com a arte, e traz muitas coisas nossas da região. Eu acho que isso engrandece muito tanto para cidade, quanto para a mostra também”.
Douglas Veloso, 26, músico da Banda Ramalho e estudante, destacou a relevância da participação da Banda Ramalho no Cortejo da Arte: “A Banda Ramalho participar desse cortejo é muito importante para manter viva a tradição musical. A presença dela em eventos típicos de Tiradentes é valorizar ainda mais a sociedade, já que ela é a mais antiga da cidade, fundada em 1860 e é a que mantém de pé as tradições cívicas e religiosas”.
Nayara Cunha, 39, diretora de projetos em agência de publicidade para farmacêuticos (PMO), contou que é uma apreciadora da arte e que está sempre marcando presença em eventos culturais em Paraty, como a tradicional feira literária e em Poços de Caldas, sua cidade natal. Ela gosta muito de viajar a Tiradentes, desde a infância, mas este foi o ano em que ela descobriu a riqueza da Mostra de Cinema de Tiradentes, sendo a primeira vez que participa. Ela celebrou a realização do Cortejo da Arte como uma pessoa que já está acostumada a frequentá-los: “Eu amo cortejos. Vou muito em cortejos em São Paulo, que eu também moro lá. Esses cortejos de rua trazem muito da cultura popular e a gente junto, andando e se apropriando da rua. Eu acho incrível. Em Poços de Caldas tem muitos também”.
Maria Angélica de Oliveira, 53, professora, contou que é sua primeira vez em Tiradentes e está encantada com a cidade, desfrutando de todos os passeios turísticos e históricos. Ela destacou que mais do que estarmos no lugar e tirar fotos, precisamos nos conectar com a energia e com a cultura do espaço em que estamos. Questionada sobre o cortejo, disse: “Eu estou achando tudo maravilhoso. Porque a cidade é maravilhosa por si só. Receber um evento como esse e dentro da programação, um Cortejo da Arte onde você celebra a cultura popular, toda a diversidade artística e cultural de Tiradentes, é sensacional!”, comemorou. Paulista, ela diz ter ficado muito emocionada ao descobrir o festival, pois gosta muito de cinema.
O ator João Pedro Mariano, 21, protagonista do filme “Baby”, de Marcelo Caetano, um dos selecionados para ser exibido na Mostra, também disse ser sua primeira vez em Tiradentes e já pensa em ter a cidade histórica mineira como ambientação para seus futuros projetos. “Eu estou completamente apaixonado. Eu falei: eu preciso fazer filme para voltar aqui todo ano, porque é lindo, numa cidade tão pequena, no interior de Minas, tão documental e com tanta arte!”, elogiou. Mineiro, natural de Guaxupé, ele exaltou a realização dos cortejos de rua: “Eu acho muito importane ver a galeria sorrindo, se divertindo. Eu vi agora um cortejo maravilhoso, dominado só por mulheres tocando. Então, é um momento de resistência na arte e na vida. A gente estar dançando numa rua histórica, onde a cidade de Tiradentes foi construída com muita dor, por um povo desprezado. Então, a gente estar aqui é um ato de resistência e felicidade”.

Sorriso no rosto
O Cortejo da Arte se consolidou como mais uma das grandes surpresas proporcionadas pela Mostra de Cinema de Tiradentes, arrancando um sorriso no rosto de diversas pessoas e agraciando o final da tarde dos tiradentinos e dos turistas. A festa segurou inclusive a chuva de verão, que só caiu após seu término.
A Mostra de Cinema de Tiradentes segue com sua programação até dia 1° de fevereiro, oferecendo uma imersão diferenciada na sétima arte, principalmente por ser sediada nesta cidade mágica que respira cultura, arte e história nos seus patrimônios materiais e imateriais. Viva Tiradentes!
Confira a programação completa!
*O jornalista e crítico Miguel Arcanjo Prado viajou a convite da Universo Produção.
**Felipe Rocha é estudante de jornalismo da UFSJ sob supervisão de Miguel Arcanjo Prado.
Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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