Artistas polêmicos desafiam ódio em Domínio Público no Festival de Curitiba

Maikon K, Elisabete Finger, Wagner Schwartaz e Renata Carvalho no palco em “Domínio Público” no 27º Festival de Curitiba – Foto: Annelize Tozetto/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
Por Michele Marreira, em Curitiba*
Colaboração para o Blog do Arcanjo
O público compareceu em peso na noite desta quinta (29), no Teatro da Reitoria, na capital paranaense, para conferir de perto um dos projetos mais aguardados do 27º Festival de Curitiba: a peça “Domínio Público”. A montagem enfrenta o ódio com arte. No mesmo palco, quatro artistas que em 2017 estiveram no centro de discussões acaloradas sobre a arte e seus possíveis limites juntaram-se em resposta à censura e aos ataques que sofreram por conta de suas performances.
São eles: Maikon K (conhecido como “o homem nu da bolha”, que foi preso em Brasília durante a performance “DNA de DAN”), Wagner Schwartz (“o nu do MAM”, alvo de uma polêmica nacional após performance “La Bête”, com nudez e na qual uma criança interagiu com seu corpo imóvel no chão), Elisabete Finger (“a mãe da menina do MAM”, coreógrafa que estava com a filha na performance de Schwartz) e Renata Carvalho (“a travesti que interpreta Jesus”, artista que chegou a ter sua peça censurada pela Justiça, que depois voltou atrás).

“Domínio Público” tem Wagner Schwartz, bailarino e performer que foi alvo de polêmica por conta de sua apresentação de “La Bête” no MAM em 2017 – Foto: Humberto Araujo/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
Em cena, o quarteto polêmico abriu mão de recursos normalmente utilizados em artes cênicas como cenários e iluminação grandiosos, e até mesmo da representação de personagens. Escolheram fazer, de forma simples e didática, o espectador compreender o sofrimento solitário de cada um durante o processo dos ataques, utilizando-se do método da narrativa-palestra.

Elisabete Finger, a mãe da menina do caso “Nu do MAM”, está na peça “Domínio Público, inspirada no quadro “Mona Lisa”, de Leonardo Da Vinci para falar dos ataques que os artistas sofreram em 2017 – Foto: Humberto Araujo/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
Eles optaram por contar de forma irônica, e em certos momentos até com humor, os mistérios que envolvem a mais famosa obra do pintor renascentista Leonardo Da Vinci, o famoso quadro “Mona Lisa”. O quarteto mergulhou profundamente na História da Arte para concretizar o minucioso trabalho nos palcos, com produção conjunta de Corpo Rastreado e Festival de Curitiba. Todos eles revelaram que são vítimas até hoje de manifestações de ódio, sobretudo nas redes sociais, por conta dos episódios pelos quais ficaram internacionalmente conhecidos.

Renata Carvalho, atriz travesti, foi alvo de censura por interpretar Jesus Cristo em “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu” – Foto: Humberto Araújo/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
“Quando aceitamos o convite do Festival, estávamos no calor dos acontecimentos. Ficamos um mês no processo criativo”, explica o paranaense Maikon K. “Tudo o que aconteceu doeu muito para os quatro. Durante os ataques ficamos em silêncio. Eu recebi 150 mensagens me ameaçando de morte, queria uma parede blindada no Teatro, achava que alguém poderia me dar um tiro. Repensei em tudo que me aconteceu. A ideia era falarmos de nós mesmos, mudando de assunto”, descreve o fluminense Wagner Schwartz.

Maikon K, que foi preso em Brasília por estar nu dentro de uma bolha durante uma performance, também está em “Domínio Público” – Foto: Humberto Araujo/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
“Nunca vou aceitar que eu tenha de me justificar. Naquele momento [da polêmica], eu estava como público e não artista. Sou uma coreógrafa que trabalha há anos. Nunca falei com a imprensa durante esses sete meses. Optamos nos manifestar através de uma obra de arte que sempre carrega muitos enigmas”, diz Elisabete Finger. “Tivemos nosso momento de cura e compreensão de entendimento do outro”, sintetiza a santista Renata Carvalho.

Maikon K, Elisabete Finger, Wagner Schwartz e Renata Carvalho durante o debate com o público do 27º Festival de Curitiba após a estreia de “Domínio Público” – Foto: Annelize Tozetto/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
Debate acalorado
Assim como aconteceu na estreia de “Domínio Público”, após as apresentações é proposto debates entre artistas e platéia na tentativa de experiências de pensamento. Uma espectadora presente se manifestou de maneira negativa ao relatar sua percepção do trabalho apresentado. “Estou com uma sensação estranha. Teatro é o lugar onde as coisas acontecem. E ao terminar o espetáculo, senti que nada aconteceu, fiquei com seu vazio”, disse. Presente na plateia, Guilherme Weber, ator e curador do Festival de Curitiba, discordou e opinou: “Saí muito preenchido do espetáculo. Fiquei feliz e surpreendido com uma resposta que não é prontamente imediatista”, finalizou. Nesta sexta (30), haverá nova sessão da peça “Domínio Público”, às 21h, no Teatro da Reitoria.
*Enviada especial, a jornalista Michele Marreira viajou a convite do Festival de Curitiba.

Cartaz da peça “Domínio Público”, com Renata Carvalho, Maikon K, Wagner Schwartz e Elisabete Finger no 27º Festival de Curitiba – Foto: Caroline Moraes/Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL
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